Anistia para torturadores é impunidade




Nos últimos dias, voltou à pauta a necessidade e a possibilidade de responsabilização, nos planos cível e criminal, dos agentes do Estado que cometeram crimes de tortura e assassinato entre os anos de 1964 e 1985 no Brasil, sob a ditadura militar.


Não faz muito tempo esta era uma reivindicação apenas de familiares de mortos e desaparecidos e de organizações de direitos humanos; com o advento do governo Lula pode-se assistir a uma maior abertura para o debate de questões relativas aos direitos humanos e, inevitavelmente, estes crimes não poderiam ficar fora dele.


É neste contexto que se insere a iniciativa do Ministério da Justiça e da Comissão de Anistia, ligada à Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, de promover, no dia 31 de julho, uma audiência para discutir o resgate desta dívida histórica. Na audiência, o ministro Paulo Vannuchi frisou que esta discussão é um marco para preparar avanços no caminho da consolidação da democracia. E, na mesma audiência, o ministro Tarso Genro lembrou que mesmo “durante todo o período do regime militar, não havia nenhuma norma legal que permitisse atos de tortura”.


Foi o que bastou para que ex-agentes com culpa no cartório entrassem em pânico e saíssem fazendo ameaças e reclamações. O Clube Militar do Rio chegou a preparar um “anti-seminário” para “denunciar” membros do governo Lula que teriam praticado “terrorismo” durante o período militar.


Mas diferente dos militares, que eram pagos com dinheiro público para reprimir os chamados “subversivos”, quem resistia à ditadura era considerado criminoso e milhares de cidadãos brasileiros foram perseguidos, discriminados, exilados, torturados e assassinados pelo “crime” de querer a democracia de volta. Esta é a diferença fundamental para se entender por que a resistência à ditadura não pode ser comparada à ação dos torturadores, estes sim criminosos que precisam ser responsabilizados judicialmente.


É preciso ficar claro neste debate que a punição dos agentes do Estado que torturaram e assassinaram não é “revanchismo”, como alegam justamente os acusados por aquelas ações bárbaras. Tampouco significa um ataque às Forças Armadas mas, ao contrário, este resgate é favorável e resssalta a imagem majoritária do soldado a serviço da nação, da democracia e da lei.


O primeiro passo, no sentido deste resgate, é estabelecer se os torturadores, uma minoria muito pequena que, agora, alegam que apenas cumpriam ordens, estão ou não protegidos pela Lei de Anistia ou qualquer outro instrumento legal do país ou internacional. Aliás, a legislação internacional proíbe de forma bastante clara que se trate torturadores como se fossem criminosos políticos.


Enquanto no Brasil, oficiais de pijama e ex-torturadores recebem apoio político até de membros do atual governo, em países vizinhos como Chile, Argentina e Uruguai, agentes da repressão política sob a ditadura, responsáveis por crimes desta natureza - mesmo generais e ex-presidentes da República - foram levados a julgamento e condenados sem que isso gerasse crises institucionais. Pelo contrário, cada vez que um destes criminosos é punido, a história do país é passada a limpo e a democracia sai fortalecida.

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