A Morte Anunciada da Industria Fonogr[afica


Maestros gananciosos, gravadoras míopes, cachês multimilionários: há pelo menos uma década, o crítico britânico Norman Lebrecht vem listando esses fatores como responsáveis pelo que ele enxerga como crise da música clássica. Agora, chegou a vez de Lebrecht anunciar a morte não da música clássica em si, mas da indústria fonográfica, em Maestros, Obras-Primas & Loucura, que está sendo lançado no Brasil pela Record.


Além do título provocativo, o livro traz a habitual mistura de fofocas sexuais, detalhes de bastidores, anedotas e informações interessantes que vêm sendo a marca de Lebrecht desde When the Music Stops (Simon & Schuster, 1996), livro em que ele pela primeira vez chamou a atenção para as dificuldades enfrentadas pela música de concerto, depois da euforia gerada pelo "boom" da substituição dos LPs pelos CDs, no final dos anos 80.

Se, em O Mito do Maestro (Civilização Brasileira, 2002), Lebrecht faz uma espécie de "história crítica" da regência, procurando demonstrar como os egos inflados dos maestros teriam contribuído para um inflacionamento irreal dos custos de produção da música erudita, em Maestros, Obras-Primas & Loucura ele procura aplicar o mesmo método à indústria fonográfica.

Ou seja: o britânico se propõe a contar a história da indústria fonográfica. Mas não como um narrador distante, e sim como um investigador em busca das causas daquilo que ele vê como o irreversível fracasso deste ramo dos negócios.

A história de cada grande gravadora clássica (bem como dos pequenos selos que tiveram algum peso no desenvolvimento da indústria) é dissecada em detalhes que talvez não interessem ao leitor comum, como nomes de diretores, detalhamento de sua vida privada (com destaque para escândalos sexuais, hábitos de consumo extravagantes ou gosto por drogas, quando é o caso) e explicação das políticas que cada um deles fez sua empresa conduzir.

Estão lá o sucesso fonográfico de Luciano Pavarotti, antes e depois dos Três Tenores, bem como o sucesso do selo de discos baratos Naxos e as ameaças da internet ao formato do CD.

O livro tem o vilão favorito de Lebrecht, o maestro Herbert von Karajan, novamente no papel do ex-nazista que teria arruinado a música clássica para construir um império de fama, poder e dinheiro. No terreno da regência, o "mocinho", por seu turno, seria outro maestro, o húngaro Georg Solti, cuja gravação histórica da tetralogia do Anel do Nibelungo, de Wagner, pelo selo Decca, é contada de maneira meticulosa.

O "crossover", em geral, é condenado de maneira enfática. Lebrecht tem sido, antes de tudo, um polemista, e só assim é possível dar valor a seus textos. Se levado excessivamente a sério (como talvez seja sua pretensão), pode irritar, e não pouco - como na estéril discussão que tentou levantar em 2006, ano dos 250 anos de nascimento de Mozart, em que tentou comprovar, com argumentos ralos e pueris, que o compositor nascido em Salzburgo não merecia ser festejado como grande gênio da música.

Para o colecionador de discos, especialmente saborosas são as listas que Lebrecht inclui ao fim da obra, com as melhores e piores gravações eruditas de todos os tempos. Ao se assumir como arbitrária e subjetiva como toda listagem deste caráter, ela confere leveza à apreciação de um livro que não deve ser lido como mais do que é.

Fonte: Folha de S.Paulo


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