A voz (e a imagem) de gente comprometida com a reflexão sobre a atualidade percorre 11 centros culturais de Belo Horizonte até o dia 21, nas exibições da mostra itinerante do Festival Favela é Isso Aí – imagens da cultura popular urbana, promovida pela ONG de mesmo nome. Embora em condições técnicas não muito favoráveis e com presença tímida do público, as primeiras sessões ocorreram na tarde de ontem em oito centros culturais em favelas da capital. Na tela, vídeos e documentários contam histórias não apenas da periferia da capital, mas também do interior de Minas (Betim e Diamantina) e de outros estados (Bahia, Paraná, Rio de Janeiro e São Paulo).
“A grande diferença da produção audiovisual é sua possibilidade de alcançar muito mais gente, sem ser excludente como a literatura”, diz o agente cultural da Vila Marçola, no Bairro Serra, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, Jotaerre, de 46 anos. Apaixonado pela cultura e “seu poder de preparar as pessoas para ver o mundo e criticá-lo”, ele tenta convencer moradores da vila a entrarem no Centro Cultural para assistir os vídeos do festival. “Há uma resistência natural, pelo fato da exibição ocorrer em um prédio público. Para muita gente, o Estado está em descrédito. Mas argumento que o centro é um espaço da comunidade, por isso essa visão precisa ser mudada”, comenta.
Uma das convertidas ao uso do espaço é Adalgisa Santos Soares, de 22, que na tarde de ontem acompanhava com os olhos e o balanço dos ombros a exibição do documentário Quarteirão do Soul. O trabalho é sobre a iniciativa de um lavador de carros e seus amigos que, aos sábados, transformam uma rua da capital em palco para dançarinos e admiradores da black music dos anos 70. “Eu fico muito dentro de casa no serviço caseiro, é difícil sair. Mas não gostava de soul e isso mudou quando o pessoal tocou aqui, no centro, que ficou lotado. Esses filmes são bons para desenvolver a nossa mente”, disse. Adalgisa soube do festival ontem, por acaso. Tinha ido ao local para devolver um livro de poesias.
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Adalgisa Santos Soares participa da exibição e diz que projeto abre a mente das pessoas |
VISIBILIDADE“Um dos maiores desafios é dar visibilidade à mostra, buscar outros meios de divulgação”, alerta o agente cultural Jeremias Cardoso de Souza, de 40, que pôde ser visto na tela, no documentário Prosa e poesia no Morro, sobre 29 poetas, moradores das comunidades da capital, sobre a importância de se fazer poesia e arte nas comunidades da periferia. O trabalho é um desdobramento do livro com o mesmo nome, com a publicação dos textos escolhidos pela ONG Favela é Isso Aí. O vídeo foi exibido no início da noite, no Centro Cultural Vila Fátima, na Região Leste de Belo Horizonte. “O resultado é muito interessante, você se transforma em referência por causa do que disse na tela, por causa do seu envolvimento com assuntos que as pessoas não conheciam”, afirma.
Além de soul e literatura nas favelas, os vídeos que serão exibidos até a próxima semana mostram a dança do grupo Fatalblack, do Aglomerado da Serra; a história do Zé Barriga, artista autodidata que mora na favela há 30 anos; do escultor Maurino de Araújo, morador do Bairro Primeiro de Maio; o dia-a-dia de jovens moradores da Vila Senhor dos Passos, retratado no filme 100% G.B.Q (Galera do Buraco Quente); a firmação do estado como celeiro da capoeira; e muitas outras histórias contadas pelo olhar cinematográfico de jovens de Minas e do Brasil.
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