Vestibular e racismo

Leonardo Alves Ferreira

Em meio à discussão sobre cotas nas universidades, em que pesam as dúvidas de como será verificada a raça do candidato, se pardo também tem direito, se esse "benefício" é estendido aos descendentes de negros (recentemente, uma aluna perdeu direito à vaga pois, conforme verificou-se depois, "não era negra suficiente"), qual será a porcentagem de vagas, se é uma reparação de erro histórico ou de sofrimento, enfim, há um fato que, se não é levado em consideração, pelo menos está sendo ignorado neste debate: o vestibular é um método racista?

Que há mais brancos do que negros nas universidades é fato. Nem é preciso de pesquisas, basta visitar qualquer faculdade do país para se comprovar isso. Quanto a haver mais ou menos pardos, aí já é mais difícil, afinal, quem é pardo no país? Aliás, qual o critério para sê-lo? Talvez a comissão da Universidade de Brasília (UnB), aquela que pode dizer - apenas dando uma olhadinha em uma foto - se fulano é negro, pardo ou mameluco, tenha esta resposta. Pois bem, o fato incontestável é que, levando-se em consideração o tamanho da população negra do país, esta está ridiculamente representada nos bancos de ensino superior.

Mas, diferente dos Estados Unidos, de onde surgiu a inspiração para essa política de cotas, o sistema de ingresso nas faculdades brasileiras é apenas objetivo. Faz-se uma prova, apenas isso. Não há estudos de currículo, entrevistas ou quaisquer outros meios que possam levar em conta algum critério subjetivo. Portanto, se algum candidato não passa no vestibular, isso não decorre, em hipótese alguma, do fato de ser negro, índio ou mulato. Desta forma, se a cor da pele não é de maneira alguma critério - seja implícito ou explícito - para ingresso nas universidades, qual a lógica de se criarem cotas que visam justamente atender candidatos a partir de sua etnia?

Qualquer olhar, seja ele raso ou profundo, enxerga que, no caso específico dos vestibulares, aqueles que estão em desvantagem são os que não tiveram condições de se preparar para as provas; não só às vésperas do exame, mas durante toda a vida. Os motivos? Ora, a qualidade do nosso ensino público que, de tão baixa, cria a enorme vantagem àqueles que estudam em escolas particulares. E os que estudam em boas escolas, lá estão por quê? Somente porque são brancos? Certamente não. Quem estuda em boas escolas é porque pode pagar por isso.

Portanto, o cerne da questão não está na cor da pele: está na pobreza, que não dá outra opção à maioria de nossa população senão ter que estudar em colégios gratuitos e com níveis muitas vezes pífios de ensino. O racismo, neste caso, passa a quilômetros do vestibular.

Se a questão é facilitar o ingresso nas universidades, por que não dar espaço à "cota social", onde parte das vagas seja destinada a candidatos comprovadamente oriundos de escolas públicas e/ou de baixa renda? Neste modelo seriam contemplados todos aqueles que não tiveram acesso a um ensino que os possibilitasse chegar às universidades em pé de igualdade com os demais. E isso, certamente, incluiria todos os brasileiros, independente da cor da pele.


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