O Brasil é um país com níveis de desigualdade incompatíveis com seu potencial de geração de riqueza. A principal razão para o país não ocupar o lugar que merece entre as principais economias mundiais tem a ver com o modelo gerador de desigualdade que o caracteriza. Para que o modelo brasileiro seja de um desenvolvimento sustentável é preciso haver justiça social e envolvimento profundo dos setores que dominam a riqueza do país.
É fundamental que os setores governamental e privado se comprometam claramente com o combate à desigualdade. Mais importante, ainda, é que os indivíduos mais ricos desta nação chamem também para si a co-responsabilidade pelo combate à desigualdade.
Na China, as famílias mais ricas tem contribuido de modo importante para o combate à desigualdade. No Brasil, segundo o economista Márcio Pochmann, as cinco mil famílias mais abastadas controlam 40% da riqueza nacional e poderiam distribuir sua riqueza de forma mais eficaz, investindo em projetos de combate à desigualdade e de transformação social.
Um programa de transformação social para famílias em situação economicamente desfavorável demanda, acima de tudo, capacitação nas mais diversas áreas: liderança, participação, acesso a direitos civis e humanos, formação de agentes comunitários de saúde, nutrição, tecnologia, cooperativismo, elaboração de planos de negócios, entre muitas outras. O engajamento e investimento das famílias mais abastadas em parcerias com organizações da sociedade civil que trabalham em várias das regiões mais empobrecidas do país para desenvolver as capacidades dos jovens e e seus familiares nos diversos aspectos da transformação social, estenderia o alcance destes programas a dezenas de regiões hoje completamente abandonadas.
Famílias abastadas cuja renda vem de atividades rurais podem fazer com que assentamentos rurais tenham sucesso, transformando-os em pequenos empreendimentos sustentáveis, passando um pouco de seu conhecimento às lideranças dos pequenos agricultores. Essas famílias podem reservar parte da cadeia produtiva de seus empreendimentos rurais para ser abastecida por pequenos empreendimentos sociais.
Já nas áreas urbanas, famílias abastadas podem transformar a realidade de bairros periféricos inteiros, financiando a instalação de telecentros, atividades de reforço escolar, atividades esportivas e culturais, pré-vestibulares e educação infantil de qualidade, sempre que possível em parceria com as organizações da sociedade civil e com os governos. ‘
Paralelamente aos programas de longa duração, as famílias abastadas de zonas rurais e urbanas podem financiar ações de transformação imediata, construindo em parceria com as comunidades: infraestrutra sanitária, habitações de qualidade, abastecimento de água potável, postos de saúde e escolas. Em cinco anos, a realidade das áreas de pobreza rural e urbana será outra e as regiões observarão desenvolvimento da economia local.
Todas estas iniciativas só terão resultados favoráveis se forem concebidas e executadas de forma estruturada, ou seja através da constituição de fundações familiares profissionalizadas a cargo de membros gestores das famílias mantenedoras. Em países como os Estados Unidos são comuns as fundações familiares. As famílias mais abastadas costumam dedicar em média 10% de seu patrimônio a seus herdeiros e 90% a fundações criadas por elas ou por outros empreendedores sociais. Esta prática torna as novas gerações mais produtivas, lhes dá incentivo para construir seu próprio patrimônio e lhes torna tão batalhadores quanto às gerações anteriores na condução de suas vidas. O Brasil precisa aprender com os países mais avançados que a distribuição justa da riqueza gerada traz benefícios enormes para o país, principalmente porque produz capital social na medida necessária para o desenvolvimento sustentável.
*Vânia Ferro é professora no MBA do LARC/Poli da Universidade de São Paulo e conselheira do SAMPA.ORG. Entre 2002 e 2004, foi a principal executiva da CARE Internacional Brasil, ONG que combate a pobreza em todo o mundo.
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