Um tapinha dói e é crime. Defenda seus direitos e denuncie!!!




Vânia Dias, Estudante de jornalismo das
Faculdades Integradas da Bahia (FIB)


De acordo com dados do último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos 53 milhões de brasileiros pobres, 33,7 milhões são afro-descendentes. Eles representam hoje 70% dos 10% mais pobres do país. Estudos que denunciam agressões assinalam uma interseção entre raça, gênero e classes sociais, a fim de evidenciar os fortes contrastes entre brancos e negros, ricos e pobres na sociedade brasileira. De acordo com a pesquisa “A mulher brasileira nos espaços públicos e privados”, realizada pela Fundação Perseu Abramo, 6,8 milhões de mulheres no Brasil já foram espancadas ao menos uma vez. Destas mulheres, a maioria é negra. Na Bahia, o Coletivo de Mulheres do Calafate luta em defesa de mulheres negras e pobres que sofrem violência doméstica. O distrito composto por 12 bairros do subúrbio tem uma média de 244 mil 880 habitantes. No Calafate, um dos bairros deste distrito, a violência contra a mulher é uma característica bastante comum. A cada dia surge um novo caso de mulher vítima de violência, declara a coordenadora do Coletivo de Mulheres, Marta Leiro: “Não há uma pesquisa específica para definir o número exato de vítimas e nem quantas já foram atendidas, mas trabalhamos na tentativa de conscientizar e inibir novos casos semelhantes”.

O Coletivo, nos seus 13 anos de trabalho, sempre enfrentou preconceitos. De marido que tirou a mulher à força do grupo a milhares de casos de agressão. Com fama de separar muitos casais, Marta, mesmo em defesa da violência, também é uma vítima. Ela sofre atualmente ameaças de morte por coordenar esta atividade e luta para combater as tentativas de enfraquecimento do Coletivo. “Querem podar nosso trabalho, mas a luta continua. Não se pode intimidar com ameaças”, declara.

Motivada pelo medo de ser ainda mais violentada, ou mesmo, assassinada, Janete Brito dos Santos (38 anos), auxiliar de apoio em escola estadual, sofreu calada por 20 anos, as agressões praticadas pelo pai de seus três filhos e, na época, seu marido, Edmundo Moreira Ferreira. A última agressão praticada por Edmundo aconteceu em um domingo de maio, em um bar onde Janete tomava cerveja com os amigos. Sem nenhum motivo aparente, Edmundo, ao passar pelo bar e ver a sua ex-mulher, agrediu-a publicamente, com um tapa no rosto. “Eu nunca me senti tão humilhada”, declara Janete. Everaldino Sacramento (28 anos), um vizinho que presenciou a agressão, partiu em defesa de Janete e revidou a violência dando um murro em Edmundo. Jorge Cerqueira, atual marido de Janete, mesmo sabendo de todas as agressões, prefere não se envolver no assunto.

Orientada pelo Coletivo de Mulheres do Calafate, Janete pela primeira vez depois de 20 anos prestou queixa na Delegacia Especial da Mulher (Deam). “Se não fosse o Coletivo, eu não teria denunciado”, diz Janete, que recebeu todo apoio e acompanhamento. Aline de Jesus Sacramento (24 anos), mãe de dois filhos, foi agredida na cabeça pelo ex-marido, 25 dias após o parto. Na ocasião, integrante do Coletivo, ela prestou queixa na Deam, mas o caso não foi adiante, não havendo nenhuma punição para o agressor. Para Aline, os vizinhos, baseados no ditado de que em “briga de marido e mulher, ninguém mete a colher”,não se envolvem, apenas fazem fofocas e julgamentos.

Casos como os de Janete, Aline e de tantas outras mulheres contam agora com a nova legislação, que transforma agressões domésticas em crimes. A inserção dos parágrafos 9º e 10º do artigo 129 altera a detenção de três meses a um ano, para a inclusão da violência doméstica no código penal como crime específico e pena de seis a doze meses de detenção. Órgãos de defesa do direito da mulher, a exemplo da Deam, querem instituir além de multas e cestas básicas, punições consideradas inócuas para os agressores, penas educativas, como o serviço à comunidade e participação em grupos de reflexão. Mesmo com a nova lei, a prisão só é aplicada para casos extremos, como estupro, que é crime hediondo.

Antes de se aprofundar nas múltiplas formas de violência, Marta não tinha consciência de que quando era chamada de burra pelo ex-marido estava sofrendo um caso de agressão verbal e psicológica. “Eu achava que nunca tinha sido agredida, até ser apresentada à violência”, diz Marta. Nos primeiros momentos, o Coletivo de Mulheres fazia encaminhamento de intervenções, entrava na casa da pessoa agredida para garantir a defesa dela. Atualmente, espera-se que a vítima peça ajuda. O Coletivo oferece também palestras, aulas e oficinas que visam a uma maior conscientização e transformação dos problemas locais.

Veraldino Sacremento, conhecido como BS, é professor e presidente do Grupo de Capoeira Calafate. Alegando imaturidade e ciúmes, ele confessa já ter agredido uma ex-namorada e sua ex-mulher. Na ocasião, mesmo sabendo que podia ser punido pela justiça, BS não tinha medo da cadeia, mas da possibilidade de vingança de algum parente. “A justiça não nos protege, a lei da vida não tem sentença e nem regras, difícil é manter-se vivo”, desabafa. Depois de participar de palestras e oficinas oferecidas pelo Coletivo, diz-se consciente e arrependido das agressões. Hoje dá conselho a outros homens que praticam violência no bairro e é ameaçado de morte, por ter defendido Janete da agressão do seu ex-marido, Edmundo. Ficou por muito tempo sem poder andar pelo bairro, deslocando-se apenas de táxi. O caso está na 2º vara criminal e a primeira audiência está marcada para o dia 13 de julho.

Serviço
Para fazer denuncia ou procurar orientação em Salvador:
• Balcão de Justiça e Cidadania - das 9h as 12h – 71 3253-9904,
• Delegacia de Atendimento a Mulher – 71 3245-5481,
• Centro de Atendimento as Vítimas de Violência na Bahia – 71 3362-9090.

Como evitar ou reconhecer os sinais de possíveis agressões violentas:
- Ele olha para mulher ou age de um jeito que provoca medo;
- Deixa ela constrangida falando palavrões ou diminuindo a sua auto-estima;
- Controla o que ela faz, quem encontra, com quem fala e aonde vai;
- Impede a mulher de sair de casa., ver ou falar com os amigos ou parentes;
- Faz ela pedir dinheiro, Fica com o dinheiro dela e recusa a dar dinheiro;
- Diz que não é boa mãe, ameaça tirar as crianças ou machucá-las;
- Sacode, esbofeteia ou bate;
- Destrói as coisas, esconde os documentos ou ameaça matar animais;
- Intimida com armas de fogo ou armas brancas;
- Não se importa com as agressões, tenta culpá-la ou nega ter sido violento;
- Obriga você a retirar a queixa quando você vai a policia;
- Ameaça se suicidar;
- Ameaça matar.

Informações disponibilizadas na Delegacia Especial a Mulher, em Salvador.

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