Onde estão os Panteras?

Os ex-deuses mostraram sua vulnerabilidade e
foram destruídos. Os líderes que sobreviveram acabaram
absorvidos pelos partidos políticos tradicionais dos EUA.

Por Neusa Maria Pereira • Versus 20 • abril de 1978

Desde que o Partido Revolucionário dos Panteras Negras foi destruído pelos agentes do F.B.I. os negros americanos ficaram sem uma opção política na qual realmente confiassem. Se o F.B.I. entrou com força total para acabar com o Poder Negro, este também teve sua parcela de culpa para que isso acontecesse. Isso se deu no momento em que esses ativistas tornaram-se ultra-esquerdistas, afastando-se da massa negra, perdendo seu apoio e virando presa fácil da polícia americana.

Mesmo assim, no pouco tempo em que estiveram em ação, os Panteras conseguiram alguns resultados positivos. Ensinaram seus irmãos a ter orgulho de sua raça, a se reconhecerem belos e, principalmente, despertaram na massa a combatividade. Afastaram dela o medo de enfrentar o regime segregacionista que lhe fechava todas as portas de emprego, escola, ônibus, hospitais e moradias.

Foram tempos duros. Inúmeros jovens brutalmente assassinados, alguns dos mais importantes líderes do Movimento no exílio, para depois, ao voltar, irem para as sórdidas cadeias americanas, desumanas principalmente para negros, e fundamentalmente para negros com idéias revolucionárias. Após dez anos, o F.B.I. provou que seu trabalho foi bem executado. Não existe um movimento negro, hoje, capaz de incomodar o bem-estar da classe dominante. Os ex-deuses de carne negra mostraram ser vulneráveis e foram destruídos. Os que conseguiram escapar graças a seu carisma foram absorvidos pelo governo em seus partidos políticos.

Angela Davis, que atualmente tem um escritório na Califórnia onde desenvolve um trabalho na área judiciária visando obter julgamentos mais honestos para os negros, entrou para o Partido Democrata, cama de racistas sulinos. Também Hucy Newton, um dos fundadores dos Panteras Negras, que, antes, dizia que a violência nos Estados Unidos era tão comum como torta de maçã, entrou para o Partido Democrata de Jimmy Carter.

Bobby Seale, um dos teóricos dos Panteras, entrou para o Partido Democrata também, e candidatou-se a prefeito de Oakland, local onde até hoje os Panteras são respeitados, pois foi lá que surgiram. Eldridge Cleaver agora encontrou Deus e virou pastor, anda pregando a Bíblia. Há dez anos, ele falava que somente o socialismo seria a salvação para os povos oprimidos do terceiro mundo e dos Estados Unidos. A violência não conseguiu destruir Stockley Carmichael. Apesar de perseguido – atualmente está proibido de sair do país – fundou a seção americana do Partido Revolucionário de Todos os Povos Africanos, que levanta bandeiras reivindicatórias específicas. Stockley vive dando conferências nas universidades americanas, denunciando todos os crimes do regime capitalista americano. Até quando?

Os muçulmanos, dos quais os Panteras Negras sofreram grande influência por intermédio de Malcolm X (que antes de morrer havia rompido com eles pelo fato de não quererem participar das lutas gerais da sociedade), estão calmos. Fecharam suas bocas para assuntos políticos. Deixaram de pensar num Estado Negro separado, pelo menos por enquanto. Estão apenas rezando e aprimorando seu ódio contra o branco.

Não há mais grandes mobilizações de negros nos Estados Unidos. A ação do F.B.I. contra os Panteras faz todo mundo pensar duas vezes antes de agir. A falta de uma política conseqüente fez a comunidade negra cair no conto de Jimmy Carter. Dos 25 milhões de negros existentes nos EUA, mais de 40% votaram em Carter para presidente, atraídos por promessas de empregos, escolas, moradias, melhores condições de vida. Mais uma vez foram enganados.

Assim que entrou na Casa Branca, o defensor dos direitos humanos esqueceu tudo. Hoje, 25% da população está desempregada. Está cada vez mais difícil encontrar casa para morar. Aí o sistema capitalista-racista atira cada vez mais pessoas para os porões famintos e fedidos do Harlem, Washington, Detroit, cidades onde é grande o número de negros. A pequena burguesia foge para o subúrbio deixando a sujeira, a miséria e o crime para os moradores dos grandes centros urbanos: negros, chicanos, porto-riquenhos e sul-americanos.

Existe ainda o problema das escolas, que são poucas, com professores deficientes e mal pagos pelo governo. São inferiores às escolas brancas. Para que o povo não reclame muito, o sistema utiliza seus “testas de ferro”, os prefeitos negros que não lutam por melhores condições de vida para sua comunidade. O mais novo boneco do sistema americano é Andrew Young, discípulo de Martin Luther King, pacifista e apenas preocupado em interromper o avanço das lutas do povo negro.

A crise internacional do capitalismo, mesmo no país matriz, faz a corda arrebentar do lado mais fraco. É preciso sobreviver, e só há uma maneira para milhares de negros americanos: roubar, que também é uma forma de contestar o sistema capitalista. Mas, na maioria das vezes, isso custa caro. Custa a prisão. Segundo dados da Anistia Internacional, as cadeias dos Estados Unidos estão lotadas de pessoas condenadas por suas crenças, origem racial e social. A maioria desses presos são negros. Muitos deles continuam na prisão, acusados de praticarem delitos comuns, mesmo depois de provarem sua inocência. Apesar de tudo, o “paladino dos direitos humanos” exige que outros países cumpram o que ele não faz no seu próprio país, disse Angela Davis, recentemente em Paris.

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