A história que o país ignora


Revolta da Chibata completa um século como uma página em branco no meio acadêmico. Marco da insurreição dos negros, fato é desconhecido dos alunos e a data esquecida nas escolas

JULIANA ABADE
jgomes@jornaldacomunidade.com.br
Redação Jornal da Comunidade

Jacira da Silva, do MNU, diz que a participação do negro na construção da história do país é desvalorizadaFoto: Dênio SimõesJacira da Silva, do MNU, diz que a participação do negro na construção da história do país é desvalorizada
Nos livros de história do Brasil podemos conhecer importantes personagens do nosso passado, como o marinheiro João Cândido, herói da Revolta da Chibata. João Cândido liderou, há exatos 100 anos, o motim no qual dois mil marujos negros obrigaram a Marinha a extinguir punições desumanas praticadas contra eles. Os combatentes conseguiram seu objetivo, mas uns foram expulsos dos quadros da corporação; outros, presos ou mortos. Recentemente, João Cândido saiu da condição de personagem esquecido da história. Em 2008, uma lei concedeu anistia póstuma a ele e a outros marinheiros envolvidos no motim.


Porém, no ano do centenário da Revolta da Chibata, João Cândido e os demais revoltosos continuam esquecidos no meio acadêmico. No dia 22 de novembro a Revolta da Chibata completou um século e nada se ouve falar sobre a data nas escolas. Pelo contrário, o que se vê é a ignorância dos alunos, que desconhecem a história desse embate e de seu líder, que ficou conhecido como o Almirante Negro. Discriminado, perseguido, este herói brasileiro morreu de câncer sem ter seu feito reconhecido. Em 2005 seu nome foi escrito no Livro de Heróis da Pátria no Panteão, na Praça dos Três Poderes, em Brasília.


Jacira da Silva, coordenadora do Movimento Negro Unificado do Distrito Federal (MNU-DF), diz que existe uma desvalorização da participação do negro na construção da história do país. “Isso acontece desde o passado, desde o sistema escravocrata. Falta a participação do negro na mídia e nos postos de destaque das empresas”, reclama.


O MNU é uma entidade nacional que surgiu em 1978, após a ditadura militar. Em Brasília, o movimento surgiu em 1981 com o objetivo de combater o racismo, lutar pela superação das desigualdades que atingem os afro-descendentes, agindo de forma propositiva nos debates com variados setores da sociedade. “Estamos indignados com as instituições que esqueceram o centenário dessa luta contra o racismo que aconteceu na Marinha brasileira”, diz Jacira da Silva.


Jacira acha que a Revolta da Chibata somente começou a ser evidenciada no governo Lula. “Foi nesse governo que começou o processo de anistia. No ano passado a família de João Cândido esteve em Brasília e recebeu uma medalha do ministro da Educação. A anistia foi assinada. Os valores ainda não condizem com a luta de João Cândido, mas acredito que chegará o dia em que todo o esforço daquele homem será reconhecido”.


Episódio manchou uma República que mal começava

Em quase todo o mundo a Marinha jogou pesado com a marujadaEm quase todo o mundo a Marinha jogou pesado com a marujada

A Revolta da Chibata foi um motim importante do ponto de vista da luta contra a segregação racial, ocorrido no início do século XX na cidade do Rio de Janeiro, então capital da República. Começou no dia 22 de novembro de 1910.


Naquele período, a Marinha estava dividida: os oficiais eram brancos e a marujada formada por negros e mulatos, aos quais eram infligidos castigos físicos. As faltas graves eram punidas com chibatadas. Uma situação insuportável, tendo em vista que a escravidão havia sido abolida.
A chibata era um instrumento de tortura que consistia em um chicote com uma bola cheia de pregos em uma ponta. Aquela situação gerou uma intensa revolta entre os marinheiros. O estopim ocorreu quando o marinheiro Marcelino Rodrigues foi castigado com 250 chibatadas por ter ferido um colega da Marinha, dentro do encouraçado Minas Gerais.


O navio de guerra dirigia-se para o Rio de Janeiro e a punição, aplicada na presença dos outros marinheiros, desencadeou a revolta. O motim se agravou e os revoltosos chegaram a matar o comandante do navio e mais três oficiais. Já na Baía da Guanabara, os revoltosos conseguiram o apoio dos marinheiros do encouraçado São Paulo. O clima ficou tenso e perigoso. O líder da revolta, João Cândido, que ficaria conhecido como “Almirante Negro”, redigiu uma carta reivindicando os termos da rendição: fim dos castigos físicos, melhorias na alimentação para os marujos e anistia para todos que participaram da revolta. Caso não fossem cumpridas as reivindicações, os revoltosos ameaçavam bombardear a então capital da República.


