Diagnóstico de Anemia Falciforme em Minas - ainda um longo
caminho a ser percorrido - continuação
caminho a ser percorrido - continuação
Daniela Giovana, Jornalista e
mestranda em História pela UFMG
Hoje existem duas formas de atendimento nos ambulatórios do Hemominas. O primeiro caso, e também o mais comum, é feito por crianças triadas para doença falciforme. “A partir do momento que o sangue é colhido, no quinto dia de vida pelo exame do pezinho, ele é levado para o NUPAD/UFMG, onde é feito o diagnóstico. Quando é identificado um caso positivo, a criança é encaminhada para um dos hemocentros mais próximos de sua casa para fazer a primeira consulta e os pais receberem as orientações necessárias”, explica Júnia Guimarães Mourão Cioffi, Diretora Técnico Científico da Fundação Hemominas. O segundo tipo de entrada fica por conta de pacientes em uma faixa etária maior, detectados por meio de estudo familiar ou atendimento de atenção básica. Atualmente 4.800 pacientes portadores de doença falciforme estão em tratamento na Fundação Hemominas em Belo Horizonte.
Neste acompanhamento, que é ambulatorial, uma vez que a Fundação Hemominas não possui uma estrutura hospitalar, o paciente recebe todas as vacinas básicas e especiais e é atendido por uma equipe multidisciplinar: hematologistas, pediatras, clínicos, infectologistas, assistentes sociais, psicólogos, dentistas, pedagogos, fisioterapeutas, fisiatras e ortopedistas. “Nas unidades que não possuem um desses profissionais, e o paciente precisa de atendimento, ele é referenciado para a capital, mas muitas vezes o atendimento é feito na própria rede. É um paciente diferenciado”, afirma a hematologista Mitiko Murao, da Fundação Hemominas e do Hospital das Clínicas.
Esta uniformização no atendimento pode ser atribuída as próprias características da Fundação Hemominas de funcionamento em rede, utilização de protocolos de atendimento padronizados discutidos periodicamente com as outras unidades do Estado e o próprio protagonismo no atendimento a pacientes falcêmicos. “O Hemominas, criado em 1985, tornou-se referência porque desde o início os paciente com doença falciforme e conglopatias hereditárias eram referenciados para ele. Em 1998 culminou com a triagem neonatal. O paciente quando detectado já era encaminhado para um local de referência e atendido desde o início. O programa de tiragem neonatal e a rede de hemocentros em Minas são bastante diferenciados”, explica a hematologista Mitiko Murao.
Muito se avançou em Minas para o diagnóstico precoce e acompanhamento ambulatorial, mas as etapas seguintes de tratamento continuam carecendo de mais atenção.
Desafios hospitalares
Movimento social, médicos e pacientes são unânimes em apontar as dificuldades de atendimento hoje encontradas nos setores de urgência e emergência da rede hospitalar no estado. Belo Horizonte é uma das cinco capitais de pior atendimento em urgência e emergência do país, segundo ranking levantado pelo Ministério da Saúde. Há um grande sucateamento na atenção a saúde, tanto na capital, quando no âmbito das responsabilidades do Estado.
“A urgência e emergência é um problema principalmente para os adultos”, afirma a médica Mitiko Murao. A mesma opinião é compartilhada pelo médico José Nélio Januário: “a grande dificuldade hoje no estado é com relação às urgências. As crises de dor são um dos principais motivos das intercorrências. Esses atendimentos são parcialmente resolvidos na região metropolitana, mas nós não temos ainda um plano para todo o Estado”.
No entanto, o que se percebe é que esse problema só será totalmente resolvido com uma ampla reforma no sistema de saúde nacional, em que deverão ser colocados em prática os princípios garantidos pela constituição que garante atendimento médico e educação de forma ampla e irrestrita a todos os cidadãos. Enquanto isso não acontecer será muito difícil que a população tenha uma atenção universal voltada para a igualdade no atendimento.
Nos hospitais a falta de informação por parte dos profissionais de saúde também compromete o atendimento. “Nós tivemos vários pacientes que chegaram ao médico com crise falando que tinham Anemia Falciforme e os médicos não sabiam como avaliar esse diagnóstico, como fazer esse tratamento a partir dessa crise. Um dos problemas que temos hoje de modo geral em Minas Gerais é a falta de informações tanto de gestores e de médicos, como também de toda a população. Muitas vezes a própria família não sabe como aplicar em casa os primeiros atendimentos ao doente”, afirma o presidente da Dreminas.
Com a experiência de quem vive há 47 anos com uma anemia talessêmica, dona Rose Marie Betran diz que muitas vezes, mesmo em crise, tem que ficar explicando para os médicos o que é a doença na hora de um atendimento de urgência. “A maioria dos médicos não sabem. Já fiquei 5 horas numa fila esperando, fui atendida por um clínico para só depois chegar a um especialista”, conta a artesã. “Há situações em que a família orienta o próprio médico e eles costumam ficar incomodados com isso”, atesta o professor José Nélio Januário. Um caso que chegou ao conhecimento da Dreminas foi o de uma mãe que após receber uma receita médica em que foi prescrita Ferratina informou ao médico que a filha não poderia tomar aquela medicação. O médico perguntou à mãe quem era o doutor, ela ou ele.
Para a médica Mitiko Murao a capacitação dos profissionais “tem que ser contínua, porque a gente sabe como os profissionais flutuam nas unidades de saúde. Esse processo não tem fim e tem que ser feito o tempo inteiro”, entende. Para José Nélio essa questão deve ser vista de uma forma mais ampla. “A rigor todo clínico médico tem condições de fazer um atendimento porque os problemas são clínicos. À medida que esse atendimento se transforme em um programa global de atenção à saúde o paciente poderá ser acompanhado por um pediatra comum. A universidade precisa fazer mais pesquisas em relação à Anemia Falciforme, principalmente pesquisas na área clínica. Novos fármacos, novas intervenções para aliviar o sofrimento das pessoas”, diz.
Em Belo Horizonte as maiores referências para o atendimento de urgência são o Hospital das Clínicas, ligado a UFMG, e o Centro Geral de Pediatria.
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