Saudada como uma grande conquista ou, para os mais otimistas, uma lufada de esperança na prevalência da garantia dos direitos das minorias
Por: Alessandra Mello
Um vento de cidadania, ainda que leve, soprou semana passada no Brasil. Só não foi mais forte por causa da pressão da bancada religiosa, que tem grande influência nas decisões do Palácio do Planalto, basta lembrar a vitória dos evangélicos com a suspensão do kit gay que seria distribuído nas escolas públicas e o cancelamento da campanha publicitária de valorização das prostitutas. Mas dessa vez, resistindo aos apelos, a presidente Dilma Rousseff sancionou na íntegra, sem nenhum veto, a lei que garante atendimento de urgência no SUS para vítimas de estupro, e que tramitou no Congresso Nacional durante 14 anos antes de ser aprovada.
Para o desagrado dos fundamentalistas, que ainda não entenderam que convicções religiosas não podem pautar atos do Estado, o inciso IV, que obriga a realização da “profilaxia da gravidez”, foi mantido. Mas não sem polêmica entre os parlamentares religiosos, que consideram essa regra a porta entreaberta para a legalização do aborto no Brasil. Para não melindrar os ânimos dos evangélicos, que já pregam um boicote contra a presidente nas eleições ano que vem, o Ministério da Saúde prometeu encaminhar ao Congresso nesta semana um projeto substituindo o termo “profilaxia da gravidez” por “medicação com eficiência precoce para a gravidez decorrente de estupro”. Nada mais é do que a pílula do dia seguinte para vítimas de violência sexual, já vendida livremente em farmácias particulares e distribuída à população nos postos de saúde sem receita médica desde o ano passado.
A troca vai evitar qualquer interpretação equivocada da lei para garantir que nenhuma mulher cometa “o pecado do aborto”. Apesar do recuo em relação ao termo, a sanção integral da Lei do Estupro, como ela já foi batizada, é uma vitória dos movimentos de mulheres, de saúde e feministas, saudada como uma grande conquista ou, para os mais otimistas, uma lufada de esperança na prevalência da garantia dos direitos das minorias, ainda muito tímida no Brasil, sobre interesses eleitorais.
Em nota, o Ministério da Saúde negou ter cedido a pressões religiosas para voltar atrás na decisão. Disse apenas que a portaria foi suspensa para a definição dos protocolos de atendimento no SUS e para a realização de um debate entre especialistas no assunto. No entanto, a própria bancada da fé já está se vangloriando de ter conseguido a revogação da portaria e também convocando fiéis a pressionar o governo contra a reedição da norma.
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