Agressão à cidade

Autoridades constatam que pais não reprimem os filhos pichadores
Desrespeitada, afrontada, ofendida e emporcalhada pela ação delinqüente de gangues de pichadores, a população de Belo Horizonte parece inteiramente entregue, acomodada, inerte. Já passa da hora de todos que amam esta cidade ou que, pelo menos, não acham normal, nem confortável, conviver com a sujeira, se conscientizarem de que é preciso mudar de atitude em relação ao vandalismo. Ainda que este comportamento destrutivo fosse apenas manifestação de jovens inconformados com a pobreza e com a exclusão social, a complacência não seria o melhor remédio. Mas nem isso pode servir de desculpa para que a maioria continue fazendo de conta que o problema não é de todos e que boa parte da culpa é dos pais, que preferem não ver seus filhos, inclusive os menores, depois de vagar pelas ruas de madrugada, em péssimas companhias, chegarem em casa com as roupas e as mãos sujas de tinta.

Ninguém precisa ir longe para se envergonhar com o aspecto decadente que velhas e novas pichações impõem às fachadas, portões. muros e placas em praticamente todos os pontos da cidade. É visível a alegre e despreocupada disputa entre gangues pela ocupação de espaços ou de alturas mais difíceis, de aventuras mais perigosas. Deixam lá as marcas de seu mau gosto como se fossem troféus. São provocações gratuitas, acintes com que demonstram ter ultrapassado com facilidade as regras mínimas da vida em sociedade e de respeito pela vizinhança. É isso mesmo que pretendem: agredir e causar asco. Geralmente, conseguem. Mas é preciso ocorrer mais do que isso. É preciso reagir. Como mostra a reportagem do Estado de Minas, autoridades policiais, judiciárias e do Ministério Público estão convencidas de que tudo começa e termina na indiferença ou na omissão dos pais, especialmente os de classe média. Já foram identificadas gangues organizadas por filhos de famílias às quais a cidade quase nada negou. Eles recrutam reforços entre jovens frustrados da periferia, mas a iniciativa e a liderança do crime da tinta vem, na maioria dos casos, da parte dos mais abastados.

Outra forma de contribuir com a pichação é a incapacidade das pessoas de denunciarem o que viram ocorrer a poucos metros de sua própria casa. É uma espécie de capitulação que dificulta a ação policial e torna inócua e sem conseqüência a lei e o aparato judicial montado para cumpri-la. É esclarecedor o depoimento da juíza Flávia Birchal, do Juizado Especial Criminal de Belo Horizonte, que informa ser mínimo o número de casos que chegam à sua mesa. Segundo ela, praticamente não há empenho da sociedade em denunciar os pichadores, e seus crimes não estão entre as prioridades da polícia. Como se trata de problema não localizado geograficamente, o desacato da pichação não tem como ser enfrentado sem o envolvimento da maioria da população adulta e responsável. A esperança é que as autoridades, professores e toda a sorte de lideranças civis despertem da letargia e do conformismo em que se encontram e passem a propagar uma reação coletiva mais enérgica. A menos que concordem em se ver retratados na sujeira das pichações.

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