Os dias 31 de março e 1º de abril de 1964 ficarão para sempre marcados na história brasileira como as datas de inauguração da nossa Idade das Trevas. O Golpe Militar que enterrou de uma vez os pequenos suspiros democráticos que tínhamos no país – assim como temos hoje, apenas suspiros de democracia, mas ao menos podemos suspirar – aprofundou-se em 1968 com o AI-5, e aí todos sabemos o que aconteceu: repressão aberta, torturas, assassinatos, sequestros, ódio a todos os tipos de liberdade, etc etc etc.
A Ditadura Militar brasileira durou até 1985, e contou com a colaboração direta ou indireta de grandes empresários, entre eles alguns dos principais empresários da comunicação brasileira. Hoje, quando se discute cada vez com mais veemência a necessidade de revisar-se a Lei da Anistia – que deixou impune torturadores e assassinos – e abrir-se os arquivos secretos da Ditadura – a verdade sobre o próprio Estado e a própria História é um direito fundamental de todo cidadão – estes mesmos grupos de comunicação que, de uma forma ou de outra, colaboraram para a continuidade da Idade das Trevas brasileira, obviamente se retraem.
A cada vez que esse debate ganha corpo, ou a velha mídia brasileira se esquiva ou fala em revanchismo para descaracterizar a simples e óbvia luta pela verdade e pela punição de criminosos do mais alto grau. As razões também são simples e óbvias: além do suporte dado por alguns desses veículos aos militares e seus aliados civis, também muitos atuais patrocinadores da grande mídia injetaram muito dinheiro para manter o regime ditatorial no Brasil. E também lucraram com isso.
Já que, portanto, desse mato não sai cachorro, cabe aos comunicadores alternativos gritarem ainda mais alto em defesa do verdadeiro fim da Ditadura. Esse fim só acontecerá quando enterrarmos nossos mortos e deixarmos de admitir a tortura, a opressão estatal, a violência policial e os assassinatos cometidos pelo Estado – ontem e hoje. A mobilização nos blogs e nas redes sociais tem sido significativas, e o governo, em algum momento, terá que dar resposta aos apelos da sociedade organizada que pretende representar, ou se tornará dispensável.
Ao mesmo tempo, vemos, com relação à revelação da nossa verdadeira História, a proliferação de livros sobre a nossa Idade das Trevas. Jornalistas, sociólogos, historiadores e outros interessados têm escrito obras de grande qualidade que ajudam a compor a acusação que todos nós fazemos contra os agentes da Ditadura Militar. Clássicos que abordam o tema sob diversos ângulos, como “1968 – o ano que não terminou”, de Zuenir Ventura, ou a série de trabalhos de Élio Gaspari, unem-se a muitos outros esforços nesse sentido. AQUI uma lista interessante.
Destaco, porém, uma leitura recente: “Operação Condor – o sequestro dos uruguaios”, de Luiz Claudio Cunha. O jornalista, que era chefe da sucursal de Porto Alegre da então combativa revista Veja, testemunhou o início de um dos inúmeros sequestros da Operação Condor, que integrou a repressão política na América Latina. A partir daí, Luiz Cláudio Cunha e os fotógrafos Ricardo Chaves e J. B. Scalco tornam-se personagens de uma impressionante história de investigação que resultou na sobrevivência dos uruguaios Lílian Celiberti e Universindo Diaz, na verdade os únicos sobreviventes que a Operação Condor teve que tolerar. Através de relatos e pontos de vista diversos, Luiz Cláudio Cunha reconta esse caso, e, talvez sem querer, vai além: retrata de forma ampla a forma como a Ditadura brasileira agiu durante todos aqueles anos. Como diz na contracapa o jornalista Juca Kfouri, “penetra fundo na podridão de toda uma época e amplia, com a visão de historiador, a cena de um humilde apartamento gaúcho que bem poderia se chamar Brasil, ou melhor, América do Sul”.
Postado por Alexandre Haubrich
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