A juventude negra quer viver!


Fórum Nacional de Juventude Negra lança, durante o Fórum Social Mundial 2009, a Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude Negra.

Por Thais Zimbwe*

Sob os princípios de promoção de um espaço aberto ao pluralismo e à diversidade de engajamentos e atuações das entidades e movimentos que dele decidam participar, para o aprofundamento da reflexão, o debate democrático de idéias, a formulação de propostas, a troca livre de experiências e a articulação para ações eficazes, o Fórum Nacional de Juventude Negra, lançou no dia 28 de janeiro durante a edição 2009 do Fórum Social Mundial, realizada na cidade de Belém no Pará, a Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude Negra.

A Campanha é fruto de um processo de articulação nacional da juventude negra brasileira reunida durante o I Encontro Nacional de Juventude Negra, em 2007 na Bahia. A Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude Negra, sob coordenação do Fórum Nacional de Juventude Negra com dinamização dos Fóruns Estaduais de Juventude Negra, surge como um instrumento de luta e discussão com a sociedade brasileira sobre um modelo de segurança pública que respeite os direitos humanos e seja compatível com um Estado democrático e de direito, reduzindo assim o alto índice de violência contra a população negra, especialmente jovens negros e negras.

A atividade foi realizada durante o Dia da Pan-Amazônia, dedicado a levar ao mundo as vozes da Amazônia, evidenciando 500 anos de resistência, conquistas e perspectivas africanas, indígenas e populares. Os dados para a violência na região amazônica do país são alarmantes, dos 100 municípios com maiores índices de desmatamento, 61 estão entre os que apresentam as maiores taxas de assassinatos no país, de acordo com o Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros. Entre os municípios que figuram nas duas listas, 28 estão no Mato Grosso, 21 no Pará, oito em Rondônia e dois no Maranhão.

Thais ZimbweA violência é um dos maiores problemas enfrentados pela sociedade brasileira, fruto de condições sócio-econômicas profundamente desiguais, de corrupção e de uma tradição de impunidade. “O racismo não vai deixar de existir, precisamos criar políticas de enfrentamento a ele. Apoiamos a luta da juventude negra, precisamos salvar os nossos jovens”, enfatizou o Babalorixá Edson de Oxossi, integrante da organização paraense CEDENPA, durante a atividade.

O lançamento reuniu lideranças das religiões de matriz africana, do movimento negro paraense, integrantes dos Fóruns Estaduais de Juventude Negra e dezenas de participantes do Fórum Social Mundial. Em um universo de cerca de 200 pessoas que assistiam à atividade, foi consenso durante as intervenções que é urgente a incorporação de uma cultura de paz e garantia de vida saudável para a juventude negra.

“O racismo presente na sociedade impede a população negra, principalmente sua juventude, de acessar uma educação de qualidade, acesso ao serviço público de saúde, e principalmente se materializa na violência diária sofrida pelos jovens negros. O Fórum, através dessa Campanha, abre um espaço de diálogo com a sociedade para evidenciar essas práticas e dar um grito de alerta: precisamos viver! ”, enfatizou Gleidson Alves, coordenador do Fórum de Juventude Negra do Pará.

Apesar dos avanços na legislação de proteção aos direitos humanos, os índices de homicídios contra a juventude permanecem elevados e alguns deles cresceram ainda mais nos últimos anos. Pesquisas recentes têm demonstrado que é o homem, jovem e negro a vítima preferencial da violência. No início de 2006, a Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou dados sobre o genocídio praticado pelo Estado brasileiro contra sua juventude. O Brasil ficou conhecido como o país que mais mata jovens no mundo, sendo que a imensa maioria destes(as) jovens são negros(as).

Reforçando o ambiente do Fórum Social Mundial como espaço convergente das várias lutas sociais, sob um contexto de dimensão internacional, durante a atividade de lançamento da Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude Negra, contou-se com a participação do jovem colombiano Hugo Mondragon, que apresentou o cenário de violência contra a população afro-colombiana, “No meu país, sofremos perseguições e todos os dias são cometidas violências e chacinas contra os negros. Nossos líderes são mortos, desaparecidos ou impossibilitados de seguir na sua luta social, visando assim deixar a população negra colombiana sem lideranças e, em conseqüência, menos forte”, explicou Mondragon.

De acordo com o “Mapa da Violência: Os jovens da América Latina”, as taxas de violência da América Latina para o conjunto da população são dezesseis vezes maiores que as taxas européias; quando se trata de vítimas jovens, são 31 vezes maiores. Historicamente, os pólos dinâmicos da violência encontravam-se localizados na América do Sul, principalmente na Colômbia e no Brasil. Apesar de não ser totalmente correto, nas últimas décadas, a violência na América Latina virou sinônimo de tráfico de drogas, com seu aparelho criminal infiltrado nas diversas instâncias da sociedade civil e política e seus assentamentos territoriais.

As alternativas a esse cenário são a promoção de políticas e estratégias que estimulem a plena inserção e um papel protagônico para os(as) jovens, em que sejam articulados esforços e iniciativas do setor público em suas diversas instâncias, da esfera privada, das organizações não-governamentais e dos(as) próprios(as) jovens. Estratégias que promovam o conhecimento, a revalorização e o fortalecimento da identidade juvenil e sua participação, como setor ativo e consciente da construção da cidadania e do desenvolvimento dos países.

A Campanha Nacional contra o Extermínio da Juventude Negra visa despertar uma reflexão sobre o valor da vida humana e das práticas discriminatórias predominantes na sociedade, fortalecer, impulsionar e disseminar as discussões sobre violência e segurança pública através do olhar da juventude negra. Serão desenvolvidas ações nacionais baseadas na formulação de estratégias de prevenção à violência contra a juventude negra de forma que os índices de violência contra este grupo da população seja reduzido. A avaliação do sucesso desta iniciativa se dará a partir de cada vida poupada e da elevação da consciência coletiva sobre os fatores que norteiam a permanência de uma conjuntura exterminadora e violenta para a juventude negra brasileira.

*Thais Zimbwe é jornalista, integrante da Coordenação
do Fórum Nacional de Juventude Negra e colaboradora do Ìrohìn.

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