Querem fazer nossa cabeça

"Os homens pesquisam a possibilidade da manipulação e possessão dos espíritos. De modo" que poderiam vencer a resistência racional
Regina Teixeira da Costa
reginacosta@uaivip.com.br
A jornalista francesa Marie Benilde escreveu artigo, publicado no jornal Le monde diplomatique Brasil, sobre como aumentar a eficácia da propaganda. Ela afirma que podemos servir de cobaias ou mesmo de alvo principal das pesquisas da neurociência a serviço do mercado. Os cientistas pesquisam o neuromarketing.

Pretende-se comprovar cientificamente que estímulos em determinada região cerebral podem tornar qualquer produto altamente desejável e selecionado entre tantos outros. E tudo isso se pretende aplicar ao mercado de consumidores. Assim podemos ser um campo de pesquisa aberto, um laboratório a céu aberto. Uma manobra que requer alto investimento, porém, do ponto de vista ético é questionável .

Desde as primeiras descobertas sobre a psicologia da mente e os estímulos-respostas pesquisados em laboratórios de psicologia experimental, e da descoberta de um inconsciente, os homens pesquisam a possibilidade da manipulação e possessão dos espíritos. De tal modo que poderiam vencer toda resistência racional, atingindo diretamente, por meio de estímulos subliminares, algum ponto do inconsciente ou do funcionamento cerebral que fornecesse a resposta esperada.

O capitalismo financia a ciência a tal ponto que hoje os cientistas produzem sob encomenda das grandes indústrias e de seus interesses. O neuromarketing pretende dominar a conexão entre imagem de uma marca e a estimulação do cérebro com técnicas científicas utilizadas pela medicina para detecção de tumores ou acidentes cerebrais com imagens de ressonâncias magnéticas e monitoramento de pacientes. Cientistas observaram que o córtex pré-frontal médio seria requisitado mediante certa imagem de marca; a Coca-Cola por exemplo é uma das empresas a utilizar desses métodos, apelando para a memória com importante papel nos processos cognitivos.

A reação seria a identificação à marca como se ela pudesse fazer parte do seu “verdadeiro eu” já que o neuromarketing é conduzido de modo a linkar o produto à auto-imagem da pessoa e a seu conhecimento íntimo. Tal estimulação poderia levá-la a gostar do que os outros gostam! Todos querem atender aos ideais da cultura, que hoje giram em torno de fazer sucesso, ser bonito, rico e famoso. Assim, a propaganda é considerada boa quando alcança o público e é assimilada, condicionando sua internalização.

A campanha perfeita seria a que conseguisse estimular tal parte cerebral alcançando a transposição narcísica do amor a si mesmo em amor a si mesmo enquanto objeto (da publicidade, claro). Essas discretas pesquisam não contam com grande divulgação, pois temem a desaprovação da opinião pública, que passa a ser tratada como joguete das empresas de difusão.

Trata-se de fato da tentativa de fazer uso de técnicas de condicionamento e estimulação subliminar, isto é, direta ao inconsciente por estímulos que a consciência não captaria, por exemplo, um sinal imperceptível que seria apreendido pela percepção. Certas marcas entram na memória e se tornam aderidas demonstrando assim a possibilidade de transcender os limites da comunicação. O inconsciente do consumidor ainda não foi reivindicado abertamente, mas por trás de cada pessoa é o consumidor o alvo dessa indústria de sugestionamento.

Será que devemos levar tão a sério assim essas pesquisas? A quem interessa esse ramo da pesquisa? Será possível retirar do homem a responsabilidade por suas escolhas sem seu consentimento? Desejaria o homem não fazer escolhas e alienar-se ao desejo do outro? Em parte sim. Muitos de nós tendemos a evitar conflitos e desagradar o outro abrindo mão do próprio desejo para atender ao que se diz ser “o correto”, seguindo sem crítica as exigências da cultura e da sociedade sem nenhum tipo de reflexão.

Se tais indústrias pudessem atingir a todos com seus mecanismos sutis de alcançar a adesão inconsciente dos consumidores, seríamos totalmente consumidos. Não se pode negar que o sugestionamento funcione e há aqueles que são mais vulneráveis, mas nem tais técnicas são absolutamente eficientes, nem todos nós somos tão vulneráveis. E os que são responsáveis por suas escolhas dificilmente cairão seja nesta ou qualquer imposição de ideais da cultura e contra o seu livre arbítrio.

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