Monique Renne/Especial para o CB | | Veterano das pistas de soul music, o DJ A Coisa discoteca há 32 anos. Trabalhando na noite como DJ ou produtor de eventos, sabe que não tem muitas garantias quanto ao futuro, tanto que contribui como autônomo para o INSS. “É o único meio de garantir minha aposentadoria.” De uma geração mais nova, Tee já soma 10 anos como DJ. Tem pensamento semelhante ao de A Coisa. “Como nada assegura a aposentadoria na minha área, pago uma previdência privada.” As situações vão se repetindo, com algumas variações, entre os DJs. Um projeto de lei em tramitação na Câmara pode mudar essa situação.
Pela proposta do deputado Brizola Neto (PDT-RJ) – PL-2.631/07 – a profissão de DJs e VJs poderá ser regulamentada. Se virar lei, a atividade só poderá ser exercida por profissionais que tenham passado por cursos, públicos ou privados, oficialmente reconhecidos. A justificativa apresentada pelo deputado é de que, há décadas, os DJs vêm atuando em diferentes espaços (clubes, casas de espetáculos, festas particulares etc.) e que “esses profissionais atuam na informalidade e quando contratados são registrados em outra classificação brasileira de ocupação”.
DJs de Belo Horizonte que estão há anos na labuta concordam com o projeto. Mas acreditam que da iniciativa sair do papel e ser posta em prática será um longo percurso. “Todo ano de eleição aparece alguém querendo regulamentar a profissão. Particularmente, já vi várias vezes essa história se repetindo e ela nunca se regularizou”, critica A Coisa. “Desde que comecei a tocar (há 18 anos) ouvi falar de coisas assim, mas nada vingou”, arremata Nedu Lopes.
Válber, que discoteca há 22 anos, aprova a idéia, “porque tira os picaretas da praça. Isso, automaticamente, vai dar mais espaço para nós trabalharmos.” Com a moda do DJ, ele comenta, o que não falta é gente que decide tocar “a troco de uma garrafa de uísque”. Tee vai pelo mesmo caminho: “O nível atual está ruim, um monte de gente tornou o DJ uma coisa fantasiosa, desmerecendo os profissionais sérios.”
Nedu Lopes afirma que um dos principais problemas que os profissionais estão tendo na atualidade é com a questão da imagem. “Como houve muita divulgação, hoje você vê DJ em novela, Big brother. Com isso, a profissão foi mais valorizada pela imagem do que pelo conteúdo. O que ocorre é que a nossa profissão é uma das poucas em que dá para fingir. Se um cara sabe fazer pose quando está num set, vão achar que ele é bom. Agora, já pensou um dentista ou engenheiro tentando fingir? Não tem jeito.”
Exigir um curso profissionalizante é um outro entrave, pois muitos DJs que vivem exclusivamente dessa atividade aprenderam na prática. Se a lei entrar em vigor eles terão que ir para a escola? “Um pintor, por exemplo, não precisa necessariamente ter feito curso para vender quadros”, chama a atenção Nedu Lopes, acrescentando: “Existem muitas maneiras de interpretar o trabalho do DJ. Tem o cara que passa música, aquele que toca produções próprias ou ainda o outro que apresenta trabalhos dos outros. Por outro lado, Tee acha que um curso seria um bom parâmetro para separar o joio do trigo. “Mas a gente tem que ver que o conceito artístico não é uma questão puramente técnica.”
De toda maneira, a polêmica é válida por chamar a atenção para as condições de trabalho. “Uma vez regulamentada a profissão, o DJ poderá ter carteira assinada, discutir salário, fundo de garantia, direito a férias”, comenta Tee. Direitos pelos quais alguns DJs vêm lutando há alguns anos. Em 1986, Válber se filiou ao Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões (Sated). “Na época, foi exigido que os DJs de casas noturnas se sindicalizassem. Fui ao Ministério do Trabalho, que carimbou minha carteira como discotecário. Mas 99% dos meus colegas não são sindicalizados. E a verdade é que, como a profissão não é regulamentada, o tratamento não muda se você é ou não.”
Nedu Lopes, quando foi residente do clube Fantasy, teve entre 2000 e 2003 a carteira assinada. “É uma coisa raríssima você conseguir isso como discotecário. Hoje, se você é residente de uma casa, quando muito tem um contrato. A maioria dos cachês é combinada mesmo na base da amizade.” Tee afirma que somente alguns festivais de maior porte e projetos realizados vias leis de incentivo exigem alguma documentação. “No resto, o que exigem mesmo é o reconhecimento que tem do seu trabalho.” Trocando em miúdos: o caminho é longo e pedregoso. Se virar lei, os profissionais poderão sair ganhando. “Se não, quando um DJ parar de trabalhar vai entrar do mesmo jeito que começou: com a mão na frente e a outra atrás”, conclui Válber.
Projeto de Lei 2.631/2007
O que diz
O DJ e o VJ profissionais serão reconhecidos em todo o Brasil. Para o exercício da profissão, serão necessárias a formação, treinamento e habilitação por meio de cursos profissionalizantes específicos, mantidos por entidades devidamente reconhecidas. Entre as atribuições dos DJs e VJs profissionais estão apresentação em festas, eventos, programas em rádio e televisão, locução publicitária, operar e monitorar sistemas de sonorização e gravação, mixar, remasterizar e restaurar registros e produções sonoras de dicos, fitas, vídeos, filmes e similares, executar e manipular mecanicamente música, produzir trilhas sonoras e produções musicais.
Justificativa
Há décadas os DJs atuam na informalidade e, quando contratados, são registrados em outra classificação de ocupação. Apenas no Rio, estima-se em acima de 100 mil os profissionais do gênero. Estima-se que o mesmo ocorra em outras regiões do país. |
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