Qual a linha que separa o vandalismo da arte?

Em cima do muro: quando o assunto é intervenção urbana, as opiniões se dividem entre aqueles que a consideram arte e os que a consideram vandalismo Ivy Farias


O grafite e a pichação estão espalhados pelos muros das grandes cidades, mas somente um é visto como forma de arte contemporânea. No dicionário Houaiss, o termo pichar é descrito como o ato de "rabiscar em muros e paredes" ou como "sujar muros e fachadas”. Já a definição de grafite é como “escrito ou desenho artístico sobre rochas, paredes ou monumentos”.

Para o grafiteiro paulistano Gustavo Pandolfo, da dupla osgêmeos, não há diferença entre os estilos. “Tudo é arte, tudo é maneira de se expressar para o mundo”, diz. E há muita gente que concorda com Pandolfo: o grafiteiro gaúcho Alemão pensa que “ambos são meios de comunicação e intervenção urbana. Eles fazem parte do cenário da cidade assim como as propagandas, que somos obrigados a ver. Só que no grafite, aprecia quem quer, gosta quem quer”.

O grafiteiro Lee 27, de Salvador (BA), vê uma diferença apenas no tempo que se leva para deixar um registro na parede e a ideologia de cada um. “Antigamente a pichação era movida por ideais políticos, hoje a situação está bem diferente, as pessoas fazem por curtição”, afirma. O próprio Lee explica que conheceu o grafite depois de se envolver com pichação em 1993. “Já pichei muito aqui na Bahia, mas nunca tive uma resposta tão boa quanto a que tenho agora com o grafite. Antes eu andava com medo, hoje ando de cabeça erguida e as pessoas me respeitam”, continua. Porém, ao contrário do que muita gente imagina, a pichação não é a porta de entrada para o mundo do grafite. Alemão conta que nunca passou por esta porta porque ela simplesmente não existe. “Fiz a fachada de uma loja de bicicleta de um amigo e a partir daí surgiram novos trabalhos. Hoje já fiz mais de mil desenhos em Porto Alegre”, explica.

“Na lei, é tudo vandalismo”, acredita Francisco Silva, o Nunca. Grafiteiro de São Paulo, Nunca também começou sua carreira como pichador. “Foi importante para que eu entendesse e criasse respeito pelos grafiteiros e aprender a usar o spray”, comenta.

Loro Verz, ilustrador, cartunista e grafiteiro, também acha que pichação e grafite são sinônimos. “Pichação no Brasil é o que chamamos de tagging (mirar). Quanto mais alto o prédio, mais difícil o acesso. Se o cara picha ali, tem mais respeito”, explica. De acordo com Loro, a pichação é mais ligada a questões como marcar território para as gangues, enquanto o grafite possui “mais apelo sentimental e estético”.

Vejo cores em você

A grafiteira e artista plástica paulistana Nina não tem uma opinião formada quando o assunto é a diferença entre um e outro. “Tem gente que diz que a pichação é ilegal, mas se a pessoa não autorizar, o grafite também é. Talvez um critério de diferenciação seria a cor: noto que a pichação usa somente uma cor, enquanto no grafite é tudo muito colorido”, argumenta.

O baiano Bigode acha que há apenas uma diferença técnica: “O grafite tende a ser mais perfeccionista e trabalhado, já a pichação é feita correndo, uma forma de protesto mesmo”.

Arte Espontânea

O grafiteiro gaúcho Trampo fala que ambos são arte porque “nascem de forma espontânea”. O artista entende que da mesma maneira que o grafite não era apreciado como arte há cerca de 10, 20 anos, talvez as pessoas possam estar olhando a pichação hoje com o mesmo olhar que viram o grafite no passado. “Não tem como classificar um e outro”, diz.

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