De olho nas espertezas

Eleitor terá de ficar atento aos candidatos de ficha suja, além de cobrar o fim da infidelidade
Estão armando contra o eleitor. Vai caber ao cidadão ficar de olho nas espertezas que certos políticos andam aprontando para escapar da voragem moralizadora da política, que vinha instilando esperança nos espíritos democratas nos últimos meses. Não tem faltado cinismo e cara-de-pau no Congresso Nacional, em torno de projetos que asseguram privilégios, eliminam riscos de punições por comportamento inadequado e afastam pressões em favor de boas práticas republicanas. Enquanto isso, na cidade de cada um, vai começar a corrida pelos cargos de prefeito e vereadores. Agora que os partidos já concluíram a formação de suas chapas, será conveniente à sociedade o conhecimento da ficha dos candidatos. Base da hierarquia do poder político, o que está em disputa este ano é o começo da carreira de muita gente promissora. Mas tem sido a porta de entrada de oportunistas que alimentam planos inconfessáveis com o dinheiro público.

Não se tem notícia de que os partidos aplicaram na formação de suas chapas filtros mais seletivos, como se sugeriu ao fim do debate provocado entre os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Restou uma dúvida quanto ao sucesso dos magistrados que, interessados em promover a moralidade da política brasileira, venham a adotar critérios menos lenientes. Por enquanto, é grande a possibilidade de não vingar a derrubada de candidaturas de pessoas que, antes mesmo de chegar ao cargo público ou por ter deixado digitais em malversação de verbas, já têm prontuários obviamente desabonadores. Para alguns juízes eleitorais, bastaria uma condenação de primeira instância ou a reprovação por um dos tribunais de Contas. Afinal, por muito menos barra-se um candidato a concurso público para motorista ou faxineiro.

Mas a moralidade política também está prestes a sofrer retrocesso no campo institucional. Os discursos inflamados e as críticas, aparentemente corajosas e sinceras, que serão ouvidas na campanha que se aproxima podem ser lágrimas de crocododilo. Depois da eleição, as conveniências serão outras. O mais comum é eleger-se por partido que exija menor coeficiente eleitoral e trocá-lo por outro que estiver mais próximo dos cargos e dos cofres oficiais. Trata-se de deslealdade com o eleitorado e atentado ao sistema de partidos, prática que recrudesceu nos últimos anos, até que o TSE, em memorável decisão, concluiu que o mandato é do partido e não do eleito. Mas essa é mais uma esperança que está sendo driblada pela esperteza de certos políticos. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou na semana passada projeto de lei complementar que dá jeitinho bem brasileiro: seria permitida a troca, sem penalidade, no período de 30 dias anteriores a um ano do fim do mandato. A única restrição é que a nova candidatura não pode ser a cargo diferente do atual. Um casuísmo nefando que não encontra justificativa senão no oportunismo e na total falta de compromisso com a seriedade e com a democracia.

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