24% das jovens têm lesão por HPV no 1º ano de vida sexual

Segundo pesquisa da Fiocruz, 36,5% delas apresentam o problema após 5 anos

Câncer de colo de útero, decorrente de lesão de HPV, é o terceiro mais comum em mulheres, depois do câncer de pele e do de mama

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

Um estudo realizado no Instituto Fernandes Figueira, da Fiocruz, com 403 garotas mostrou que, um ano após o início da vida sexual, quase uma em cada quatro delas já apresenta lesões causadas por HPV. Em cinco anos de vida sexual, 36,5% apresentam o problema. O câncer de colo de útero, decorrente das lesões, é o terceiro mais comum em mulheres, depois do de pele e do de mama.
A pesquisa foi feita pela ginecologista Denise Monteiro, com jovens de 11 a 19 anos atendidas entre 1993 e 2006 pelo Ambulatório de Ginecologia para Adolescentes do Hospital de Jacarepaguá (RJ). As pacientes não tinham lesões cervicais no início do estudo e haviam tido a primeira relação sexual havia menos de um ano.
Os dados mostraram que, no primeiro ano de atividade sexual, 97 delas (24,1%) apresentaram lesões no colo do útero. Ao longo do estudo, 147 desenvolveram o problema.
A primeira alteração geralmente era de baixa gravidade. Em 113 pacientes, foram encontradas lesões intraepiteliais de baixo grau. Em 12 jovens, foram detectadas lesões de alto grau. Ambas lesões são precursoras de câncer cervical, mas as de alto grau têm um maior potencial oncogênico.
Nas outras 22 jovens, o exame mostrou "alteração escamosa de significado não identificado". "O exame detectou alguma anormalidade, mas não pôde definir se era lesão de baixa gravidade ou outra coisa, como inflamação", diz Monteiro.
Um dado, porém, inquietou a pesquisadora. Mesmo com exames periódicos, parte das lesões já eram de alto grau na primeira vez em que foram detectadas. "Na história natural da lesão, ela começa como de baixo grau e, com os anos, evolui. Mas não é isso que temos observado. Em muitos casos, o vírus é tão oncogênico que a lesão já surge como de alto grau. Encontramos meninas com três meses de atividade sexual que já tinham lesão de alto grau", afirma Monteiro.

Vulnerabilidade
De acordo com Ismael Guerreiro da Silva, professor de ginecologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), as mulheres mais jovens são realmente mais vulneráveis ao HPV. Um dos motivos é que o sistema imunológico ainda não conhece o vírus e, portanto, não tem imunidade contra ele.
Além disso, há um fator fisiológico. Segundo Silva, entre as mulheres que têm de 12 a 20 anos, é muito comum encontrar uma ferida ao redor do orifício externo do colo do útero chamada ectopia. Essa lesão é normal, não corresponde a nenhuma doença, mas é uma área muito sensível ao HPV.
O lado bom, afirma o ginecologista, é que, na maior parte dos casos, há uma regressão completa da lesão. Nas de alto risco, a remissão costuma ocorrer em 14 meses e, nas de baixo risco, em oito. O aparecimento de lesões é mais preocupante quando ocorre em mulheres com mais de 30 anos.

Evolução da lesão
Na pesquisa de Monteiro, em dois anos, a maioria dos casos de "alteração escamosa de significado não identificado" (91%) e das lesões de baixo grau (63,3%) e a metade das lesões de alto grau regrediram. Mas houve também casos em que a lesão progrediu: 6,1% das lesões de baixo grau, por exemplo, passaram a ser de alto grau no período de dois anos.
De modo geral, as lesões de baixo grau são apenas acompanhadas pelos médicos, que buscam controlar com antibióticos infecções concomitantes, como candidíase. Quando a lesão é de alto grau, a recomendação é a retirada do colo do útero.
Essa medida, porém, também traz outras conseqüências. Segundo Monteiro, já foi constatado que mulheres que se submeteram a esse procedimento são mais sujeitas a ter partos prematuros.
Como o estudo mostrou que parte das lesões de alto grau regride, Monteiro defende que, dependendo do caso, o ginecologista busque acompanhar como o quadro da paciente evolui, antes de retirar o colo do útero. "Mas a escolha por só acompanhar é arriscada e deve ser feita com jovens esclarecidas e sobre as quais se tenha controle."

Fatores de risco
Em uma pesquisa anterior, também com pacientes do Hospital de Jacarepaguá, Monteiro avaliou por que algumas pacientes estavam mais vulneráveis ao aparecimento de lesões causadas por HPV. Ela mensurou a presença de cada fator de risco nas jovens e constatou que, a cada ano de atividade sexual, o risco de a paciente ter a lesão praticamente dobra. A gravidez na adolescência também dobra o risco.
O cigarro e o uso da pílula anticoncepcional são também considerados fatores de risco, segundo a literatura científica. No estudo, Monteiro não encontrou essa associação. "Pode ser que o cigarro não tenha aparecido devido ao baixo tempo de exposição. Como são muito novas, elas não fumavam há muito tempo ainda", disse.
Monteiro questiona ainda a idéia de que a infecção esteja ligada à promiscuidade. "Não encontrei nenhuma associação entre as lesões e o número de parceiros sexuais. Teoricamente, quanto maior o número de parceiros, maior a chance de um deles estar infectado com o vírus, mas tudo depende de quem é o parceiro", diz ela.

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