Individualismo e a religião

Os pobres precisam estar unidos em torno da mesma causa

Lair Mattar - Mestre em educação pela UFMG

No Brasil, as pessoas têm preferido se apoiar nas crenças religiosas ou nas esotéricas, em vez de se organizar e de se mobilizar para lutar por melhores condições de vida para todos. Ocorre que muitos dos problemas que parecem individuais são, na verdade, coletivos. Em geral, a educação na família e na escola pouco tem contribuído para a formação de cidadãos capazes de discernimento em suas escolhas. Falta consciência de classe no país. Excetuando-se as pessoas das classes dominantes, as outras têm dificuldade em perceber sua inserção na sociedade. O que prevalece é o esforço contínuo para diferenciarem-se das mais pobres. Disso se aproveita a propaganda, que dirige seus apelos consumistas exatamente aos indivíduos que procuram sua identidade social na negação da pobreza. Houve uma tremenda inversão de valores. Quem hoje teria coragem de se orgulhar de ser pobre, porém, honesto? Talvez os jovens se admirem de que isso já tenha ocorrido. É comum que se considerem bobos e até incompetentes os que não tentam se enriquecer, ainda que por meios ilícitos. Visto por esse ângulo, pode-se afirmar que aumentou a discriminação em relação aos pobres.

Em vez da solidariedade de classe social, o que domina o imaginário do brasileiro é a ideia da ascensão social, a qualquer custo. Como o acesso ao consumo vem sendo considerado um fator de ascensão na sociedade, as pessoas compram cada vez mais, mesmo que, para isso, tenham de se endividar. Quando, no entanto, esgota o crédito, muitas delas recorrem às religiões em busca de prosperidade. A fim de atingir igual meta, outras apelam para o poder do pensamento positivo. Determinadas seitas religiosas chegaram a oficializar a imagem de um deus provedor de bens materiais aos fiéis, prometendo a obtenção da graça desejada em troca de doações em dinheiro. Há casos, inclusive, de redes de estelionatários atuando em várias delas. Os idosos, apesar de ter os direitos garantidos pela Constituição e por um estatuto, continuam sendo as principais vítimas desses aproveitadores. Isso significa que não está havendo a fiscalização necessária ao cumprimento da lei. Quanto ao engodo da solução fácil dos problemas, nem a classe média escapa. Sua opção, entretanto, é pelo esoterismo, tido como filosófico e científico, pois promete sabedoria aos seus adeptos, além, evidentemente, de riqueza e de sucesso pessoal.

A solidariedade de classe social é imprescindível para que a democracia brasileira seja consolidada também no plano econômico. Os pobres precisam reconhecer-se como pares e lutar juntos, para alcançar as conquistas econômicas e sociais de que necessitam. Brecht, em um dos seus poemas, expõe essa questão de forma magistral: “E os sofredores mesmos partilham dessa dureza contra si e deixam que/ lhes falte bondade entre si./ (...) Todos os que meditaram sobre o mau estado das coisas recusam-se a apelar/ à compaixão de uns por outros. Mas a compaixão dos oprimidos pelos/ oprimidos é indispensável./ Ela é a esperança do mundo”. (Poemas 1913-1956. SP: Ed.34, 2000).

Nenhum comentário: