Por dentro do hip hop


Por Mayara Penina

Ele tem sete livros publicados, é dono de uma livraria dedicada à literatura marginal, apresenta o quadro “Suburbano Convicto” no programa “Manos e Minas” da TV Cultura e dirigiu o filme "Profissão MC". Ele é Alessandro Buzo, vindo diretamente do Itaim Paulista, e também é conhecido como Suburbano Convicto.

Seu trabalho mais recente foi lançado há pouco, o livro “Hip Hop: Dentro do Movimento”, integrante da Coleção Tramas Urbanas da editora Aeroplano.

O Mural bateu um papo com ele sobre o projeto. Confira abaixo.

O nascimento do livro

“Eu tive a ideia de escrever o livro porque, apesar de existirem várias teses sobre hip hop, vários livros, é muita teoria. Precisávamos de um espaço para as pessoas deixarem suas percepções, mostrar como é por dentro o movimento. É muita gente envolvida, há os pessimistas, os otimistas, o pessoal da nova geração, da velha escola e todos têm muito o que contribuir para documentar esse cenário”, explica.

Dentre os quase 50 depoimentos colhidos há nomes como GOG, Thaíde, Negra Li, Dexter, Nina Fidelis, Rappin Hood, Paula Lima e Nelson Triunfo. O livro foi produzido em apenas cinco meses e, para Buzo, só foi possível porque ele conhecia muitos dos entrevistados.

Nenhuma metodologia ou linha de estudo teórico foi usada pelo escritor, tudo foi escrito de maneira muito livre. “É uma conversa de mano, um papo de botequim.”

As entrevistas foram divididas em grandes temas como mulheres no hip hop, polêmicas, origem do hip hop, grafite e mídia.

História, grande mídia e polêmica.

Alguns entrevistados falam do início do hip hop no Brasil. Dário, dono da extinta loja Porte Ilegal na Galeria do Rock (onde hoje funciona a 1 da Sul), conta como o movimento começou a se expandir em São Paulo. “Aquela loja era uma faculdade de rap. Se você ficasse um tempo lá, você aprendia muita coisa, porque aparecia rapper, DJ, grafiteiro”, diz Buzo.

"Nelson Triunfo e Thaíde contam com bastante fundamento sobre história do hip hop", complementa.

Sobre a cobertura da imprensa, Buzo afirma que “a grande mídia não sabe trabalhar o hip hop, às vezes eles acertam e às vezes erram, às vezes querem se aproximar e não conseguem. O hip hop veio da periferia, por isso quem entende essa linguagem são as pessoas da periferia e esse conhecimento as redações dos grandes jornais não tem. Há bons jornalistas, porém não sabem tratar o tema”.

Mas ressalta que também é importante estar nos grandes veículos: “Se não, vamos ficar falando para as mesmas pessoas. Só a rádio 105 FM vai tocar nossa música?”, questiona.

Segundo Buzo, estar nos grandes veículos possibilita atingir muitas pessoas, ainda que superficialmente. “Imagina você alcançar alguém que nunca nem ouviu falar de literatura marginal. Imagina como é receber ‘O Globo’ ou o ‘Estadão’ em casa e ver na primeira página do caderno de cultura um cara que escreve na periferia. É uma visibilidade que não pode ser desperdiçada”, explica.

Uma das entrevistas de maior repercussão foi a do produtor Celso Athayde. “Ele conta que entrou no hip hop pra ganhar dinheiro. Quem gosta de rap, mas só ouve Racionais MC e Rappin Hood, vai ler várias coisas surpreendentes e que vão mexer com a mente”, revela o autor.

E cadê o Mano Brown?

Alguns leitores sentiram falta de ícones do rap como Mano Brown, vocalista do Racionais MC, e questionaram o autor, que responde com o argumento que o livro está completo e tudo foi dito. “O Brown tem uma agenda muito cheia e não é muito acessível, então não o procurei. Eu cheguei em quem estava mais fácil.”

O papel social do hip hop

“Hip hop é vida. Quando um moleque dança break, por exemplo, ele é um grande beneficiado, mesmo não sendo famoso ou colecionador de prêmios, porque estando ali, ele fica longe do crime e das drogas. Eles têm uma postura diferente, são atletas e se preocupam com o corpo.

“O povo tem uma visão de que ‘os maluco é tudo doidão’, mas é todo mundo família. Hip hop é o que eu quero para o meu filho. E se eu quero para o meu filho, só pode ser bom.”

Mayara Penina, 20, é correspondente comunitária de Paraisópolis.
@emayara
mayarapenina.mural@gmail.com

Escrito por Blog Mural às 16h48

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05/04/2011

Além das memórias da Penha

Por Samantha Evangell

Lugar de manifestações culturais e religiosas, em uma pequenina e charmosa casa da década de 30, se encontra o Memorial Penha de França que mantém o acervo iconográfico do bairro mais antigo de São Paulo e encanta a qualquer pessoa que o visita.

