Vocalista norte-americano do Sepultura fala sobre o racismo nos EUA e no Brasil
MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL
Muito alto, muito forte e dono de uma voz gutural, o norte-americano Derrick Leon Green, 37, vocalista do Sepultura, é daquelas figuras que, como se diz, "impõem respeito".
Acontece que temor não é respeito, como Derrick aprendeu desde a infância. Criado num subúrbio multirracial dos EUA, ele não demorou a perceber que, para os negros como ele, ser respeitado como pessoa é uma tarefa mais complexa.
Vivendo em São Paulo desde 2001 (depois de morar em Nova York e em Amsterdã), Derrick conta que encontrou no Brasil um cenário bem diferente do paraíso da mistura racial de que tinha ouvido falar.
FOLHA - Sua infância em Cleveland (EUA) teve episódios de racismo?
DERRICK GREEN - Minha primeira percepção sobre o racismo foi passada por meu pai, que nasceu na Georgia, no Sul dos EUA, na época em que ainda havia segregação oficial. Eu ficava chocado com o que ele contava porque cresci num bairro dentro de Cleveland, que é predominantemente negra, que misturava famílias de raças diferentes. Havia uma mistura de negros, asiáticos, judeus, cristãos. Era uma vizinhança muito boa, não se via preconceito.
FOLHA - Quando você sentiu-se vítima de racismo pela primeira vez?
GREEN - Quando comecei a trabalhar num clube no centro da cidade e algumas pessoas que eram barradas gritavam comentários racistas, com raiva.
FOLHA - E como foi a adolescência em Nova York?
GREEN - Sempre achei Nova York um lugar com muita gente diversificada, onde sua raça não importa. O racismo existe lá está alguns lugares específicos. O que acontecia, e ainda acontece, era ter dificuldade para pegar táxis, porque sou negro e alto. Muitos taxistas acham que vão ser roubados.
FOLHA - E o tempo na Europa?
GREEN - As pessoas não são tão explícitas lá. O que eu vi mais foi uma xenofobia, comentários preconceituosos contra estrangeiros, imigrantes.
FOLHA - E qual a sua impressão ao se mudar para o Brasil?
GREEN - Antes de vir para o Brasil, me diziam que o país era misturado racialmente, que não existia racismo como nos EUA. Mas, quando cheguei, vi que existe racismo aqui, só que as pessoas não admitem e, muitas vezes, nem se dão conta de que ele existe. Comecei a notar, cada vez que ia aos restaurantes, que nunca havia uma família negra comendo lá. A mesma coisa acontecia nas lojas de shoppings, não via muitos negros fazendo compras. Perguntava aos universitários quantos negros havia nas salas deles e me respondiam "um ou dois".
Fui percebendo que não havia muitos advogados ou médicos negros. Comecei a achar estranho estar em lugares onde sou o único negro. As pessoas ficam dizendo que [a discriminação] é econômica, mas há algo mais de muito errado.
GREEN - Eu diria que qualquer negro tem muito mais chance de fazer o que quer que seja e de crescer se viver fora do Brasil, na Europa e nos EUA.
Nenhum comentário:
Postar um comentário