A sucessão em Belo Horizonte é um retrato do nosso péssimo partidário. E confirma o que Bernardo Pereira de Vasconcelos, Alberto Torres, Oliveira Viana, Alceu Amoroso Lima e Caio Prado Jr. já escreveram: nossos partidos não passam de grupos de negociantes, sem preocupação com os interesses coletivos. Democracia só pode ser real com partidos autênticos. O que vimos no caso de BH é a ação de meia dúzia de “cardeais” (do PSDB, PT, PMDB, PDT etc.) escolhendo de cima para baixo.
Os partidos políticos nasceram em 1832, na Grã-Bretanha, tomando o lugar dos bandos, tories (conservadores) e whigs (liberais). O melhor estudo da nossa falsa democracia é de José Honório Rodrigues, com o seu clássico Conciliação e reforma no Brasil (1965). O que se considerou uma “revolução” a eleição do ex-operário Luiz Inácio Lula da Silva não passou de uma ilusão. Antes mesmo de tomar posse, arquivou as teses “revolucionárias” dos partidos de esquerda e adotou a cartilha neoliberal de Fernando Henrique Cardoso. Os dois partidos (PT e PSDB) buscaram inspiração e apoio financeiro na social-democracia européia, como conta o historiador Luís Mir em seu livro Partido de Deus (2006). O Partido Comunista do Brasil (PCB) veio antes, em 1922. Um ano depois (1923), morria o grande líder liberal do Brasil, Rui Barbosa.
A revolução de 1930 marcou a simpatia do presidente Getúlio Vargas e do general Eurico Gaspar Dutra (ministro da Guerra do Estado Novo) pelo nazismo. A Aliança Nacional Libertadora (ANL), apoiada pelos Jovens turcos e tenentes, tinha programa nitidamente de esquerda: pregava o cancelamento da dívida externa; direito do povo manifestar-se livremente; distribuição de terras (latifúndios) aos diaristas roceiros; defesa da pequena e média propriedade. Tenentista típico (repartiu com o general Miguel Costa o comando da chamada Coluna Prestes nos anos 1920), Luiz Carlos Prestes pregava a tomada do poder de qualquer maneira. A sucessão de 1938 tinha como candidatos Armando de Sales Oliveira (SP), José Américo de Almeida (PB) e Plínio Salgado. José Américo alertou o general Dutra sobre o perigo da polarização entre conservadores e comunistas. Sugeriu um terceiro nome, mas Dutra vetou e disse: “O Exército ouviu o apelo do povo em 1889 e agora vai fazer o mesmo”. José Américo respondeu: “Mas o povo ficou bestificado. Agora nem isso se dá, porque o golpe já está pronto”. Estava implantado o Estado Novo (10/11/1937), que só acabou em 1945. Veio então a Constituição de 1946, preparada pelos partidos criados a partir de fevereiro de 1945, com as oligarquias agrupadas no PSD, os liberais com a UDN, o PTB de Getúlio, o Partido Republicano de Arthur Bernardes e o Partido Agrário Nacional e o PCB. O populismo imperou, e já em 1951 Getúlio estava de volta ao Catete. Em 24/8/1954 Getúlio se suicidou. O vice João Café Filho (PP de Ademar de Barros) assume o poder, mas teve uma desavença com o general Henrique Lott e foi derrubado. Eleito, Juscelino Kubitschek tomou posse em 1º/1/1956. JK perdeu para Jânio Quadros em 1960. Jânio governou apenas sete meses e renunciou ao cargo, em agosto. Houve veto à posse do vice João Goulart, acusado de preparar um golpe para instalar uma república sindicalista. Jango foi derrubado por um golpe militar em 31 de março de 1964.
Os anos de chumbo (1964-1985) terminaram depois de torturas, cassação de mandatos, assassinatos, ataques terroristas e banimentos, para dar lugar à Nova República de Tancredo Neves (falecido em 21 de abril de 1985), que deixou o governo com um oligarca no poder (José Sarney). O grande problema: sem partidos legítimos, a democracia brasileira é simples ficção. Depois de tanta discussão, já se sabe que, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), as listas sujas vão disputar as eleições de outubro. A corrupção enlameia todos os níveis de governo. Alguma novidade? Depois de outubro, teremos o que Sales Torres Homem dizia no Império: “Um tempo sem fisionomia, cada vez mais degradado pelos poderosos”. Ou seja, o que nos espera é o que dom Manuel Mascarenhas dizia, em pleno Senado Imperial: “Morreram os costumes, o direito, a honra, a piedade, a fé e aquilo que nunca volta quando se perde, o pudor”. Parece que é isto o que se pode ler na entrevista de Gilberto Carvalho a uma revista nacional na semana passada. |
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