Acesso a educação é o melhor caminho para combater o racismo e a discriminação. Esta foi a principal conclusão da conferência “A inserção da mulher negra na produção científica e tecnológica e na agenda do trabalho decente”, que fechou esta sexta-feira (7/11), o primeiro dia de debates do Colóquio África e Diáspora. O evento que acontece até domingo na Reitoria da Universidade Federal da Bahia, em Salvador, reúne mulheres de diversos países para debater o lugar da mulher negra na geopolítica. As conferencistas foram Sylviane Anna Diouf – Senegal/EUA, Dolores Mohammed – Nigéria-EUA e as brasileiras Maria Inês Barbosa e Mônica Custódio.
Pautada pela troca de informações, a conferência foi iniciada por Sylviane Diouf, que falou da falta de acesso das negras africanas ao ensino superior. “Por um fator cultural, em muitos países da África as meninas casam-se logo após a conclusão do ensino secundário, o que impossibilita a continuação dos estudos”. Ela credita parte deste desinteresse pela universidade à falta de estímulo da sociedade, que não oferece oportunidades de estágios, trabalho ou outras perspectivas de futura para estas mulheres. “Elas não têm modelos a seguir e acabam acreditando que não há necessidade de buscar mais conhecimentos científicos e tecnológicos, uma vez que não têm onde aplica-los”, afirmou Sylviane. Para a historiadora, escritora e diretora do Instituto Schomburg-Mellon do Schomburg Center for Research in Black Culture em Nova Iorque, esta realidade só mudará quando as sociedades africanas perceberem que o acesso das mulheres a educação científica e tecnológica é o caminho mais curto para o desenvolvimento.
Dolores Muhammed, da Nigéria, criticou a falta de acesso a condições mínimas de educação e saúde da mulher de origem africana. Em uma fala cheia de simbolismo, Dolores contou em poucas palavras a vida sofrida das africanas. “A vida não é nada fácil para as nossas irmãs da África. São elas as grandes responsáveis pela geração e criação dos filhos e pela absorção de toda violência dentro dos seus lares. Em muitas comunidades, as mulheres negras são as maiores vítimas de abusos e atrocidades dos conflitos civis e militares. São elas que mais sofrem com as guerras, que resultam em seqüestros, mortes e até em escravidão sexual. Devemos usar este fórum como voz destas mulheres, antes que elas se tornem apenas um número nas estatísticas da fome e da miséria”, ressaltou Dolores, que é diretora da Essence International School e fundadora da The African Heritage Village em Kaduna –Nigéria, além de vice-presidente da Comissão de Imigrantes Africanos e Caribenhos da Municipalidade de Philadelphia, EUA.
Mulher brasileira
Depois das explanações sobre a situação das mulheres em outros países, a coordenadora de trabalho e renda da Unegro, Mônica Custódio, fez um breve relato a participação feminina no mercado de trabalho no Brasil. “É preciso refletir sobre o papel da mulher negra na cadeia produtiva e na sociedade brasileira. Hoje, 120 anos após à abolição legal da escravatura, ainda somos vítimas de muitas concepções talhadas naquela época, como o fato de que as mulheres negras devem fazer os serviços que as brancas não querem. Vemos muito isso no serviço doméstico. Não podemos mais aceitar este tipo de diferenciação. E a única forma de acabar com isso é através da educação. A capacitação profissional é essencial para mudar esta situação”, afirmou Mônica.
A coordenadora executiva do Programa Regional Gênero, Raça, Etnia e Pobreza da UNIFEM – Cone Sul, Maria Inês Barbosa, concordou com as afirmações de Mônica. Ela reafirmou a importância da universalização do acesso aos serviços para melhorar as condições de vida da população, citando o caso do Sistema Único de Saúde no Brasil. “O SUS tem suas falhas, mas garante que todos tenham o direito de receber tratamento médico, independentemente do custo que este tratamento tenha. Infelizmente as coisas não acontecem como deveriam e muitas vezes é preciso recorrer á Justiça para que este acesso seja assegurado. Não estamos satisfeito com que esta aí, mas a situação já foi pior. Este sistema, mesmo precário, que temos já melhorou a qualidade de vida de muitos brasileiros.” Maria Inês falou ainda da necessidade de conscientização da população sobre os direitos de acesso á educação, saúde e moradia digna assegurados pela Constituição.
O colóquio prossegue neste sábado com debates sobre direitos sexuais e reprodutivos, o tráfico internacional de mulheres e os desafios da luta contra a pobreza e a descriminação. O ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, também deve participar do evento e falar das ações do governo federal para as mulheres e os negros. O colóquio será encerrado no domingo com uma caminhada até o Campo Grande, onde está acontecendo uma feira de artesanato feito por mulheres de Salvador.
De Salvador,
Eliane Costa
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