Quase 30 milhões de brasileiros entram hoje nas janelas da internet pelas portas de lan houses, o que corresponde a 49% dos acessos totais no país. No Norte e no Nordeste, esse percentual chega a 70%. As lan houses já somam mais de 80 mil unidades e estão espalhadas por grande parte das comunidades de baixa renda. Só na Rocinha, no Rio de Janeiro, existem 150 casas do gênero.
Por Rodrigo Baggio*
Não fossem questões legais, as lan houses poderiam ser ainda mais estratégicas para a inclusão digital, ou seja, mais bem utilizadas e integradas a programas sociais e políticas públicas. Segundo uma pesquisa em curso sobre lógicas do consumo das camadas populares, da Escola Superior de Propaganda e Marketing do Rio com o Comitê para Democratização da Informática (CDI), os freqüentadores de lan houses se sentem muito mais confortáveis e estimulados nesses locais do que em telecentros, mesmo pagando pelo acesso.
A recém-criada Associação Brasileira de Centros de Inclusão Digital nasceu justamente da preocupação em direcionar e potencializar o trabalho de lan houses, cibercentros, game houses e lojas de conveniência digital, visando a promover a formalização e a consolidação desse negócio. Atualmente, menos de 10 mil estabelecimentos operam de modo legalizado, o que facilita excessos e omissões por parte dos proprietários e dos que fiscalizam. Precisamos, por isso, e urgentemente, de um marco legal compatível com a realidade das lan houses, pois as leis em vigor são verdadeiras camisas-de-força.
O principal desafio das lan houses é deixarem de ser equiparadas a casas de diversão ou de jogos. Esse entendimento limita severamente a entrada e a permanência de crianças e adolescentes, levando, também, à proibição da abertura delas a uma distância inferior a mil metros das unidades de ensino. Mas vejam o inusitado da situação: considerando que escolas e cursos de qualquer natureza são tidos como unidades de ensino, as lan houses só podem existir legalmente em lugares como o vão central da ponte Rio-Niterói ou algum ponto ermo da Floresta da Tijuca! E ainda há outras sanções questionáveis.
A legislação atual exige um gasto de R$ 21 por computador instalado, por equipará-lo à maquina de flipper; impede a concessão de alvarás a lan houses que possuam jogos eletrônicos; autua e cassa a licença das casas que adotam uma classificação diferente; e as exclui dos benefícios concedidos a microempresas. Uma lei do Rio, por exemplo, obriga os donos a trocar os sistemas eletrônicos de controle de acessos por anotação em livros.
A excessiva e paradoxal regulamentação, agravada pela falta de campanhas educativas — que hoje só a ABCID e o CDI fazem —, vem empurrando as lan houses cada vez mais para o amadorismo, impedindo que se transformem num negócio útil e produtivo, gerido com responsabilidade e legitimado pela sociedade. Deveriam e poderiam operar como “light houses”: empreendimentos saudáveis e sustentáveis, social e intelectualmente estimulantes para indivíduos e comunidades.
* fundador do Comitê para Democratização da Informática (CDI)
Artigo publicado em O Globo (19/9)
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