BH - 39% Dos Alunos Já Foram Assaltados Dentro da Escola


Favela brasileira
Escolas em áreas mais carentes são os maiores alvos de violência
Uma pesquisa realizada pelo Centro de Estudos da Criminalidade e Segurança Pública (Crisp), da Universidade Federal de Minas Gerais, afirma que entre alunos entrevistados em 50 escolas de Belo Horizonte 36,9% já foram assaltados pelo menos uma vez dentro do estabelecimento de ensino.

De acordo com a pesquisa, os alunos respeitam mais as escolas com regras mais rígidas. Essas conclusões fazem parte do estudo Perdas Sociais Causadas pela Violência, atualmente aplicado na área metropolitana de Minas Gerais e que, no futuro, abrangerá todo o Estado.

O coordenador-geral do Crisp, Cláudio Beato, diz que a pesquisa foi desenvolvida com o objetivo de entender o impacto da violência na educação. O estudo foi entregue ao governo do Estado que resolveu estender o projeto para outras áreas de Minas Gerais.

Os resultados preliminares da pesquisa apontam, entre outros fatores, "a ausência de preparo das escolas e a perplexidade que as nossas escolas têm para lidar com a violência", segundo Cláudio Beato.

Novidade

O pesquisador alega que o desconhecimento de como lidar com o problema é causado porque a violência é relativamente uma novidade no âmbito escolar.

"Os professores não sabem o que fazer, o poder público também não tem noção muito clara do que está acontecendo. Então, como resultado disso, você tem as reações mais tradicionais quando surge o problema, que é chamar a polícia e levantar muros", afirma Beato. "A tendência natural quando você não conhece um problema é tentar se isolar."

A pesquisa indica ainda que as escolas que combatem a violência com "mãos firmes" são as menos atingidas com o problema.

Pesquisa sobre violência nas escolas de Belo Horizonte
27,8% dos alunos entrevistados disseram ter visto pessoas armadas dentro da escola pelo menos uma vez.
67,5% já viram ou ouviram falar de pessoas quebrando janelas ou tendo comportamento de desordem dentro da escola.
89,6% dos alunos já viram ou ouviram falar de desentendimentos entre pessoas dentro da escola.
52,6% já viram ou ouviram falar de criminosos ou bandidos na escola.
47% já viram ou ouviram falar de outros alunos sendo assaltados na escola.
36,9% dos alunos já foram furtados pelo menos uma vez.
15,8% já foram roubados pelo menos uma vez.
18,3% já foram agredidos fisicamente pelo menos uma vez.
10,4% já deixaram de ir à aula ao menos uma vez por medo de serem agredidos.
Fonte: Crisp

"Uma das coisas que nós detectamos com a pesquisa é que as escolas mais propensas à violência são justamente aquelas que se isolam mais das comunidades em que estão inseridas", diz o pesquisador.

"Quanto mais a escola é um ambiente estranho dentro de uma favela, por exemplo, mais o local será vulnerável a violência."

Claudio Beato diz que a reação natural das escolas é erguer muros, tentando se isolar da violência externa. Muitas vezes, essas escolas, no entanto, não punem corretamente os alunos que estão agindo de maneira irregular.

"O ambiente escolar é responsável pela criminalidade. São várias coisas, o conjunto de normas que são aplicadas, que fazem com que os alunos reconheçam aquilo e respeitem", afirma. "Escolas que possuem mais cuidado com a aplicação das normas obtêm melhores resultados."

"É até uma coisa natural de crianças e adolescentes ter limites. As escolas que sabem impor limites são menos propensas a atos violentos", acrescenta.

Conservação x violência

Segundo os resultados do estudo, o estado de conservação também pesa no ambiente escolar e no aumento da violência. Escolas freqüentemente pichadas, sujas, depredadas, com vidros quebrados, são normalmente as escolas com mais problemas.

Claúdio Beato afirma que a violência dentro e fora da escola acaba influindo diretamente no desempenho dos alunos.

O que afeta o nível de satisfação do aluno com o ensino?
Ocorrência de eventos contra a escola, como roubo e atos de vandalismo e depredação.
Fatores percebidos pelos alunos na região da escola, como brigas de gangues e pessoas usando drogas
Sentimento de insegurança no trajeto casa/escola.
Fonte: Crisp

"Uma coisa que nós percebemos é que o próprio ambiente de aprendizado é comprometido pela violência", diz o pesquisador. "As crianças temem pelo que acontece dentro e ao redor da escola. Elas começam a desenvolver um sentido maior de desconfiança, de medo, e até de uns em relação aos outros."

As normas são fundamentais para o combate a violência, segundo o coordenador-geral do Crisp. Muitas vezes, afirma Beato, o temor dos professores e a falta de regras fazem com que a violência faça parte do dia-a-dia da escola, enquanto outras ações de menor peso são punidas com maior rigor.

"Essa coisa das normas é muito importante. Tem alunos que vão armados para a escola. A escola que não consegue lidar com isso vai mandar uma mensagem muito ambígua para os alunos."

"Muitas vezes, os alunos são punidos por namorar na escola, mas se estão consumindo drogas, não. Porque o consumo de drogas em geral é feito por um grupo que os professores temem. Então, eles raramente tomam alguma atitude contra esse grupo. Os professores não estão preparados para isso."

Solução

Para Cláudio Beato, uma das medidas que pode ser adotada para a diminuição da violência é elaborar uma espécie de treinamento especial para os professores, uma forma de lidar com esta nova realidade.

"Os professores precisam saber lidar com os alunos problemáticos, ter um esquema de informações dentro da escola que permita identificar esses alunos. Hoje, isso não existe", diz o sociólogo.

"Os funcionários, muitas vezes, sabem quem são os alunos problemas, mas, em muitos casos, as próprias escolas até ocultam os problemas que ocorrem dentro de seu território para que não comprometam o nome da instituição".

Cláudio Beato afirma que a degradação das condições sociais em algumas das regiões do Brasil é ainda mais agravada por causa da violência.

"Esses lugares já são ruins e acabam ficando piores. O professor não quer trabalhar lá, o médico não quer ficar no posto de saúde, a prefeitura acaba tirando seus equipamentos desses locais", diz Beato.

"É quase uma inversão da equação. Não é a pobreza causando a violência, mas a violência gerando ainda mais pobreza", conclui.

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