Separação e as Crianças

José Raimundo da Silva Lippi, Professor sênior do Departamento de Saúde Mental da Faculdade de Medicina da UFMG, integrante da Academia Mineira de Medicina
Há 31 anos, a Lei 6.515 (Lei do Divórcio) deu início à separação oficial dos casais e desde então o número de divórcios aumenta de forma impressionante. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada 100 uniões oficiais no país, 30 terminam em divórcio ou separação. Acredita-se que todos os anos aproximadamente 200 mil crianças passam pela experiência da separação dos pais. Para que esse processo não comprometa a formação e o desenvolvimento delas, é necessário que as famílias estejam preparadas para anunciar da melhor forma o fim do casamento e saibam como lidar com a nova relação. Muitos pais deixam de informar seus filhos, pois acreditam que, por ser muito jovens, não vão entender a situação. Entretanto, a criança de qualquer idade percebe quando uma mudança está ocorrendo, mas só aguarda a confirmação. O anúncio da separação depende de como está a situação do casal. Se os pais são presentes, é preciso aproveitar o momento em que ambos estejam suficientemente seguros e tranqüilos para expressar a decisão. Quando um dos cônjuges é ausente na relação familiar ou na presença física, deve-se criar um momento especial para o comunicado. A decisão tomada deve ser dita com clareza diretamente para o filho e com uma linguagem adequada à idade dele, sem entrar em detalhes que podem confundi-lo.

A criança também precisa saber que não foi responsável pela separação, para evitar uma culpabilidade sem sentido. Os pais precisam explicar os arranjos da custódia para que ela não se sinta abandonada. É importante assegurar que os filhos continuarão a receber os cuidados, mesmo daquele que se ausentará do lar. Eles devem ser encorajados a dialogar sobre seus sentimentos, sem serem julgados. Caso apresentem dificuldades em se expressar, os pais podem ajudá-los, admitindo os próprios sentimentos de tristeza e confusão. As crianças em idade pré-escolar parecem ser as mais atingidas pelos efeitos negativos da separação, porque seu desenvolvimento cognitivo ainda não permite compreender o que está ocorrendo. Bebês até dois anos podem desenvolver atitudes mais medrosas e certa regressão, enquanto crianças de quatro e cinco anos tendem a fantasiar a separação como temporária, assim como quando brigam com seus amiguinhos e depois fazem as pazes. Se a separação for problemática, eles podem se identificar com um dos pais e culpar o outro como responsável pela situação. Daí a necessidade de terapia para o casal e os filhos.

Muitas crianças de seis anos podem se sentir culpadas, como se tivessem feito ou pensado algo muito errado e, por isso, os pais brigaram e se separaram. Desenvolvem, então, um sentimento de responsabilidade pela reconciliação dos pais, muitas vezes, apresentando atitudes de autopunição, como se merecessem sofrer por terem falhado. A criança em idade escolar tem compreensão melhor dos problemas paternos e das razões para a separação, embora, na maioria dos casos, se sinta abandonada e com raiva deles. Em muitos casos, o rendimento escolar é prejudicado e surgem alterações de comportamento em casa e na escola, torna-se impulsiva, desrespeitando as regras familiares, ao mesmo tempo em que demonstra maior dependência e ansiedade.

Faz pouco tempo, o enfoque dado pelos psicólogos que atendiam casais em processo de separação era o de levar em conta a problemática dos cônjuges em questão. Mas, atualmente, estudiosos têm a preocupação de demonstrar os efeitos da separação nos filhos desses casais. Existe uma evidente reação contra a tendência protecionista do Judiciário, consagrando à mãe a maior parte do tempo de permanência com o filho. O convívio cotidiano com ele e as escolhas de cada dia são decisivos na educação da criança, na formação de seu caráter e sua personalidade. Ela deve sentir que ambas as partes pensam nela e cuidam de seus interesses, por isso é razoável supor que a presença e tarefas de pai e mãe tenham freqüência adequada e isso implica guarda compartilhada. O ideal é equilibrar direitos, deveres e responsabilidades entre homem e mulher, não só em relação aos interesses dos genitores, mas, principalmente, aos da criança.

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