Diante da grave situação, o presidente Hermes da Fonseca “aceitou” o ultimato dos revoltosos. Porém, após os marinheiros terem entregue as armas e embarcações, o presidente providenciou a expulsão de alguns revoltosos. Outros foram presos e enviados para a Amazônia, onde deveriam prestar trabalhos forçados na produção de borracha. Mas muitos foram assassinados no caminho. O líder da revolta, João Cândido, expulso da Marinha, acabou internado como louco no Hospital de Alienados. No ano de 1912 foi absolvido das acusações junto com outros marinheiros que participaram da revolta e morreu pobre, vendendo peixe na Praça XV, centro da cidade.


Estudantes revelam desconhecimento

Muitos estudantes não conhecem, ou esqueceram, a história da Revolta da Chibata. O aluno de ciência da computação na UnB Wesley Vágner, 20 anos, comprova isso. “Se não me engano a Revolta da Chibata ocorreu no Sul. Havia marinheiros que apanhavam, por isso aconteceu a revolta”, diz. A estudante de jornalismo Taise Côrte também admite que esqueceu a data. “A única coisa que ainda lembro sobre isso é que foi um movimento comandado por militares da Marinha e que o responsável foi o João Cândido Felisberto”.


Os estudantes afirmam que a história do negro não é ensinada nas escolas. “Sinceramente, na rede pública de ensino são poucos os professores que realmente ensinam história e não apenas mandam os alunos lerem o conteúdo do livro. Acredito que para ensinar história é necessário questionamentos e debates, principalmente quando se fala em história de toda as raças”, declara Wesley Vágner. Taise Côrte também critica a maneira de se ensinar história nas escolas. “É muito superficial, porque o negro sempre é relatado como escravo. Acho que é isso que sustenta o preconceito no Brasil”.

2 comentários:

Jama Libya disse...

O PROTESTO 1955 / 2O15. 60 ANOS de CARLOS DE ASSUMPÇÃO
Poema Hino Nacional da luta da Consciência e Resistencia Negra Afro-brasileira
CARLOS DE ASSUMPÇÃO – O maior poeta negro da historia do Brasil autor do poema o PROTESTO Hino Nacional da luta da Consciência e Resistencia Negra Afro-brasileira, em celebração completou 87 anos de vida. CARLOS DE ASSUMPÇÃO nasceu 23 de maio de 1927 em Tiete - SP na sexta feira passada completou 87 anos de vida com sua família, amigos e nós da ORGANIZAÇÃO NEGRA NACIONAL QUILOMBO O. N. N. Q. FUNDADO 20/11/1970 (E diversas entidades e admiradores parabenizam o aniversario de 87 anos do mestre poeta negro Carlos Assumpção) tivemos a honra orgulho e satisfação de ligar para a histórica pessoa desejando felicidades, saúde e agradecer a Carlos de Assunpção pela sua obra gigante, em especial o poema o Protesto que para muitos é o maior e o mais significante poema dos afros brasileiros o Hino Nacional dos negros. “O Protesto” é o poema mais emblemático dos Afros Brasileiros e uns das América Negra, a escravidão em sua dor e as cicatrizes contemporâneas da inconsciência pragmática da alta sociedade permanente perversa no Poema “O Protesto” foi lançado 1958, na alegria do Brasil campeão de futebol, mas havia impropriedades e povo brasileiro era mal condicionado e hoje na Copa Mundial de Futebol no Brasil 2014 o poema “O Protesto” de Carlos de Assunpção está mais vivo com o povo na revolução para (Queda da Bas. Brasil.tilha) as manifestações reivindicatórias por justiça social econômica do povo brasileiro que desperta na reflexão do vivo protesto.
O mestre Milton Santos dizia os versos do Protesto e o discurso de Martin Luther King, Jr. em Washington, D.C., a capital dos Estados Unidos da América, em 28 de Agosto de 1963, após a Marcha para Washington. «I have a Dream» (Eu tenho um sonho) foram os dois maiores clamores pela liberdade, direitos, paz e justiça dos afros americanos. São centenas de jornalistas, críticos e intelectuais do Brasil e de todo mundo que elogia a (O Protesto) (Manifestação que é negra essência poderosa na transformação dos ideais do povo) obra enaltece com eloquência o divisor de águas inquestionável do racismo e cordialidade vigente do Brasil Mas a ditadura e o monopólio da mídia e manipulação das elites que dominam o Brasil censuram o poema Protesto de Carlos de Assunpção que é nosso protesto histórico e renasce e manifesta e congregam os negros e todos os oprimidos, injustiçados desta nação que faz a Copa do Mundo gastando bilhões para uma ilusão de um mês que poderá ser triste ou alegre para o povo brasileiro este mesmo que às vezes não tem ou economiza centavos para as necessidades básicas e até para sua sobrevivência e dos seus. No Brasil
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Organização Negra Nacional Quilombo ONNQ 20/11/1970 –
quilombonnq@bol.com.br

