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Abolição da escravatura e as igrejas evangélicas
Os primeiros protestantes chegaram ao Brasil ainda no período da escravidão. Era um grupo composto principalmente por defensores da escravidão, omissos, e poucos abolicionistas. No Geral os protestantes não tiveram um papel relevante na abolição da escravatura. Conhecer esse passado da Igreja Protestante no Brasil pode nos ajudar a entender a relação da Igreja Evangélica Brasileira com o negro: sua cumplicidade na escravidão, sua omissão no passado e no presente diante do racismo, e seu silêncio no púlpito com a temática negra.
Por Hernani Francisco da Silva
Vejamos cinco casos da questão racial no Brasil, de repercussão nacional, que as igrejas evangélicas foram e são omissas:
Centenário da abolição da escravatura
Em 1988, ano em que se comemorava o centenário da abolição da escravidão no Brasil, as igrejas evangélicas perderam uma grande oportunidade rumo a remissão dos 100 anos de omissão com relação ao povo negro. Os movimentos negros naquela ocasião buscavam uma oportunidade à reflexão, não era um momento festivo. A Igreja Católica lançava a campanha da fraternidade: “Ouvi o clamor deste Povo”, com a temática Negra. Enquanto as igrejas evangélicas repetiram o que fez 100 anos antes na “abolição da escravatura”, mais uma vez omissa, ficando de fora, perdendo o seu testemunho cristão e o bonde da história.
Questões dos quilombolas
O quilombo constitui questão relevante desde os primeiros focos de resistência dos africanos ao escravismo colonial, e retorna à cena política durante a redemocratização do país. Trata-se, portanto, de uma questão importante na luta dos afrodescendentes. Nos últimos vinte anos os descendentes de africanos organizados em Associações Quilombolas, em todo o território nacional, reivindicam o direito à permanência e ao reconhecimento legal de posse das terras ocupadas e cultivadas para moradia e sustento, bem como o livre exercício de suas práticas, crenças e valores considerados em sua especificidade.
Com exceção da Igreja Anglicana, que em uma carta — Igreja Anglicana em defesa dos Quilombolas — em abril de 2009, assinada pelo seu bispo primaz, dirigida ao Supremo Tribunal Federal (STF), contra a Ação de Inconstitucionalidade apresentada pelo DEM (ex-PFL), as demais igrejas continuam totalmente omissas com relação à questão dos quilombolas.
Questão da intolerância religiosa
Outra questão preocupante é a intolerância religiosa, sobretudo em relação aos seguidores de religiões de matriz africana. Um dos casos de maior repercussão foi o que vitimou a yalorixá Gildásia dos Santos, a Mãe Gilda. Sua morte gerou indignação de lideranças de diversas religiões, processo na justiça e, como forma de reconhecimento, a instituição do dia 21 de janeiro como Dia Municipal de Luta contra a Intolerância Religiosa — que depois ganhou também um reconhecimento nacional.
Sabemos que a intolerância religiosa pode resultar em perseguição religiosa e ambas têm sido comuns através da história. A maioria dos grupos religiosos já passou por tal situação numa época ou noutra. Os próprios evangélicos eram chamados de bodes ou nova seita. Bíblias eram confiscadas e queimadas na praça das cidades. Muitos tiveram suas casas incendiadas criminosamente, seus bens extraviados, suas vidas vilipendiadas. Essas mesmas igrejas hoje, omissas e até mesmo intolerantes, não podem esquecer que as Igrejas Evangélicas já foram perseguidas pelo ímpeto da intolerância.
A maldição do povo negro e africano
Dizem que a maldição de Cam está sendo simplesmente cumprida à medida que os negros vivem para servir a outras raças, particularmente aos brancos. George Samuel Antoine, Cônsul do Haiti no Brasil, numa entrevista veiculada pelo SBT, apontou como possível causa do terremoto certa maldição que pesa sobre o povo africano. Ao fazer tão infeliz comentário, o Cônsul não sabia que ainda estava sendo filmado. Na mesma direção o tele-evangelista estadunidense Pat Robertson explica as “desgraças” haitianas como sendo consequência de “pactos” ocorridos há duzentos anos entre os haitianos e o demônio. Também o pastor e deputado federal Marco Feliciano diz no Twitter que “africanos descendem de ancestral amaldiçoado”. O parlamentar, que é pastor e empresário, afirmou que: “Sobre o continente africano repousa a maldição do paganismo, ocultismo, misérias, doenças oriundas de lá: ebola, Aids, fome…”.
Entretanto, a questão que fica é: de onde vem essa ideia de maldição dos negros? Essas ideias vieram dos missionários, sulistas racistas, que tinham a escravidão como instituída por Deus, para justificar a escravidão, baseando-se em argumentos teológicos de que o povo negro era da descendência de Cam, filho de Noé, amaldiçoado para serem escravos dos escravos. O mais triste de tudo isso é que nenhuma denominação protestante ou liderança evangélica se manifestou diante dessas declarações. Mais uma vez as igrejas são omissas reforçando uma doutrina diabólica aceita por muitos crentes dentro dos seus templos.
A questão das cotas
A decisão do Supremo sobre cotas marca um momento histórico. A mais alta corte de Justiça do país admitiu não só que existem brasileiros tratados como cidadãos de segunda classe, mas que eles têm direito a um tratamento especial para vencer sua desigualdade. As ações afirmativas ou sistema de cotas é certamente o assunto mais polêmico quando se trata do ingresso no ensino superior no Brasil. O STF julgou a constitucionalidade das cotas aplicadas na Universidade de Brasília desde 2004: 20% das vagas para “negros e pardos”. O partido Democrata (DEM) tinha acusado a medida de ser anticonstitucional.
Outra vez as igrejas evangélicas ficam de fora de mais uma grande questão do povo negro, omissa e silenciosa. Agindo como na parábola do bom samaritano narrada por Jesus nos evangelhos: passando de largo diante das questões dos negros e negras.
As organizações ecumênicas Cese e Koinonia têm realizado diversas ações referentes às questões dos quilombolas e à intolerância religiosa, mas não falam pelas igrejas evangélicas, são vozes proféticas solidárias e solitárias que são criticadas por essas igrejas por suas ações na questão racial.
Hernani Francisco da Silva Hernani é secretário executivo da Comissão Ecumênica Nacional de Combate ao Racismo (CENACORA), profissional de comunicação e marketing e empreendedor social da Ashoka. Fundou em 1991 a Sociedade Cultural Missões Quilombo para modificar a visão que as igrejas evangélicas têm da cultura negra. Recebeu em 2000 o Prêmio Direitos Humanos, da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Governo Federal. É autor de Movimento Negro Evangélico: um mover do Espírito Santo? pelo Selo Negritude Cristã.
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Um comentário:
Nós como cristãos que somos temos que fazer a nossa parte temos que ter em mente que a graça é sem acepção de pessoas e para Deus não há grego,judeu,gentios somos um em Cristo.
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