Colóquio África e Diáspora debate o papel da mulher negra na sociedade



Os impactos das Conferências de Beijim e de Durban nas políticas de estado voltadas para as mulheres negras nortearam as discussões da mesa temática na manhã desta sexta-feira (7/11), no Auditório da Reitoria da UFBA. No centro do debate, Edna Roland, coordenadora de combate ao racismo e à discriminação para América Latina e Caribe pela UNESCO/Brasil; Jeannine Scott, vice-presidente da Africare; e Lily Golden, pesquisadora do Instituto de Estudos Africanos de Chicago.


O primeiro dia de palestras no I Colóquio África e Diáspora teve início às 10h30, com Edna Roland, que agradeceu o convite e saudou iniciativa da Unegro: “Tenho certeza de que a tarefa da nossa geração foi cumprida enquanto movimento das mulheres negras”, festejou ela, que acumula 20 anos de engajamento e luta. Sobre Beijim, Edna destacou a forte representação de mulheres negras na China como marco até então inédito; resultado do cumprimento do critério pré-estabelecido, de que metade da representação teria que ser de mulheres negras. O saldo do encontro realizado em 1995 foi apontado pela palestrante como positivo, devido a uma plataforma e declaração que incorporaram, em muitos itens, a perspectiva das mulheres negras e as temáticas ligadas à questão da etnia.

Neste sentido, a Conferência de Durban, realizada em 2001, foi ainda mais adiante, segundo apontou Jeannine Scott. “Durban representou um marco na luta para erradicar todas as formas de racismo, resultando em um programa de ação para afro-descendentes, que inclui a participação ativa em todos os aspectos sócio-culturais e econômicos”, ressaltou. Entre as diretrizes apontadas na plataforma direcionada especificamente para o continente africano, consta a questão da pobreza, alimentação, saúde, educação, segurança, tecnologia, meio-ambiente, cidadania e a promoção da imagem da mulher na mídia e da criança negra do sexo feminino.

“Houve uma defesa e ativismo maior em determinados países, como Ruanda, onde esses princípios foram aplicados e, hoje, 50% do Congresso é composto por membros femininos; o que represente o maior índice do mundo”, pontuou. Jeannine também citou o exemplo de Gana, onde foi criado um Ministério de crianças e mulheres, além de um fundo financeiro para oferecer micro-crédito aos dois segmentos; e um eficiente serviço de planejamento de saúde comunitário.

Com relação ao Brasil, o grande trunfo foi a criação do Plano Nacional de Políticas para Mulheres, apontado na explanação de Edna Roland. “É o reconhecimento de que o racismo se personifica de forma diferenciada para homens e mulheres e, portanto, faz-se necessário um recorte de raça e etnia na implementação das políticas públicas”, afirmou. Edna ainda elogiou o protagonismo brasileiro durante a Conferência, que teve a iniciativa de indicar – e, posteriormente, conseguir a aprovação de - uma mulher negra para ser a relatora geral do encontro.

Mudanças?!

Mais uma vez, a histórica vitória de Barack Obama foi saudada durante o Colóquio. “Um novo dia nasceu, minhas irmãs. Nós, de Washington a Salvador, de Paris a Londres, de Durban a Dakar, também sobreviveremos”, declarou Jeannine, que trabalhou como membro do comitê de políticas para a África, na campanha do democrata. “Estou inspirada por suas ações e tenho grande esperança de que tenhamos políticas que nos ajudem a continuar no processo de melhoria das condições de vida dos africanos e afro-descendentes; em especial das mulheres”, afirmou.

Apesar de também aplaudir a eleição do primeiro negro para o mais alto posto da Casa branca, Lily Golden mostrou-se um pouco mais precavida: “Isto certamente mudará a nossa consciência. Simplesmente, precisamos entender que podemos fazer tudo, mas tudo depende só de nós”.

Em sua explanação, Lily deixou o protocolo oficial um pouco de lado e, ao invés de seguir à risca o tema proposta na mesa de abertura do Colóquio, utilizou os seus cerca de 30 minutos para uma breve apresentação da situação dos africanos e afro-descendentes na Europa. “Eu vim aqui para dizer que o tempo mudou, mas não nós não mudamos tanto”, afirmou. Segundo a sua pesquisa, morrem em média 50 africanos por mês no continente europeu. “Precisamos começar a agir; tentar unir os negros da Europa, Brasil e todos os lugares do mundo para desenvolver algum tipo de atividade de assistência e socorro aos africanos e afro-descendentes radicados no velho continente”, conclamou.

Lily, que lidera o movimento Europa Negra, confessou uma grande expectativa com a realização do I Colóquio África e Diáspora, “por saber que Brasil está exercendo um papel de protagonista na África”, e propôs a criação de um censo, reunindo todas as informações disponíveis relativas ao povo negro, de diferentes localidades, credos e origens. “Essas informações precisam ser disseminadas e compartilhadas em todo o mundo, como os dados alarmantes de morte, chacinas e extermínios”, defendeu. “Chegou o momento de parar de falar, de interromper as discussões e fazer alguma coisa”, encerrou sob fortes aplausos da platéia.

De Salvador,

Camila Jasmin


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