Diagnóstico de Anemia Falciforme em Minas

Diagnóstico de Anemia Falciforme em Minas - ainda um longo
caminho a ser percorrido
Foto: Daniel Cardoso

Daniela Giovana, Jornalista e
mestranda em História pela UFMG


“Você sabe o que é Anemia Falciforme?”. É assim que a cabeleireira Dora Alves, 50, costuma abordar pessoas nos ônibus e em seu salão de beleza, no trabalho de divulgadora que exerce voluntariamente em Belo Horizonte. “Muitos negros não sabem e muitos profissionais de saúde também não. Desconfio que meu pai, que morreu com 33 anos de AVC, possa ter sido um portador da doença e não sabia”, conta a cabeleireira.

A Anemia Falciforme é uma doença transmitida de pai para filho, em que os glóbulos vermelhos apresentam uma deformação em forma de foice, por isso o nome falciforme. Os glóbulos vermelhos são células do sangue que carregam um pigmento chamado hemoglobina. As pessoas portadoras da doença recebem de seus pais hemoglobina anormal que oferece dificuldade para a circulação do oxigênio no organismo. No Brasil esta anomalia está presente entre a população negra e afro-descendente. Assim, mesmo não tendo a pele negra, a pessoa pode ser portadora do traço ou até mesmo da doença falciforme.

A desinformação é um dos aspectos que mais chamam a atenção quando a questão é colocada. A incidência em Minas Gerais é de 3,2% da população, ou seja, a cada 30 recém-nascidos, um é portador do traço falciforme e cerca de 260 crianças nascem todos os anos com a anemia detectada.
Este dado estatístico revela uma proporção que leva a doença a ser enxergada enquanto um problema de saúde pública que deve ser identificado no nascimento, já que a transmissão é genética, garantindo assim uma vida com mais qualidade ao doente.

Diferentemente de outros estados, Minas Gerais tem desenvolvido um trabalho eficaz junto aos falcêmicos, mas isso não significa que a situação já tenha alcançado níveis ideais de atendimento. O caminho adotado parte do princípio da parceria entre a Secretaria Estadual de Saúde, Secretarias Municipais de Saúde de todo o estado, Universidade Federal de Minas Gerais, por meio do Núcleo de Pesquisa em Apoio Diagnóstico (NUPAD), Associação dos Drepanocíticos e Talacêmicos do Estado de Minas Gerais (Dreminas), Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia de Minas Gerais (Hemominas) e voluntários.

Foto: Pedro VilelaEsse esforço conjunto resultou na criação do Centro de Educação, Informação e Apoio ao Doente Falciforme (Ceiadof), com previsão de inauguração dentro de dois meses. O prédio fica na avenida Francisco Sales, 1715, região hospitalar de Belo Horizonte. O objetivo do Centro é otimizar os esforços para o atendimento aos doentes de todo o estado e se tornar um centro de excelência para a informação das famílias e da população em geral. “Com o Ceiadof vamos dar continuidade à questão da educação continuada, trabalhando em nível municipal e estadual as informações ligadas aos hemocentros e famílias em toda a Minas Gerais. Isso é muito importante. A família recebe um diagnóstico neonatal de Anemia Falciforme. O que fazer nesse momento? Há um desespero enorme dos pais. Por muitas vezes já tivemos com famílias que acharam que iam perder o filho da noite para o dia. A informação chega de uma maneira inadequada”, desabafa o presidente da Dreminas Cláudio Henrique Machado Santos.

Atendimento Ambulatorial
Por meio da Triagem Neonatal, mais conhecido como Teste do Pezinho, toda criança passa a ter direito ao acompanhamento ambulatorial gratuito feito pelo Hemominas. “A ação concreta mesmo foi a de Minas Gerais, em 1998. O Estado junto com a UFMG implementou a triagem para a Anemia Falciforme. Não tinha uma portaria, não tinha uma política nacional, nada. Em Minas aproveitamos a triagem neonatal que já era feita desde 1993 e o programa se alastrou. Em 2001, o Ministério da Saúde torna obrigatória a triagem neonatal para todo o país a partir da experiência mineira”, explica o professor de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG e diretor do NUPAD/UFMG José Nélio Januário.

O exame, que no Estado de Minas Gerais passou a investigar a Anemia Falciforme a partir de 1998 soma hoje 1 milhão 922.840 crianças triadas, dentre as quais 1.536 foram identificadas positivamente como portadoras da hemoglobina SS, o que configura o quadro de Anemia Falciforme. O modelo de triagem feito hoje em Minas é referência nacional.

A maior parte das crianças vão ao óbito nos primeiros 5 anos de vida, com um acometimento maior até os 2 anos de vida. A finalidade da triagem é instituir o tratamento nos primeiros cinco anos com penicilina, vacinação e acompanhamento rigoroso, aumentando a sobrevida. “Se você não fizer absolutamente nada, 50% morrem até chegar a adolescência, agora quando você institui um tratamento ambulatorial correto, de 45% a 50% vão atingir os 50 anos de idade. A diferença é brutal. Por isso o foco é a infância. Antes da triagem, as crianças estavam morrendo e a morte sendo atribuída a outras coisas, agora não tem jeito: a criança bate na porta da unidade de saúde dizendo que tem anemia falciforme e que quer tratamento”, explica o diretor do NUPAD.

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