Drogas: Exploração da misericórdia


esmolas21Quem dá esmola se sente tocado pela situação difícil que o pedinte está vivendo, mas um morador de rua revela que usa o dinheiro para comprar cachaça e drogas
Por: Sandra Kiefer

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J. sempre consegue doações dos motoristas. Ele diz que em Belo Horizonte as pessoas são mais generosas e acolhedoras
Esmola. A palavra se origina do grego elemosiné, que quer dizer compaixão. É um gesto de misericórdia que faz quem socorre uma pessoa carente. “Procuro dar atenção e não desviar o olhar. Se acenam para mim, respondo ao cumprimento”, afirma Patrus Ananias, ex-ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, designado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva para consolidar o programa Bolsa-Família. Atualmente Patrus é funcionário concursado da Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
O ex-prefeito conta o último episódio em que se deparou com o dilema de dar ou não esmolas na capital: “Há poucos dias, encontrei uma senhora com duas crianças na rua. Ela me parou e contou que era do interior e que um carro viria buscá-la mais tarde. Lembrei a ela da existência do Restaurante Popular, com refeições subsidiadas (programa lançado no governo dele). Ela argumentou que já tinha tentado ir lá e que ficava fechado no fim de semana. Lembrei-me de que era verdade. Pela conversa que tive com ela, resolvi ajudar. Em meu íntimo, pensei que se ela estivesse mentindo, paciência.” Segundo Patrus, a decisão sobre dar esmola depende do momento de cada um.
Na década de 1980, Patrus conviveu com Antônio Cândido, respeitado pelo poeta Carlos Drummond de Andrade como um dos maiores intelectuais brasileiros. Segundo o ex-ministro, ele estava andando na rua com o professor e observou que ele, sempre que passava por um mendigo, tirava uma moedinha do bolso e dava. Ao ser confrontado pelo aluno, Antônio Cândido argumentou: “Sei que é politicamente incorreto, mas não posso deixar de dar uma esmola, pois essa é minha única forma de comunicação com eles.”
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Algo parecido ocorreu na quarta-feira, na Região da Savassi, durante uma apresentação de chorinho no quarteirão fechado da Rua Pernambuco. Ao sair de uma farmácia, o engenheiro mecânico italiano Giancarlo foi abordado por um mendigo, que perguntou se havia sobrado um trocado. Deu ao homem R$ 0,25. “Ele ainda reclamou. ‘Ué, mas só uma moeda?’ É só o que tenho”, respondeu. Dez minutos depois, o morador de rua voltou ao mesmo lugar. Giancarlo permanecia sentado no banco da praça, lendo uma revista.
Com o dinheiro do troco, o homem inteirou o valor necessário para comprar uma garrafa de cachaça do tipo caçulinha. Ele começou a beber o líquido e imediatamente se entusiasmou com a música, dançando livremente, sem perceber que está sendo observado. “Era inevitável que isso iria acontecer”, brinca o italiano. “Algumas pessoas não dão nada e outras não estão nem aí. Não se pode julgar a vida dos outros. Acredito apenas que ele não foi o mais favorecido pela sorte”, lamenta.
CACHAÇA E CRACK A facilidade em obter dinheiro das pessoas é confirmada por J., ex-montador de palcos, de 34 anos, nascido no interior de São Paulo. Ele chegou a trabalhar em shows de grande porte, como de Zeca Pagodinho e Zezé di Camargo & Luciano. “São Paulo é mais rico, mas aqui as pessoas são mais acolhedoras”, compara. Basta dizer que, quando precisa comer no Restaurante Popular das imediações, levanta-se com um vasilhame de plástico e recolhe esmolas entre os carros. Em uma, duas horas, recebe entre R$30 e R$ 40. Chega perto da janela dos carros e repete: “Boa noite. Será que você não tem uma moedinha para eu tomar uma sopa?” Primeiro, separo o dinheiro da comida, depois o da minha maconha e da cachaça e o crack da minha mulher. Algumas pessoas preferem que eu fale que vou comprar crack do que comer”.
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Patrus orienta quem lhe pede esmola a buscar outras opções
Enquanto isso…
..debate está na internet
A preocupação com a possibilidade de o dinheiro dado como esmola ser usado para outros fins, como compra de drogas, bebida alcoólica e cigarro, está presente de uma forma maneira muito intensa na internet. Uma busca pelo assunto no Google registra mais de 1 milhão de resultados. Em sua maioria, são textos publicados por blogs e sites de comunidades religiosas. Também é possível saber que o problema se faz presente em regiões distintas do país. Em Corumbá, em Mato Grosso do Sul, no fim do ano passado foi lançada uma campanha para orientar motoristas e pedestres a não dar esmolas. Já em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, também em 2012, o foco dos debates era a degradação da qualidade de vida de crianças e adolescentes que viviam nas ruas e sobreviviam com as esmolas que recebiam.
Por: Sandra Kiefer
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