ÚLTIMA PARADA 174


Além da violência
Última parada 174, filme de Bruno Barreto candidato brasileiro a uma vaga no Oscar, é exibido no Festival do Rio. Diretor defende o lado humano da história
Mariana Peixoto - Do Rio de Janeiro
Hipólito Pereira/Agência O Globo
O diretor Bruno Barreto reconta a vida de Sandro Nascimento, interpretado por Michel Gomes
A identificação é imediata. Nascido a partir do documentário Ônibus 174 (2002), a ficção Última parada 174 trata da vida de dois jovens nascidos nos morros cariocas, de famílias desestruturadas, que erram continuamente (drogas, roubos, mortes, prisões). Até que um deles, depois de nova sucessão de erros, toma de assalto um ônibus e inicia uma descida ao inferno com o assassinato de uma passageira, fato que se tornou emblemático da violência no Rio de Janeiro ao ser televisionado e transmitido ao vivo. No cinema brasileiro pós-Cidade de Deus (2002) e Tropa de elite (2007), é difícil assistir a uma produção relacionada com favela-violência sem pensar nestes filmes como referência. Tanto por isto, o maior desafio do cineasta Bruno Barreto com seu 18º longa-metragem é chamar a atenção para uma história que pretende ir além.

Candidato brasileiro a uma vaga ao Oscar, Última parada 174, que tem estréia nacional dia 24, não é, na opinião do diretor, um filme sobre a violência, mas sim sobre as conseqüências dela. “A razão de ser do filme são as relações humanas. O ônibus não é o ponto de chegada, mas o de partida”, afirmou Barreto em entrevista durante o Festival do Rio. A história, narrada de forma cronológica, conta a trajetória de Sandro do Nascimento desde a infância até a morte. O rapaz de 22 anos morreu asfixiado no carro da polícia depois de ser preso pelo Bope em junho de 2000, logo depois de ter assassinado a professora Geísa Firmo Gonçalves, uma das ocupantes do 174.

Barreto comentou que logo depois de assistir ao documentário de José Padilha e Felipe Lacerda foi tomado por uma série de perguntas. A maior delas: Quem era aquela mulher, a mãe adotiva de Sandro, a única pessoa que foi ao seu enterro? “Ao ver a expressão dela no Jornal nacional, segurando uma rosa vermelha, olhando o caixão, vi que ela estava convencida de que não estava enterrando o filho adotivo, mas o verdadeiro.” A partir desta imagem que está em Ônibus 174, Barreto chegou à conclusão de que uma versão ficcional da história começaria a responder várias das perguntas que ele se fazia. “A realidade hoje está tão inverossímil que é a ficção que te dá o caminho.”

Convidou Bráulio Mantovani para assinar o roteiro. Até aquele momento, 2003, o roteirista era conhecido por Cidade de Deus. Tropa de elite, com roteiro também assinado por ele, não existia sequer no papel. Barreto chamou também José Padilha para co-produzir, parceria que acabou não se concretizando, já que pouco depois o cineasta começou a se envolver com o longa sobre o Bope. Mesmo tendo sido concebido em primeiro lugar, Última parada ficou pronto muito depois de Tropa por causa de dificuldades de financiamento (o filme custou R$ 8 milhões, 50% deles de recursos incentivados). Não deixa de ser curioso, no entanto, ver algumas coincidências na tela. Por exemplo: André Batista, o policial do Bope que comanda a operação do ônibus 174, é interpretado por André Ramiro, o aspirante Matias de Tropa (personagem que, por seu lado, foi inspirado em alguns policiais, entre eles o próprio Batista).

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