Moradores fazem protesto contra violência policial em Salvador


Os moradores do bairro Nordeste de Amaralina (Salvador, BA) realizam, neste domingo (28), a partir das 19h, caminhada pelas ruas do bairro, para exigir justiça e a punição dos envolvidos
na morte do garoto Joel, assassinado com um tiro na cabeça na noite do último domingo, dia 21.

Reprodução

Joel morreu vítima de um tiro quando estava em seu quarto, no bairro Nordeste de Amaralina (Salvador, BA).

A vereadora Olívia Santana (PCdoB) se solidariza com a família e vai participar do ato, pensado inicialmente para celebrar o mês da Consciência Negra. "Não podemos admitir que mais crianças tenham as suas vidas ceifadas. Joel foi vítima de uma sociedade racista, que vê em todo negro um marginal em potencial. Não vamos sossegar até que os culpados sejam punidos com severidade", destaca a parlamentar.

Entenda o caso

Joel foi baleado na cabeça, por volta das 22h, do último domingo (21), quando se preparava para dormir. A criança estava dentro do seu quarto, no bairro Nordeste de Amaralina, em Salvador. Uma equipe da 40ª CIPM (Nordeste) fazia uma operação na região quando começou um tiroteio. O menino estava próximo à janela quando foi baleado. Joel foi levado para o Hospital Geral do Estado (HGE), mas não resistiu aos ferimentos e morreu. Filho de um mestre de capoeira, Joel acreditava que seguiria os mesmos passos do pai.

O secretário de Segurança Pública, César Nunes, visitou os pais do garoto no final da manhã de quarta-feira (24). “Quando ele colocou o dedo no buraco feito pela bala, começou a chorar”, contou a mãe de Joel, Mirian Moreno da Conceição Castro, 36 anos.

O Secretário de Segurança se emocionou e disse que também tem um filho, por isso entende a dor da família.
Nós viemos justamente para demonstrar o apoio da secretaria à investigação desse homicídio”, disse, emocionado. Sobre versões apresentadas, pela PM - de que o menino foi morto por traficantes - e pelos moradores - de que o tiro foi disparado pela polícia, o secretário disse que somente se pronunciará após o resultado da perícia. “Temos que ver a conclusão dos laudos para confrontarmos com as provas testemunhais”, declarou. O menino, em 2009, foi personagem de vídeo institucional do governo da Bahia.

Ela contou ainda que, enquanto conversavam no quarto onde o filho foi morto, o secretário chegou a perguntar se ela achava que houve ou não troca de tiros. “Eu disse para ele que não teve troca de tiros e que os PMs forjaram”. O secretário se comprometeu com a família a apurar o caso e encontrar o culpado, independente de ser um membro da corporação policial ou não. Ele afirmou ainda que o governador Jacques Wagner vai se reunir com a família da vítima, mas não precisou a data.

Protesto

Durante a visita do secretário, vizinhos fizeram manifestação e pedidos de justiça. O major da PM Josemar Pereira, responsável pelo inquérito administrativo, foi questionado sobre os nomes dos nove PMs envolvidos na operação. Ele disse que não serão divulgados por uma “decisão da instituição”.

Os moradores se queixam da forma de abordagem da polícia no Nordeste de Amaralina. “O que me dói é que não foi uma troca de tiros ou uma fatalidade, foi um assassinato. Como é que uma bala perdida veio na direção de meu filho?”, questionou indignada a mãe de Joel.

Depois do caso de Joel, a comunidade do Nordeste ficou ainda com mais receio das abordagens da PM. Os moradores se sentem acuados. “Eles já entram batendo. Não quer saber se é marginal ou pai de família”, relatou um mestre de capoeira que mora no bairro.

Menino de 15 anos relata agressões cometidas por policiais no bairro
Intimidação

No mesmo dia em que Joel foi morto, PMs da 40ª CIPM retornaram ao local e ainda ameaçaram um estudante de 15 anos que mora na região. É o próprio quem relata o fato. “Eles me mandaram ficar no chão, botaram o pé na minha cabeça e disseram que iriam me matar”, contou o menino, estudante da 8ª série. A ação só foi interrompida quando um vizinho saiu de casa e reconheceu o garoto.

“Ele é meu sobrinho”, mentiu para que os policiais parassem. O avô do estudante se emociona ao relembrar de quando a PM entrou na sua residência há quatro meses. “Estou com 79 anos. Nunca vi uma coisa igual”, disse chorando. As crianças estão traumatizadas. “Quando meu neto vê a viatura, fica com medo”, revelou, referindo-se a outro neto de 7 anos que presenciou os PMs revistarem a casa e ainda agredirem um tio. “A polícia aqui é pior que o vagabundo”, reforçou um morador.

A Polícia Militar não respondeu às denúncias feitas por moradores do Nordeste sobre a violência nas abordagem de policiais. Nesta quinta-feira (25), o major Josemar Pereira Pinto, comandante da 58ª Companhia, na Vila Laura, esteve na casa dos pais do menino Joel para visitar a família e notificá-los para depor na sexta-feira (26). Ele preside as investigações da Corregedoria da PM. A titular da 28ª Delegacia, no Nordeste, Jussara Souza, ouviu mais três testemunhas ontem. Elas confirmaram a versão de que os policiais chegaram ao local atirando.

Abordagem muda em cada bairro, diz PM

O presidente da Associação de Praças da Polícia Militar do Estado da Bahia, sargento Agnaldo Pinto, ao tentar negar a violência das abordagens policiais, admitiu a diferença das abordagens a depender do bairro. “Não existe isso. Trabalhei na rua e sei. Agora, a abordagem é uma coisa chata, antipática, ninguém gosta de ser revistado”, argumentou. Pinto, entretanto, admitiu que o alto índice de criminalidade do bairro exige mais energia da PM. “As pessoas têm que entender que a energia que a gente vai empreender numa abordagem no Nordeste não é a mesma do Caminho das Árvores, que é um bairro sem essa violência”, disse.

Para tentar justificar a violência com a população, o sargento chegou a acusar os moradores de colaboração como o crime organizado. Ele afirmou que as denúncias são uma forma de agradar traficantes. “Às vezes há uma cumplicidade com bandidos. No Nordeste, há grande quantidade de marginais. É melhor falar mal da polícia do que de bandido, senão morre”.

Polícia acha projétil 3 dias após crime

Ontem, três dias após o assassinato de Joel, agentes da 28ª Delegacia, no Nordeste de Amaralina, e do Departamento da Polícia Técnica encontraram um projétil na parede dos fundos da casa do garoto. A bala não foi vista na primeira perícia após o crime, no domingo.

“Estamos dirimindo dúvidas”, explicou a delegada da 28ª DP, Jussara Souza, que investiga o caso. A delegada disse que o procedimento não foi feito no dia em que ocorreu o crime porque “tinha muita movimentação”.

Da redação, Luana Bonone, com informações do Correio da Bahia

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