Escalada do vício: Número de usuários de crack em busca por tratamento supera os de álcool em Minas

Jair Amaral/EM/D.A Press
R. experimentou a droga aos 11 anos, em favela de Belo Horizonte, e chegou a roubar para não ficar sem a substância
“Quando comecei a consumir crack, a droga era mais fácil de se comprar do que pão”, conta R.M.M., que experimentou a droga em 1999, aos 11 anos, em uma favela de Belo Horizonte. Dez anos se passaram e o consumo do entorpecente não parou de crescer. Pela primeira vez, em 25 anos da história do Centro Mineiro de Toxicomania (CMT) da Fundação Hospitalar de Minas Gerais (Fhemig), a procura por tratamento por usuários do crack é maior do que a por consumidores de álcool e já corresponde a 38% do total de atendimentos no centro até este mês.

"Quando achávamos que tínhamos todas as respostas para as drogas, veio o crack e nos apontou outras perguntas. Preparamos-nos para atendimentos humanizados, envolvendo familiares. Mas como lidar com isso, se a substância compromete toda a capacidade de opção do usuário, acaba com as relações sociais e familiares? Por isso, estamos investindo na repressão, capacitação e no tratamento”, revela o subsecretário da Subsecretaria de Políticas Antidrogas, Cloves Benevides.
Na próxima semana, a subsecretaria vai lançar edital para que dez instituições sejam parceiras do estado na oferta de tratamento exclusivo ao usuário do crack, o que ainda não existe no país. Além disso, um batalhão de 300 agentes estaduais, da área de educação, saúde e do sistema penitenciário, está sendo capacitado pela Universidade Federal de São João del-Rei, na Região Central, para lidar com esse tipo de dependente químico.

De acordo com dados do Centro de Referência em Álcool e outras Drogas de Minas Gerais (Cread-MG) , de março de 2004 a setembro de 2009, 3.353 usuários de crack que também usavam outras drogas procuraram por atendimento. Desses, 1.215 combinam até quatros tipos de entorpecentes. Somente em Belo Horizonte, segundo a Secretaria Municipal de Saúde, desde a abertura do Centro de Referência em Saúde Mental para usuários de Álcool e Drogas, em novembro de 2008, já passaram pelo serviço 1.132 pacientes, sendo um fluxo mensal de 115 usuários. Desses, 57% são alcoolistas e 26% são viciados em crack.

De acordo com dados da Fhemig, até a última terça-feira, 886 dependentes haviam procurado o CMT e, desse total, 342 eram usuários do crack. Em 1997, as pessoas com problema de alcoolismo representavam 47% da procura por ajuda e aqueles que fumavam a pedra feita com sobra de cocaína e outras substâncias chegavam a apenas 20%.

Dos usuários de crack que procuram tratamento, 80% são homens com o 1º grau incompleto, idade entre os 18 e 35 anos e, na maioria dos casos, viúvos, solteiros e desempregados. “Essa droga é da solidão”, define a diretora da unidade e especialista em Drogas Dependentes, Raquel Martins Pinheiro. De acordo com ela, o tratamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) de um viciado deveria começar na saúde básica.

Distante do crack há seis anos, R.M.M, hoje com 21 anos, confirma que a droga faz estragos na vida dos viciados. “A pessoa fica disposta a tudo. Por isso, rouba e fica agressiva”, recorda, mostrando no peito um colar que significa a primeira letra do alfabeto grego e a última do hebraico. “A minha dependência não tem mais cura, pelo resto da vida farei tratamento, por isso, esse cordão significa para mim duas coisas: o início e o fim."

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