Estado Policial

Os abusos não se restringem à privação da liberdade
Leonardo Isaac Yarochewsky, Advogado criminalista, professor de direito penal da PUC Minas
Há muito tempo, a sociedade vem clamando por punições mais rigorosas, por um combate igualmente eficaz contra o crime e a impunidade. Neste diapasão várias leis foram sancionadas e inúmeras ações foram empreendidas por diversas forças-tarefas – Ministério Público Federal e Estadual, polícias Federal, Civil e Militar e, até, o Exercito –, tudo em nome da guerra contra o crime organizado ou não. Ninguém duvida em sã consciência da necessidade de combater o crime e punir os culpados. Contudo, é inadmissível que, sob o manto da punição de criminosos, direitos e garantias fundamentais dos indivíduos sejam afrontados. Os fins não podem e não devem justificar os meios, sobretudo, no Estado de direito.

Infelizmente, a prisão provisória (sem condenação), que deveria ser uma exceção, está se transformando em regra. Pessoas são presas (temporariamente ou preventivamente) sem que haja uma acusação formal. Prende-se para depois apurar. Em muitos casos, as prisões são feitas ainda na madrugada, pessoas são tiradas da cama e conduzidas sob os holofotes da mídia, que estranhamente chega simultaneamente com a polícia, muitas vezes, sem saber por que estão sendo presas. Qualquer semelhança com o regime militar não é mera coincidência. Dantes, a famigerada prisão para averiguação, agora, a não menos infamante prisão temporária. Mas tudo em nome do combate ao crime e revestido de uma falsa legalidade. Os abusos não se restringem à privação da liberdade, outros métodos, ou melhor, outro método de investigação, tem se constituído na base de quase todas as acusações. Interceptações telefônicas: grampos nem sempre legais e confiáveis. Neste particular, o atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, no voto que confirmou a liminar que deu liberdade para Pedro Passos Júnior, investigado na Operação Navalha, afirmou que a Polícia Federal usa “terrorismo estatal como método”. A afirmação foi feita no relatório do voto citado. O ministro também foi alvo, equivocadamente, da divulgação de seu nome em grampo feito pela PF.

Segundo o presidente do STF (EM, 2/6), “é preciso encerrar esse quadro de intimidação. É fundamental que o presidente da República, o ministro da Justiça e o diretor da PF ponham cobro nesse tipo de situação. É abusivo o que vem se realizando. Não é possível instaurar, no Brasil, o modelo de Estado policial”. Diante deste “Estado policial”, é preciso que a sociedade não se omita e que os poderes da República, bem como as garantias constitucionais do Estado que se pretende democrático e de direito, prevaleçam antes que um aventureiro lance mão.

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