Começa nesta terça a quinta edição do Festival de Arte Negra


Evento reúne atividades de dança, literatura, teatro e cinema. Artistas mineiros cobram mais presença na programação

Janaína Cunha Melo - EM Cultura
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A quinta edição do Festival de Arte Negra (FAN) começa nesta terça, em Belo Horizonte, com programação voltada para o Ano da França no Brasil, convidados internacionais, de outros estados brasileiros e artistas locais e com objetivo de descentralização que leva todos os espetáculos e atrações para o entorno da Lagoa da Pampulha. Entre os convidados, estão o coreógrafo franco-senegalês Patrick Acogny, o cantor Jorge Dissonância, de Sergipe, a percussionista Simone Soul, de São Paulo, e o músico, ator e dançarino mineiro Benjamin Abras, entre dezenas de outros convidados. Eles participam de um dos maiores eventos da cultura negra realizado na América Latina, até o próximo domingo, que este ano aborda o tema Os congos daqui recebem os congos de lá, com foco nas relações produzidas pela diáspora africana no mundo.

A proposta, explica o bailarino Rui Moreira, curador do FAN ao lado do ator Adyr Assunção, é revelar a arte negra, em sua unidade e fragmentação, de modo a criar novas formas de pensar o sentido das produções culturais no mundo contemporâneo. Espetáculos de teatro, música, oficinas, sessões de cinema, exposições de artes plásticas, aulas abertas e montagens conjuntas têm entrada franca e são apresentados a partir de diferentes pontos de vista. Desta vez, um único palco concentra as atrações, como forma simbólica de atribuir o mesmo grau de relevância a todas as expressões. Durante o festival, a região que envolve Casa do Baile, Praça da Pampulha e Igreja de São Francisco de Assis será identificada como Mercado de Culturas – Ojá, onde serão instalados espaços de convivência destinados à gastronomia, literatura, exposições, comércio de artesanato, debates, palestras e shows.

Beto Magalhães/EM/D.A Press
Rui Moreira (E) com o coreógrafo franco-senegalês Patrick Acogny e os bailarinos que participam de espetáculo Retour au pays, na quinta-feira

A prioridade da curadoria é estabelecer conexões que representem início de intercâmbios que possam ser mais duradouros que o encontro ocasional entre os artistas. “Pensamos em ações que não se esgotem neste momento, a partir da diretriz política de realizar um festival voltado para o Ano da França no Brasil”, afirma Rui Moreira. Nesta perspectiva, ele já comemora os resultados do Coletivo FAN da Dança, que começou a trabalhar antes mesmo do início do festival. Foram selecionados em audição sete dançarinos mineiros que constroem espetáculo com direção do coreógrafo franco-senegalês Patrick Acogny. “O resultado promete ser muito bom. Está sendo proposto um confronto por meio dos corpos dos bailarinos, com gestual de danças africanas e movimentos do repertório brasileiro. Tudo isso embalado pela música de Paulinho Santos. Este trabalho deixa explícitas as inúmeras possibilidades de intercâmbio entre os países”, diz o curador.


O deslocamento do Festival de Arte Negra para a Região da Pampulha visa a valorizar um dos mais significativos cartões-postais da cidade, ao mesmo tempo em que promete a ocupação temporária de espaço que ainda não havia acolhido o evento. “Estamos trabalhando a ideia de empoderamento de outros lugares. A arte negra precisa circular pela cidade e não ficar limitada ao Centro. Queremos que esta edição do FAN seja a marca da mobilização descentralizada, para ganharmos mais um território.” Rui Moreira lembra que a Pampulha recebe pelo menos duas grandes celebrações populares – a Festa de Iemanjá e as comemorações do ano-novo. O local será sinalizado por exposição ao ar livre de painéis de grande porte, com fotos de Eustáquio Neves. Para garantir o acesso de moradores de outras regiões da cidade, a organização do evento discute alternativas com a BHTrans, com relação ao transporte público, como aumento no número de ônibus em circulação no horário do festival.

Mobilização e espaço

Apesar do porte da realização, artistas locais atuantes no movimento negro elogiam o formato do festival, mas criticam os critérios que definem a programação. Eles argumentam que não se sentem representados como artistas mineiros e reivindicam mais espaço para os grupos locais. “Não que seja desmerecida a participação dos convidados, mas este é um espaço que também precisa ser nosso. Há muitas atrações internacionais e brasileiros consagrados, quando há inúmeros artistas em Belo Horizonte com trabalho de muita qualidade que a própria cidade não conhece”, avalia Thelma Gomes, produtora do grupo Fala Tambor. Para ela, uma das alternativas para o problema seria a realização de reuniões periódicas, para participação de grupos, artistas e comunidade, para colaborar com a curadoria.
Meibe Rodrigues, atriz e fundadora do coletivo Negraria, acrescenta que o número reduzido de artistas mineiros pode gerar a falsa impressão de que a produção local é pequena ou irrelevante. “Isso seria um erro porque é justamente o contrário. Temos grandes artistas, que inclusive estão no mercado, realizando trabalhos muito bacanas e representativos. Não sou contra o festival, que é um evento que realmente coloca o artista e o corpo negro em cena. O que falta é apenas encontrarmos uma forma de dar mais vazão à produção local”, diz. A atriz não atribui responsabilidade unicamente à curadoria. Para Meibe, é necessário que os artistas se mobilizem e que o poder público também esteja atento à necessidade de equilíbrio.


Rui Moreira, que participa do FAN desde a primeira edição – quando foi convidado como artista –, passou a atuar como integrante da curadoria já no biênio seguinte. Ele lembra que a cada dois anos o evento é gestado de acordo com as condições de logística e orçamentárias definidas pelo poder público, por meio da Fundação Municipal de Cultura, e que diversas estratégias de gestão já foram experimentadas. “No atual momento de democracia, as pessoas têm encontrado uma forma melhor de reivindicar seus espaços e isso é bom, demonstra amadurecimento. Mas é preciso que todos se apropriem destes lugares e que comecem a influenciar por meio de mais interlocução. A cultura negra não vive só de produção, mas do resultado da mobilização que ela gera”, responde o curador. Ele lamenta que as discussões sejam propostas apenas poucos dias antes do início do festival e se encerrem ao final do evento. “Temos dois anos para discutir e as pessoas só se manifestam na véspera”, afirma.

PROGRAMAÇÃO

TERÇA-FEIRA

Na Casa do Baile
Cinema para escolas: Mostra Fespaço 40 anos
Às 9h, 14h e 16h

Vernissage da exposição Jovens artistas negros, com curadoria de Emanoel Araujo
Às 20h

QUARTA-FEIRA

Na Casa do Baile
Cinema para escolas: Mostra Fespaço 40 Anos
Às 9h e 14h

Palestra Literatura negro-brasileira, com Luis Cuti
Às 16h


QUINTA-FEIRA

Na Casa do Baile
Cinema para escolas: Mostra Fespaço 40 Anos
Às 9h e 14h

Palestra da cineasta Raquel Gerber e exibição do filme Ori
Às 15h30

Na Praça da Pampulha
Estreia do espetáculo Retour au pays, do Coletivo FAN da Dança
Às 19h



Toda a programação tem entrada franca

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