ANA PAULA SOUSA
DE SÃO PAULO
No ano de 2003, parecia que nada seguraria Jeferson De. Egresso do curso de cinema da USP e autor de curtas premiados, o diretor conseguira, num só ano, ser selecionado para o laboratório do Festival de Sundance, ganhar o edital da Petrobras e, de quebra, conquistar a Sony como parceira.
Tudo isso porque "Bróder", que chega hoje a 45 salas do país, foi visto, de cara, como um projeto promissor. Diretor negro, periferia tratada de modo humanizado e desejo de ser pop atraíram não só a indústria como um elenco de primeira, que inclui Caio Blat, Cássia Kiss e Jonathan Haagensen.
Oito anos e dezenas de prêmios depois, a pergunta que "Bróder" suscita é: por que um filme aparentemente bem sucedido como esse, que até para o Festival de Berlim foi selecionado, demora tanto tempo para chegar ao circuito?
Divulgação | ||
Caio Blat vive Macu, em "Bróder" |
CONGESTIONAMENTO
"Primeiro, tem a dificuldade do estreante", responde o diretor. "Os caras pensavam: será que ele vai dar conta mesmo? Então foi difícil completar o orçamento de R$ 3 milhões. E aí, quando voltei de Berlim [em fevereiro do ano passado], eu falei: 'Agora é lançar logo'. Mas não era. Simplesmente, não tem cinema pra todo mundo."
Cada vez que uma data de estreia era apontada, algum transatlântico do tipo "Harry Potter" surgia à frente de "Bróder". Na última data planejada, foi "Tropa de Elite 2" que obrigou os distribuidores do filme a se recolherem.
"Vai dando uma agonia", diz Jeferson. "Tirando Berlim, ganhei prêmio em todos os festivais. Mas e aí?", pergunta, espantado com a sina.
Ele também ganhou todos os editais depois de ter o filme concluído -- os chamados prêmios de finalização.
Longe de ser exceção, o caso de "Bróder" ilustra o nó na distribuição de filmes brasileiros. Como mostra o quadro ao lado, dos 72 filmes lançados no ano passado, 56 fizeram menos de 50 mil espectadores. Muitos deles, estrearam três ou quatro anos depois de terem sido rodados.
"Bróder" foi filmado em 2007. E a espera acabou fazendo com que, ao longo do tempo, a própria forma do filme fosse mudando.
Quando começou a montar, o cineasta achou que faria um filme silencioso, no estilo "Paradise Now". Mas, no estúdio da gravadora Trama, foi se empolgando com as músicas que gosta de ouvir e acabou por colocá-las na primeira versão.
O espírito dos três amigos nascidos no Capão Redondo era dado, sobretudo, por duas canções de Jorge Ben Jor. Mas eis que, em janeiro, ao montar a última versão e entrar em contato com a editora do músico, descobriu que seria impossível pagar os direitos autorais. "Era mais fácil ter Beatles do que ele no filme", espanta-se.
Saíram as canções e uma cena que prestava homenagem a Ben Jor. Entraram o silêncio da sequência de abertura, que só tem o som do Capão, e uma canção de Max de Castro. Há, ainda, Lucas Santanna, Nação Zumbi, Emicida e Racionais MC's.
"Essas músicas são a cara da cidade", diz Jeferson, que defende a negritude na fala, mas fugiu do panfleto no filme. "Na primeira versão, o filme era mais raivoso, mas mudei um pouco. Eu queria fazer um filme que meus filhos e minha mãe pudessem ver. Sou um cara sem herança pra receber e, pela minha melanina, já sou visto de forma diferente. Não precisava ficar levantando bandeira."
Agora, Jeferson irá atrás de recursos para tirar do papel seu novo roteiro, "Música Romântica". "É... Vou começar do zero de novo."
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