FERNANDA EZABELLA
colaboração para a Folha de S.Paulo
Djan Ivson, 25, foi de São Paulo a Paris com uma missão: pichar um museu. Vandalismo? Não. Ele foi convidado. A Fundação Cartier, centro de arte ao sul de Paris que já expôs a brasileira Beatriz Milhazes e o cineasta americano David Lynch, abre amanhã uma retrospectiva mundial de grafite. E a pichação paulistana ganha destaque, com um documentário inédito e uma mostra de "folhinhas" com assinaturas de pichadores famosos.
Após o sucesso do grafite colorido de São Paulo, é a pichação de letras negras que encontra espaço no circuito artístico.
"É difícil dizer se é arte ou não. O que é arte nos dias de hoje?", disse à Folha por telefone o diretor da fundação, Hervé Chandès. "Sei que é um fenômeno grande o suficiente, uma coisa única, muito específica de São Paulo, selvagem, que queremos mostrar dentro do contexto do mundo do grafite."
Ivson, conhecido como Cripta, começou a pichar aos 12 anos e parou em 2004, quando passou a registrar a ação de seus colegas em vídeo. Diz que tem mais de 200 horas de imagens e que já vendeu 3.000 cópias de seus oito DVDs.
Vem daí quase metade das imagens do documentário "Pixo", dos irmãos Roberto T. Oliveira e João Wainer, fotógrafo da Folha. A primeira exibição será na instituição em Paris, ao lado de curtas sobre dois brasileiros, o artista Alexandre Orion e Stephan Doitschinoff. Também haverá curtas sobre o grafiteiro sueco Nug e um longa de Agnes Varda sobre a cena de Los Angeles nos anos 80.
Para Wainer, a pichação paulistana será a novidade da exposição, chamada "Nascido nas Ruas - Grafite", já que grande parte da mostra é registro histórico do movimento, com homenagens a Basquiat e Haring.
"Quero mostrar, da maneira mais fiel e isenta possível, porque eles [pichadores] fazem isso, quem são esses moleques, o que passa na cabeça deles", diz Wainer. O filme exibe escaladas arriscadas em prédios, imagens inéditas da invasão à faculdade Belas Artes e entrevista, entre vários outros, a pichadora Caroline Sustos, que foi presa pela invasão à Bienal.
Bola da vez?
Oliveira, Wainer e Cripta estão em Paris e, ontem, decidiam com os organizadores o tipo de intervenção. Até o fechamento desta edição, o combinado era Cripta pichar a fachada externa, ao lado de uma intervenção de Barry McGee, pioneiro do grafite de Nova York, dos anos 70.
"Quero explorar várias estéticas do movimento, fazer o meu "pixo" mesmo, o Cripta. Vou ver na hora, sabe como é?", disse o pichador. Além de cinegrafista, ele também é dono da coleção de folhinhas que a fundação vai expor. Como tradição do movimento, pichadores trocam entre si essas folhas de papel sulfite, com assinaturas de seus respectivos grupos. Cripta coleciona desde 98 e tem mais de 300.
Para ele, pichação é, sim, arte, já que as letras são trabalhos elaborados de criação e porque muitos ainda colocam a vida em risco em nome da obra, "um grito existencial da periferia".
E, apesar de alguns "conservadores do movimento" serem contra essa exposição, há também os que são a favor. "Agora é a vez do "pixo". É a bola da vez no mundo da arte [...] Faltava era o circuito das artes reconhecer, porque eles simplesmente rejeitavam. Mas agora eles estão começando a ver a importância", diz Cripta.
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