Universidade no Brasil: agora “é nóis”!

Sérgio José Custódio*

O sinal fechado para o direito à universidade no Brasil sempre foi uma senha do poder de mando de uns e a obediência de outros. Não à toa, depois de 200 anos de universidade, o País não bate a casa dos 15% da população no ensino superior. Distante do tempo em que diploma na parede era sinal de sabedoria e autoridade intelectual, para cima (até os pós-doutorados) e para baixo (até a educação de zero a três anos), o Brasil rema para se posicionar na sociedade dita do conhecimento.

O desafio para o Movimento dos Sem Universidade (MSU) e o conjunto das ONGs, sindicatos, movimentos sociais e partidos políticos comprometidos com o processo de transformação e negação da desigualdade social histórica no Brasil passa pelo alerta à pauta do direito à universidade. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), com a Escola Nacional Florestan Fernandes, marcou um gol nesta direção. O Sindicato dos Bancários, após anos de encontros gigantescos dos MSU na quadra dos bancários, em São Paulo, encampa a ideia de organizar uma universidade, outro gol.

A luta pelo ensino superior no Brasil deve ser feita com coragem, conceito e criatividade. Coragem para levantar a voz à nação e clamar por este direito aos quatro ventos; conceito para qualificar aquilo mesmo que se quer da universidade, por exemplo, que ela não seja, no imaginário popular, mero adereço de consumo, como loja de shopping, mas que saiba dialogar com as necessidades maiores do nosso povo, coletivas e individuais. O padrão da universidade não pode ser feito de fome, transporte lotado, livros sob o braço e não na cabeça, correria cotidiana para se formar, sem tempo de respirar, muito menos tempo para ter inspiração. É preciso salvar o planeta e isto não se fará sem conhecimento, sem desenvolvimento novo. O Brasil, além das muitas bolsas hoje felizmente existentes para os pobres, terá que criar bolsas simplesmente para os pobres, negros e negras, indígenas passarem o dia estudando, por quatro, cinco até doze anos. O Brasil terá que garantir renda para as pessoas estudarem e acabar com a correria que não é estudo.

A expectativa de vida e o perfil etário mudaram. Não se pode manter o privilégio dos ricos de terem seus pupilos entrando no mercado para trabalhar só depois da graduação ou do doutorado nas universidades públicas, enquanto o povo nas periferias rala para ter um diploma na doideira e na correria enquanto trampa ou se sacode por uma renda familiar de vida. Criatividade para não esperar as coisas caírem do céu e nem o momento ideal para lutar, como foi a mobilização nacional de 2007 que ocupou a Faculdade de Direito da USP.

De boa, com luta, suor, lágrimas e sorrisos, no governo Lula, via política pública, abrimos duas estradas de acesso à universidade no Brasil para a escola pública, negros e indígenas: o Prouni, Programa Universidade para Todos (estrada privada) e as novas universidades, como a Universidade Federal do ABC (estrada pública). Mas ainda falta muito: a reserva de vagas para a escola pública, negros e indígenas, por turno e por curso, conquistada pelo MSU na Câmara dos Deputados, no dia 20 de novembro de 2008, dia de Zumbi, precisa virar lei de fato. A batida policial encenada pelo MSU no Senado em 2009 não deixa dúvida para ninguém onde está a exclusão da universidade no Brasil e qual é o desafio.



* Sérgio José Custódio é presidente nacional do Movimento dos Sem Universidade (MSU)



* Artigo publicado originalmente na revista Sem Terra (edição nº 54). Saiba mais em: http://www.mst.org.br/

Nenhum comentário: