Para maioria, negro sofre mais preconceito que pobre

Segundo estudo, brasileiro prefere mecânico branco a professor preto como genro


DA SUCURSAL DO RIO

Questionados sobre quem sofre mais com o preconceito no Brasil, a maioria dos entrevistados pelo Datafolha (56%) afirmou espontaneamente que eram os "pretos" ou os "negros". Em segundo lugar, aparecem os "pobres" (21%). A questão sobre a natureza das desigualdades no Brasil, se exclusivamente social ou se amparada também em critério de cor divide os especialistas.
Isso porque detectar o preconceito específico de cor e seus efeitos não é tarefa fácil nem consensual. Uma tentativa foi feita pelo cientista político Alberto Almeida em "A Cabeça do Brasileiro" (Record).
Em vez de perguntar diretamente para os entrevistados se eles tinham preconceito, a pesquisa de Almeida apresentou fotos de pessoas identificadas como pretas, pardas ou brancas e, a partir daí, fez várias perguntas a respeito da imagem que se faz de cada uma delas.
Em alguns casos, a foto era associada a uma profissão. Quase metade (43%) dos brasileiros disseram preferir que sua filha se casasse com um mecânico de carros branco do que com um professor do ensino médio preto, opção de 27%.
A pesquisa detectou também mais preconceito em relação a pardos do que a pretos. Isso foi constatado a partir da identificação das fotos com atributos positivos ou negativos, como ser mais honesto ou malandro.
Os atributos positivos foram mais associados aos brancos, menos aos pretos e, em escala ainda menor, aos pardos.
Em alguns casos, diz Almeida, trata-se de discriminação estatística, ou seja, o entrevistado deduz que o branco tem mais estudo, por exemplo, por saber que, em média, brancos são mais escolarizados no país.
No entanto, quando se trata de questões como ser mais honesto, preguiçoso ou malandro, esse conceito não se aplica. Para o autor, é aí que fica claro o preconceito. "O preto é visto muitas vezes como alguém que não teve chance na vida, mas que conhece seu lugar. Já o pardo pode ser visto como alguém que teima em disputar posições com os brancos", diz Almeida. É por essa razão que, para o autor, qualquer política de ação afirmativa no Brasil não deve excluir os pardos.
Outra conclusão da pesquisa foi que a ascensão social não muda a percepção das outras pessoas com relação à cor. Foram mostradas fotos de uma mesma pessoa de cor parda, mas em trajes diferentes e associados a profissões de mecânico, professor e advogado. Não houve diferença significativa nas respostas.

Efeito no salário
Mesmo considerando que existe forte preconceito de cor no Brasil -questão não consensual entre especialistas-, resta ainda uma pergunta difícil de responder: em que medida ele explica os diferenciais de renda no mercado de trabalho?
Em 2007, segundo o IBGE, a renda média dos trabalhadores brancos, de R$ 977, era quase o dobro da verificada entre pretos e pardos (R$ 506). A simples constatação de que essa diferença existe não permite concluir, entretanto, que isso ocorra por discriminação racial no mercado de trabalho.
Como pretos e pardos têm, em média, acesso pior ao sistema educacional, a diferença nos rendimentos pode acontecer principalmente por essa razão, e não por preconceito do empregador. Para se aproximar do que seria o efeito discriminação, é preciso comparar pessoas com as mesmas características e na mesma ocupação.
Ricardo Paes de Barros, Samuel Franco e Rosane Mendonça, ao fazerem isso num trabalho divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada em 2007, mostram que, em 2005, brancos com as mesmas características observáveis e inseridos no mesmo segmento do mercado de trabalho que os negros recebiam remuneração 11% maior.
Isso, no entanto, não esgota a questão, já que as pesquisas do IBGE não identificam aspectos culturais ou relacionados à qualidade do ensino.
Simon Schwartzman, sociólogo e ex-presidente do IBGE, diz que é a escolaridade o principal fator a determinar as desigualdades, ainda que a discriminação por cor tenha, em sua opinião, algum peso.
Para Schwartzman, no entanto, não é possível determinar com precisão pelas pesquisas o quanto o preconceito explica essa diferença.
"As pessoas podem estar na mesma ocupação, mas um pode ter se formado numa faculdade pior e virado advogado de porta de cadeia, enquanto outro estudou numa universidade prestigiosa e hoje trabalha numa multinacional", diz. (AG)

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