O engenheiro Francisco Folco, que diz que não troca a Penha por nada, é quem administra, organiza o acervo e as visitações.

O memorial também é ponto de encontro entre pessoas que gostam de trocar idéias relacionadas a história, arte e entretenimento. Para quem quer aprender e ou aperfeiçoar seus talentos na área de fotografia e história da arte, no local também são ministrados alguns cursos livres muito acessíveis.

O memorial é estimado pela comunidade, tanto pelos mais novos moradores quanto pelos mais antigos. Promovendo ações de valorização do patrimônio histórico e cultural da Penha de França, o local não só guarda histórias, mas também constrói sua história na região.

Samantha Evangell, 23, é correspondente comunitária de Cidade Tiradentes.
@Sam_Evangell
Samantha.mural@gmail.com

Escrito por Blog Mural às 20h33

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04/04/2011

Dor crônica: não há heróis aqui

Por Leandro Machado

7h56: Cheguei cedo ao Hospital Regional de Ferraz Vasconcelos. Sei que, para ser atendido rapidamente no Sistema Único de Saúde (SUS), o melhor mesmo é ir antes das 10h. Tenho pedras nos rins: sinto dores de bomba atômica. Na entrada do hospital, pego a senha para preencher a ficha de pacientes. Para isso tenho de esperar até que meu número, o 439, seja anunciado no visor. O último paciente chamado quando cheguei era o 351. Há 88 pessoas à minha frente.

8h: Sento-me em uma das cadeiras da sala de espera. Não há muitas, aliás. Pelo menos não o bastante para que todos se acomodem. Por isso as pessoas mais velhas ou com mais dores são priorizadas. Como eu me encaixava no perfil, permaneci na cadeira. Vi uma mulher com conjuntivite (doença da moda!) se levantar para dar lugar a uma senhora com dores na barriga.

8h23: Uma mulher pede dinheiro aos outros pacientes. “Um real, por favor, não tenho dinheiro para comprar meu remédio”, diz ela. Ninguém dá (ou ninguém tem).

8h40: Sou chamado para preencher a ficha. A recepcionista me pergunta o nome, o endereço, o telefone etc. Em seguida sou encaminhado para o setor de triagem, onde medem minha pressão. Mas a coisa não é tão rápida: só entro na sala depois de enfrentar uma fila de 10 minutos.

9h10: Sinto que meus rins vão explodir. Tenho uma bomba dentro de mim e não sei bem o que fazer com ela. Chamo minhas pedras de “Rolling Stones”, pois elas migram de um rim ao outro. No ano passado, elas estavam no direito; agora, no esquerdo. Há pedras, mas não há caminho que não seja um Buscopan na veia.

9h30: Algumas pessoas se revoltam com o atendimento do hospital. Cria-se uma pequena confusão. Uma mulher diz que, mesmo chegando às 7h, ainda não tinha sido atendida, enquanto outros foram chamados em menos de 40 minutos. Um senhor reclama que sua ficha sumiu: chegou às 6h30. Pacientes e funcionários discutem em voz alta. Uma funcionária diz que as pessoas com conjuntivite serão priorizadas.

9h53: Depois da discussão, algumas mulheres vão à ouvidoria para reclamar. Apenas um médico faz o atendimento de, pelo menos, 150 pessoas. Para minimizar a demanda, o consultório permanece com as portas abertas. Realmente, abrir e fechar a porta toma muito o tempo do médico. Imagina, se ele fizer isso com todos os pacientes, a situação vai piorar: talvez todos morram de dor ou desespero.

10h12: A única coisa boa de hospital é descobrir que você não é o único doente do mundo. Há pessoas piores que você! Há dores piores que a sua. Olha essa gente morrendo nas cadeiras e você aqui reclamando de umas pedras no seu rim? Cadê a solidariedade, companheiro? Não se revolte, pense que o mundo está doente enquanto você exagera nessas páginas de bloquinho.

10h31: Levanto e vou ao banheiro. Qual é a surpresa? O banheiro está desativado. Se não há médicos, seria demais esperar que houvesse banheiro, né? Penso em explodir esse hospital com as bombas empedradas no meu rim. O José Alencar seria um herói se dependesse do SUS?

11h02: Sou chamado, três horas depois de chegar. Antes de entrar, enfrento mais um fila de pacientes. À minha frente, duas pessoas com a doença da moda. Meus olhos coçam ou será imaginação? Entro na sala e faço questão de fechar a porta. “Pode deixar aberta”, pede o médico. “Prefiro fechada”, digo. O atendimento dura três minutos, aproximadamente. Há um tempo a cumprir, uma papel a despachar... Não tem heróis aqui: vá embora e morra em casa, companheiro!

Ilustração: Daniela Araujo

Leandro Machado, 22, é correspondente comunitário de Ferraz de Vasconcelos.
@machadoleandro
lmachado.mural@gmail.com


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