Jama Libya disse...


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Poema. Protesto de Carlos de Assunpção

Mesmo que voltem as costas
Às minhas palavras de fogo
Não pararei de gritar
Não pararei
Não pararei de gritar

Senhores
Eu fui enviado ao mundo
Para protestar
Mentiras ouropéis nada
Nada me fará calar

Senhores
Atrás do muro da noite
Sem que ninguém o perceba
Muitos dos meus ancestrais
Já mortos há muito tempo
Reúnem-se em minha casa
E nos pomos a conversar
Sobre coisas amargas
Sobre grilhões e correntes
Que no passado eram visíveis
Sobre grilhões e correntes
Que no presente são invisíveis
Invisíveis mas existentes
Nos braços no pensamento
Nos passos nos sonhos na vida
De cada um dos que vivem
Juntos comigo enjeitados da Pátria

Senhores
O sangue dos meus avós
Que corre nas minhas veias
São gritos de rebeldia

Um dia talvez alguém perguntará
Comovido ante meu sofrimento
Quem é que esta gritando
Quem é que lamenta assim
Quem é

E eu responderei
Sou eu irmão
Irmão tu me desconheces
Sou eu aquele que se tornara
Vitima dos homens
Sou eu aquele que sendo homem
Foi vendido pelos homens
Em leilões em praça pública
Que foi vendido ou trocado
Como instrumento qualquer
Sou eu aquele que plantara
Os canaviais e cafezais
E os regou com suor e sangue
Aquele que sustentou
Sobre os ombros negros e fortes
O progresso do País
O que sofrera mil torturas
O que chorara inutilmente
O que dera tudo o que tinha
E hoje em dia não tem nada
Mas hoje grito não é
Pelo que já se passou
Que se passou é passado
Meu coração já perdoou
Hoje grito meu irmão
É porque depois de tudo
A justiça não chegou

Sou eu quem grita sou eu
O enganado no passado
Preterido no presente
Sou eu quem grita sou eu
Sou eu meu irmão aquele
Que viveu na prisão
Que trabalhou na prisão
Que sofreu na prisão
Para que fosse construído
O alicerce da nação
O alicerce da nação
Tem as pedras dos meus braços
Tem a cal das minhas lágrima
Por isso a nação é triste
É muito grande mas triste
É entre tanta gente triste
Irmão sou eu o mais triste

A minha história é contada
Com tintas de amargura
Um dia sob ovações e rosas de alegria
Jogaram-me de repente
Da prisão em que me achava
Para uma prisão mais ampla
Foi um cavalo de Tróia
A liberdade que me deram
Havia serpentes futuras
Sob o manto do entusiasmo
Um dia jogaram-me de repente
Como bagaços de cana
Como palhas de café
Como coisa imprestável
Que não servia mais pra nada
Um dia jogaram-me de repente
Nas sarjetas da rua do desamparo
Sob ovações e rosas de alegria

Sempre sonhara com a liberdade
Mas a liberdade que me deram
Foi mais ilusão que liberdade

Irmão sou eu quem grita
Eu tenho fortes razões
Irmão sou eu quem grita
Tenho mais necessidade
De gritar que de respirar
Mas irmão fica sabendo
Piedade não é o que eu quero
Piedade não me interessa
Os fracos pedem piedade
Eu quero coisa melhor
Eu não quero mais viver
No porão da sociedade
Não quero ser marginal
Quero entrar em toda parte
Quero ser bem recebido
Basta de humilhações
Minh'alma já está cansada
Eu quero o sol que é de todos
Ou alcanço tudo o que eu quero
Ou gritarei a noite inteira
Como gritam os vulcões
Como gritam os vendavais
Como grita o mar
E nem a morte terá força
Para me fazer calar.
Organização Negra Nacional Quilombo ONNQ 20/11/1970 –
quilombonnq@bol.com.br