Aulas serão obrigatórias para policiais dos municípios que firmarem convênio com a União; verba prevista é de R$ 5 mi
Neste ano, programa será implementado em quatro Estados; para coordenador de movimento negro, medida é apenas paliativa
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Ao admitir que existe preconceito racial nas abordagens policiais, o governo federal lançará em março um polêmico plano que prevê o treinamento de policiais militares e agentes penitenciários para lidar com negros, tanto numa abordagem policial como numa conversa com um jovem infrator.
Um exemplo que motivou o plano, parceria do Ministério da Justiça com a Secretaria da Igualdade Racial da Presidência, foi o assassinato do dentista negro Flávio Ferreira Sant'Ana, em 2004, em São Paulo. Ele foi morto por policiais militares após ter sido supostamente confundido com um assaltante.
"O fato de ser negro já é motivo para que ele seja abordado hoje pelos policiais. A abordagem tem que ocorrer por conta de um flagrante ou de uma suspeita de fato, não com o critério do racismo, como tem ocorrido", diz Giovanni Harvey, subsecretário de Políticas de Ações Afirmativas da secretaria da Presidência.
A ideia do governo é que o curso seja obrigatório para os PMs nos locais que firmarem convênios com a União. A intenção é também estender o curso para promotores.
Nos cursos, serão abordados temas de sociologia, antropologia, história e direito, como introdução aos direitos humanos, diversidade étnica nacional, o que é racismo, preconceito e dados sobre o número de negros no país. Segundo o Ministério da Justiça, os negros (pretos e pardos) representam 57% das pessoas presas hoje no país.
Para Joselito Lago, secretário-geral da Associação de Cabos e Soldados da PM da Bahia, os cursos são necessários por conta do racismo real nas abordagens. "Ainda há muito preconceito. É preciso dar condições para evitar novos casos. Se o policial for informado do objetivo do programa, com certeza não haverá resistência."
Já para Marcus Alessandro Mawusí, coordenador nacional do MNU (Movimento Negro Unificado), ações como essa são "paliativas" e "não adiantam", diante da falta de mudanças estruturais no modelo nacional de segurança.
"É preciso, para começar, que as corregedorias de polícia sejam mais transparentes, com a participação da sociedade", afirma Mawusí. "Essa ação somente terá relevância caso tenha continuidade", completa o professor Nelson Inocêncio, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da UnB (Universidade de Brasília).
Em 2009, o programa será implementado em quatro Estados (SP, RJ, BA e RS), com R$ 5 milhões disponíveis para convênios. A ideia é estendê-lo aos demais Estados em 2010. Para Fermino Fecchio, ouvidor-geral da Cidadania da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência, os policiais não foram treinados para evitar certas abordagens. "Isso está documentado. A história mostra isso. Há problema na abordagem de negros, pessoas com deficiência, idosos."
Segundo ele, antes da aplicação desses cursos, é preciso apontar aos policiais que eles também possuem direitos. "Como ele vai respeitar o direito dos outros, se não se vê como um sujeito com direitos?"
O programa oferecerá ações de capacitação para jovens negros infratores de 15 a 29 anos.
Dentista negro foi morto em 2004 por PMs
DA REDAÇÃO
Em fevereiro de 2004, o dentista Flávio Ferreira Sant'Ana, 28, negro, foi morto, em São Paulo, por PMs após ser confundido com um ladrão. O equívoco começou com a declaração de um comerciante que, com seis PMs, apontou Sant'Ana como responsável pelo assalto.
Segundo os PMs, o dentista reagiu à abordagem a tiros e foi morto. Ao ver o corpo, porém, o comerciante percebeu o engano. O BO foi registrado como resistência seguida de morte. Dias depois, o comerciante voltou e contou a verdade. Três PMs foram condenados: dois deles a 17 anos e meio de prisão pela morte de Sant'Ana.
Neste ano, programa será implementado em quatro Estados; para coordenador de movimento negro, medida é apenas paliativa
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Ao admitir que existe preconceito racial nas abordagens policiais, o governo federal lançará em março um polêmico plano que prevê o treinamento de policiais militares e agentes penitenciários para lidar com negros, tanto numa abordagem policial como numa conversa com um jovem infrator.
Um exemplo que motivou o plano, parceria do Ministério da Justiça com a Secretaria da Igualdade Racial da Presidência, foi o assassinato do dentista negro Flávio Ferreira Sant'Ana, em 2004, em São Paulo. Ele foi morto por policiais militares após ter sido supostamente confundido com um assaltante.
"O fato de ser negro já é motivo para que ele seja abordado hoje pelos policiais. A abordagem tem que ocorrer por conta de um flagrante ou de uma suspeita de fato, não com o critério do racismo, como tem ocorrido", diz Giovanni Harvey, subsecretário de Políticas de Ações Afirmativas da secretaria da Presidência.
A ideia do governo é que o curso seja obrigatório para os PMs nos locais que firmarem convênios com a União. A intenção é também estender o curso para promotores.
Nos cursos, serão abordados temas de sociologia, antropologia, história e direito, como introdução aos direitos humanos, diversidade étnica nacional, o que é racismo, preconceito e dados sobre o número de negros no país. Segundo o Ministério da Justiça, os negros (pretos e pardos) representam 57% das pessoas presas hoje no país.
Para Joselito Lago, secretário-geral da Associação de Cabos e Soldados da PM da Bahia, os cursos são necessários por conta do racismo real nas abordagens. "Ainda há muito preconceito. É preciso dar condições para evitar novos casos. Se o policial for informado do objetivo do programa, com certeza não haverá resistência."
Já para Marcus Alessandro Mawusí, coordenador nacional do MNU (Movimento Negro Unificado), ações como essa são "paliativas" e "não adiantam", diante da falta de mudanças estruturais no modelo nacional de segurança.
"É preciso, para começar, que as corregedorias de polícia sejam mais transparentes, com a participação da sociedade", afirma Mawusí. "Essa ação somente terá relevância caso tenha continuidade", completa o professor Nelson Inocêncio, coordenador do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da UnB (Universidade de Brasília).
Em 2009, o programa será implementado em quatro Estados (SP, RJ, BA e RS), com R$ 5 milhões disponíveis para convênios. A ideia é estendê-lo aos demais Estados em 2010. Para Fermino Fecchio, ouvidor-geral da Cidadania da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência, os policiais não foram treinados para evitar certas abordagens. "Isso está documentado. A história mostra isso. Há problema na abordagem de negros, pessoas com deficiência, idosos."
Segundo ele, antes da aplicação desses cursos, é preciso apontar aos policiais que eles também possuem direitos. "Como ele vai respeitar o direito dos outros, se não se vê como um sujeito com direitos?"
O programa oferecerá ações de capacitação para jovens negros infratores de 15 a 29 anos.
Dentista negro foi morto em 2004 por PMs
DA REDAÇÃO
Em fevereiro de 2004, o dentista Flávio Ferreira Sant'Ana, 28, negro, foi morto, em São Paulo, por PMs após ser confundido com um ladrão. O equívoco começou com a declaração de um comerciante que, com seis PMs, apontou Sant'Ana como responsável pelo assalto.
Segundo os PMs, o dentista reagiu à abordagem a tiros e foi morto. Ao ver o corpo, porém, o comerciante percebeu o engano. O BO foi registrado como resistência seguida de morte. Dias depois, o comerciante voltou e contou a verdade. Três PMs foram condenados: dois deles a 17 anos e meio de prisão pela morte de Sant'Ana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário