
Levantamento feito pelo iG mostra que o País possui apenas um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas para cada 7 milhões; Amazonas não tem nenhum
Cíntia Acayaba e Fernanda Simas, iG São Paulo
Menos de 20 meses após o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter lançado o Plano Nacional de Combate ao Crack, o governo anunciou nesta quarta-feira mais um programa de combate a essa e outras drogas. As mudanças devem atingir a atual rede de assistência a dependentes químicos, que é deficitária e sofre acusações de desrespeito aos direitos humanos.
Levantamento feito pelo iG mostra que o Brasil possui apenas um Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD) para cada 7 milhões de pessoas. O Estado do Amazonas, por exemplo, não possui nenhuma unidade de Caps AD.
Pesquisa divulgada pela Confederação Nacional de Municípios revela que ao menos 74,3% das cidades brasileiras enfrentam problemas com o consumo de drogas. A pesquisa também mostrou que o crack começa a substituir o álcool nos municípios de pequeno porte e áreas rurais e que uma pedra custa menos de R$ 5.
Um dos pilares da reforma psiquiátrica de 2001, que prevê internação apenas em casos extremos, o Caps AD promove o acompanhamento clínico, tratamento ambulatorial e a internação de curta duração de pessoas com transtornos pelo uso de crack e outras drogas. Atualmente, existem 271 Caps AD no País.
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Previstos para serem instalados em municípios com pelo menos 70 mil habitantes, os Caps AD não estão presentes em 423 cidades com esse mínimo populacional.
O Estado de São Paulo, por exemplo, tem 100 municípios com mais de 70 mil habitantes e apenas 66 unidades de Caps AD. O Rio de Janeiro, que conta com 35 cidades com esse volume populacional, possui 18 Caps AD, e o Pará, com 20 municípios de médio ou grande porte, tem seis Caps AD.
O Ministério da Saúde forneceu dados por Estado e não por município, portanto uma cidade pode ter mais de uma unidade de CAPs AD, como o município de São Paulo.
O presidente do Conselho Federal de Psicologia (CFP), Humberto Verona, defende os Caps AD como uma possibilidade “da pessoa continuar o tratamento e ter sua liberdade respeitada”.
Segundo o ministério, equipes de Saúde da Família, consultórios de rua, Casas de Acolhimento Transitório (CATs) e Comunidades Terapêuticas compõem a rede de assistência à saúde de dependentes químicos.
As Comunidades Terapêuticas, em que os usuários ficam internados, veem sendo condenadas por entidades. Para o Conselho Federal de Psicologia, as Comunidades são instituições privadas ligadas a grupos de interesses específicos, como entidades religiosas.
De acordo com Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos – locais de internação para usuários de drogas, 68 Comunidades Terapêuticas foram visitadas no País e em todas elas foram registrados abusos.
Houve casos de imposição de abstinência sexual, presente em 21 das 25 unidades da federação avaliadas, mão-de obra não remunerada, em 18 Estados, imposição religiosa (17), castigos proibitivos e físicos (16), adolescentes e crianças com adultos (13), prática de isolamento (11), situações constrangedoras (9) e apropriação de documentos (9).
Para Verona, presidente do CFP, as Comunidades Terapêuticas estão baseadas na crença de cada entidade e na internação compulsória.
“O método de tratamento usado nessas Comunidades é baseado na religião, na abstinência como solução, no comportamento moral”, afirma.
“O que nos deixa indignados é que a política de tratamento está sendo feita em torno desses modelos de internação compulsória em comunidades terapêuticas. Isso é um retrocesso”, completa.
Para Guerra, a Comunidade Terapêutica é uma ferramenta que deve ser usada. “A imensa maioria dessas comunidades tem orientação correta e ajudam no tratamento. Mas, é provável que algumas não respeitem as normas, mas isso tem em todas as áreas”, disse.
Já Verona quer que o governo retire as Comunidades do plano de combate às drogas, que lança nesta quarta.
“A internação compulsória é prevista na lei, mas requer que haja um processo judicial e uma autorização do juiz. O que estamos vendo é uma banalização disso. Nas comunidades a pessoa não vai ser tratada, vai ser segregada. Depois, ela vai ser devolvida à sociedade e aí as políticas públicas vão ter que assumir o caso porque na comunidade não há um plano de continuidade do tratamento”, afirma o presidente do CFP.
O Ministério da Saúde, por meio de sua assessoria de imprensa, afirma que as “internações hospitalares estão disponíveis aos dependentes químicos e devem ser vistas como uma das possibilidades de tratamento (de acordo com indicação médica) e dentro de uma concepção ampliada de atendimento, incluindo o acompanhamento integral do paciente”.
Verona defende tratamento aberto, “dentro da lógica da diminuição de danos”, como os Caps AD. Ele lembra que o número de Caps que funcionam 24 horas – três no País – é insuficiente e precisam ser expandidos.
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