Fome: nao basta só produzir mais




Fome: nao basta só produzir mais
Javier Diez Canseco

Lima / Meio Ambiente – A fome assola boa parte do mundo. Os preços dos alimentos disparam, resultam inatingíveis para milhares de pobres. Subiram 83% em três anos. Jean Ziegler, da ONU, qualifica o fato como um " silencioso assassinato em massa". Violentos levantamentos sacodem o Haiti, Senegal, Egito, Camerún, Costa do Marfim, Mauritânia, Etiópia, Yemen, Uzbequistão, Tailândia, Indonésia, Filipinas e até a Itália. No Peru, o aumento dos preços de alimentos provoca crescentes protestos, erosiona a corrupta gestão do alanismo (desesperado, reparte sacolas de comida com as FFAA à noite), e aumenta a adesão à Greve Nacional. A preocupação é mundial: Unicef e o BM instam os países produtores a controlar desproporcionados aumentos de preços e evitar revoltas sociais.

Iniciamos o século XXI em pleno desenvolvimento da revolução científico-técnica, um progresso sem precedentes da tecnologia e da produtividade, sendo capazes de alimentar todo o planeta. Ademais, a China e a Índia abrem passo ao desenvolvimento. O capitalismo disse ter derrotado o socialismo e pregou a validez de uma ideologia única: a ganância e o lucro constituem o motor da economia; o principal instrumento são as grandes multinacionais; a desregulação e o quase desaparecimento do Estado é uma religião. Mas a fome faz o mundo recordar que as coisas são muito diferentes. Ziegler culpa a "globalização da monopolização dos ricos na Terra" e as multinacionais de uma "violência estrutural". Claro, mais querem comer e não basta só produzir mais, como bem sabemos no Peru. Requer distribuir com justiça o produzido e que todos tenham direito a ter acesso a um nível de vida digno, o que não interessa as multinacionais. Sua maior produção e lucro é a custa do povo humilde, de vergonhosos privilégios tributários, ou de priorizar incondicionalmente o uso da água para a grande mineração, danando o ecossistema, o agro e a pecuária que são espaços de desenvolvimento sustentável, nao esgotável e de segurança alimentar para a naçao. Nós, povos originário, sabemos bem disso, já que fomos obrigados a abandonar uma próspera agricultura para sermos dizimados na exploraçao mineira colonial

Não basta desenvolver ciência e tecnologia. Urge que cheguem à gente e sirvam a seu bem-estar, não só aos lucros dos grandes conglomerados econômicos. Também não é possível que um "mercado" desregulado e manejado por imensos monopólios imponha suas condições de rapinha a Estados raquíticos e inoperantes pondo os lucros empresariais excessivos sobre o direito à vida das pessoas.

O arroz, por exemplo, duplicou seu preço internacional nos últimos três meses. Uma feroz seca açoita a Austrália (reduzindo em 98% sua colheita que abastecia 20 milhões de bocas diárias). Será casualidade ou produto do aquecimento global gerado por um modelo de industrialização que explode e maltrata a natureza em lugar de conviver com ela? Mas, nós nos perguntamos: que efeito está tendo, no aumento de preço dos alimentos e do combustível, graças à invasão de Bush no Iraque? (além disso, por que –se produzir um barril não custa mais de 12 dólares– se vende acima de 115 dólares?) E, certamente, devemos analisar o impacto que –sobre o preço dos alimentos– tem a pressão dos Estados Unidos e os países industrializados em orientar o setor agrícola para a produção de biocombustíveis e energia –mais rentável para eles– em vez de servir os requerimentos de alimentos de milhões de pobres. Finalmente, a que nos levará a intervenção do capital especulativo que aproveita a situação e investe –como o fez antes com ouro, minerais e petróleo– na compra a futuro de alguns alimentos, empurrando seu aumento?

Ao efeito do capitalismo selvagem (assim denominado por João Paulo II), soma-se o impacto do servilismo do governo de Alan García aos interesses das grandes multinacionais de mineração e financeiras, sua penosa e incondicional adesão ao pensamento do "Consenso de Washington" e suas políticas, assim como sua carência de uma política de segurança alimentar e de verdadeira promoção da agricultura, salvo os favores feitos a certos setores de exportadores que não chegam a 5% dos produtores agrários do Peru.

Alan Garcia não põe em ordem os grandes especuladores, não aplica o prometido imposto ao lucro exagerado do setor de mineração, não regula preços básicos para as pessoas nem aumenta os salários. Mantém seus amigos da UN no Banco Central de Reserva do Peru , como Velarde, embora sua política fracasse. Além disso, quer que esperemos o esbanjamento da mesa de banquete de seus amigos, que esperemos na madrugada –às vezes– um pacote de alimentos no valor de 6 dólares, repartido por soldados. E os que questionarem sua política, arriscam a ser "terrucos", detidos e processados (como os 7 da fronteira com o Equador, ou os dirigentes da Greve Nacional do setor Agrário) ou receber balas na cabeça (como os camponeses de Ayacucho), disparadas por atiradores "fantasmas". Mas Alan García aprenderá que medo e chumbo não acalmam a fome de pão e de justiça dos peruanos.

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Javier Diez Canseco
Membro do Conselho Editorial de Sinpermiso. Artigo publicado em www.sinpermiso.info.

(Fonte: www.miradaglobal.com)

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