Maioridade Penal


Kleyson Anilton Duarte Marques
, Estudante do 6º período do curso de direito do Centro Universitário Newton Paiva

No Brasil, a maioridade penal é fixada em 18 anos, ou seja, a imputabilidade inicia-se aos 18. Nossa legislação adotou o sistema biológico, ignorando o desenvolvimento mental do menor, considerando-o inimputável, mesmo tendo capacidade para entender a ilicitude do fato.

O aumento do índice de criminalidade envolvendo menores infratores traz à tona a viabilidade prática do atual modelo brasileiro. Os casos de maiores repercussões foram, sem dúvida, o assassinato dos estudantes Felipe Silva Caffé, de 19, e Liana Friedenbach, de 16, em novembro de 2003, e do menino João Hélio, de 6, em fevereiro de 2007. Caso pudessem ser enquadrados dentro do Código Penal, os assassinos responderiam por homicídio qualificado, com pena de 12 a 30 anos de prisão.

Porém, como alguns acusados são menores de 18, só podem ser responsabilizados pela Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), artigo 121, que diz: “Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos”. Não é de se espantar o tamanho da dor, revolta, sensação de impunidade e injustiça.

O filosofo e jurista Sólon, por volta de 590 a.C., tendo sido perguntado sobre a maneira mais eficaz de diminuir os crimes, disse: “Isso ocorrerá se eles causarem tanto ressentimento nas pessoas que não são vítimas dos mesmos quanto nas que são”.

Foi o que aconteceu no caso do menino João Hélio. A sociedade brasileira tomou uma conduta ética. Uma conduta ética é uma tomada de posição. Não há nada mais antiético que a indiferença, ser indiferente é banalizar a violência.

Há mais de 16 anos surgia o ECA, em substituição ao ultrapassado Código de Menores. O atual diploma representa um novo pacto político-social, que busca consolidar o Estado Democrático de Direito, priorizando a cidadania, uma das faces da CRFB de 1988.

De acordo com o artigo 112 do ECA, a medida de internação só poderá ser aplicada quando for esgotada todas as medidas específicas de proteção e todas as medidas socioeducativas.

Segundo o saudoso Nelson Hungria, uma condenação penal arruinará, talvez irremediavelmente, a existência inteira do adolescente, é preferível, sem dúvida, corrigi-lo por métodos pedagógicos, prevenindo a sua recaída no malefício.

Em 1764, na cidade de Madri, o Marquês de Beccaria, publicou o livro Dei delitti e delle pene, em que já antecipava e recomendava: “É melhor prevenir o crime do que castigar” e “É a celeridade e a certeza da pena, mais que a sua severidade, que produz a efetiva intimidação”.

Nem o CP, nem o ECA, a melhor doutrina defende a possibilidade de uma terceira via: “uma responsabilidade penal diminuída, com conseqüências diferenciadas, para os infratores jovens com idade entre 16 e 21 anos, cujas sanções devam ser cumpridas em outra espécie de estabelecimento, exclusivas para menores, com tratamento adequado, enfim, um tratamento especial”.

Mesmo não sendo recepcionado pela Constituição Federal, o artigo 50 do CPM é semelhante ao texto do Senador Demóstenes Torres e da proposta defendida por Bitencourt. No entanto, o Brasil não tem uma estrutura moral e jurídica para viabilizar tal proposta.

Nilo Batista, em Introdução crítica ao direito penal brasileiro, cita Zaffaroni, quando trata da questão da co-culpabilidade do Estado: “Reprovar com a mesma intensidade a pessoas que ocupam situações de privilégio e a outras que se acham em situação de extrema penúria é uma clara violação ao princípio da igualdade corretamente entendido”.

José Afonso da Silva destaca a responsabilidade da família. Essa, que recebe a proteção estatal, não tem só direitos, mas o grave dever, juntamente à sociedade e o Estado, de assegurar, com absoluta prioridade, os direitos fundamentais da criança e do adolescente enumerados no art. 227 da CR.

A maioria desses jovens mal sabe ler e escrever, foram criados em vilas e favelas, quase todos são negros, vítimas de um histórico de desigualdade social, preconceito e corrupção. Segundo dados da Unicef, 45% das crianças e adolescentes brasileiros são pobres.

Para Michel Foucault, o ser humano tem uma forma particular de se relacionar com aquilo que rejeita, ele interna. A internação não é o sistema mais eficiente de punir. Ao contrário, criamos uma organização terrorista dentro da própria sociedade, que tende a crescer e a se organizar. Por isso, a pena privativa de liberdade será, sempre, a ultima ratio legis, ou seja, a última saída para a indispensável manutenção da ordem jurídica.

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