Precocidade mental

Cerca de 22 milhões de brasileiros têm algum tipo de transtorno mental
José Raimundo da Silva Lippi - Professor sênior do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da UFMG e titular da Academia Mineira de Medicina
Os transtornos mentais estão mais presentes na vida cotidiana e mais cedo do que se imagina. Eles são responsáveis por grande parte das perdas sociais, como separações, suicídios, homicídios e alcoolismo. Cerca de, 12% da população do Brasil precisa de algum atendimento em saúde mental, seja contínuo ou eventual, o que indica que mais de 22 milhões de brasileiros têm algum tipo de transtorno mental. Estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS) revelam que os problemas psiquiátricos estão entre as principais causas de perda de dias de trabalho no mundo: depressão, dependência química, esquizofrenia, transtorno afetivo bipolar e transtorno obsessivo-compulsivo. Muitos acreditam que eles se devem ao estresse no trabalho e às grandes exigências do mundo contemporâneo, o que nem sempre é verdade. Têm, sim, influência na vida das pessoas, mas geralmente não são determinantes exclusivos das patologias psíquicas. Na maioria das vezes, são diagnosticados apenas na maturidade, mas podem ter originado no início da vida, ainda na infância e adolescência.

Estudos constataram que crianças com transtornos ansiosos não-tratados correm risco de se tornar adolescentes e adultos tímidos e com grandes dificuldades de relacionamento. Assim, pessoas com timidez são 20% a 30% mais vulneráveis ao uso de álcool e de drogas e começam a utilizá-los para relaxar. São freqüentes, também, os problemas profissionais, como a recusa por cargos que exigem contatos sociais. Investir em prevenção é, portanto, mais humano, lógico e barato, começando pelo tratamento infantil, por meio de ludoterapia individual, terapia familiar e, dependendo de cada caso, com o uso de medicamentos. A depressão pode ser detectada precocemente no bebê. Abandonados na rua ou dentro da própria casa, eles sofrem e podem passar a não acreditar que são amados e se “apegar” a alguém: “perderam” seu cuidador principal, e aqueles que cuidam deles não podem ou, geralmente, não têm condições de se oferecer para apegar-se. Eles ficam deitados numa posição especial chamada de anáclise (grego) de barriga para baixo, a cabeça de lado, apoiada sobre os braços, olhando para o infinito. Seu olhar perpassa as pessoas – não chora, não incomoda, mas na verdade perdeu a razão de viver. Em 100% dos casos, é essencial a participação da família, oferecendo apoio e carinho para a recuperação do doente. Os indícios das principais doenças devem ser sempre avaliados dentro dos contextos biológico, psicológico, social e familiar. É essencial que exista o trabalho multi e transdisciplinar, com os serviços integrando os diversos profissionais presentes na vida desses indivíduos e que podem identificar fatores que indiquem algum problema mental: professores, pediatras, psiquiatras, psicólogos, fonoaudiólogos, pedagogos e agentes sociais. Urge deixar de lado a visão estreita baseada apenas na patologia e partir para uma mais abrangente, com foco na prevenção e que inclua a saúde positiva, no diagnóstico e na atenção clínica. É importante integrar os serviços no cotidiano dos pacientes e das pessoas que estão ao redor deles.

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