O ator baiano Lázaro Ramos assistiu, em 1994, a peça de teatro que mudaria sua relação com a arte: Ó paí, ó. Encenada pelo Bando de Teatro Olodum, o texto, segundo ele, se parecia com várias situações divertidas do seu dia-a-dia e, de quebra, trazia questões sérias, como a chacina infantil. A experiência o impressionou tanto que, pouco depois, ele decidiu entrar para a trupe e participar da continuação da montagem, Bye bye Pelô. O espetáculo discorre sobre os destinos dos moradores do Pelourinho que tiveram de abandonar aquela região, após a revitalização do cartão-postal baiano. Quando surgiu a oportunidade de levar Ó paí, ó para o cinema, a diretora Monique Gardenberg chamou Lázaro para protagonizá-lo. Deu tão certo na telona que o projeto volta em setembro, em formato de seriado, na Rede Globo. A essência do especial de seis episódios é parecida: “Um depoimento popular da Bahia de muita personalidade”, adianta.
Em fase final de gravações, O paí, ó quer levar para a televisão a alegria de viver do povo soteropolitano e o deboche baiano. O tom da adaptação foi herdada dos projetos anteriores. “A Monique conseguiu manter aspectos importantes, como a liberdade de interpretação e improvisação dos atores”, conta Lázaro, que viverá Roque, aspirante a cantor, dividindo a cena com artistas escalados no Bando de Teatro Olodum e outros consagrados. Nomes como Stênio Garcia, João Miguel, Virgínia Cavendish, Nanda Costa e Preta Gil também estarão no seriado. Ao ator Matheus Nachtergaele coube o papel de Queixão, o vilão. Diferentemente do filme – traduzido pela diretora como obra aberta –, cada episódio terá início, meio e fim. “A primeira temporada será didática. Tanto para o espectador quanto para os criadores das tramas, Guel Arraes e Jorge Furtado. Ambos têm domínio do entretenimento, ao mesmo tempo que conseguem trazer reflexão interessante nos trabalhos.” Além dos dois criadores, os textos contaram com a contribuição dos atores do Bando de Teatro Olodum.
Rodada em película 16 mm, Ó paí, ó chegará ao público num formato de co-produção da Dueto Filmes com a Rede Globo, responsável por supervisionar artisticamente o projeto. A experiência agradou aos envolvidos. “Acho bacana quando descentraliza. A produção televisiva brasileira ainda é bastante centrada no Rio e em São Paulo. Depoimentos como esse proporcionam muito. Como seria bom se grupos como o Galpão pudessem realizar algo parecido”, sugere. A oportunidade não conseguiu esgotar o tema. “A Bahia tem várias facetas e a série dá conta de apenas um dos lados. O mesmo acontece com o Bando de Teatro Olodum, que, além dos trabalhos autorais, têm no currículo clássicos como Dom Quixote e Sonho de uma noite de verão”, explica o ator, que ainda se considera integrante da trupe. O personagem Roque – espécie de herói popular com um olhar sonhador – conseguiu reaproximá-lo do grupo de teatro. “A série trará um pouco do clima do grupo. A interpretação acontece um tom acima do normal”, adianta.
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Elenco terá participação de jovens atores ligados ao grupo baiano |
Os episódios retratarão, como no filme, um grupo de moradores de um prédio invadido do Pelourinho. No início dos anos 1990, quando da reforma do lugar, várias famílias que habitavam o Centro Histórico foram expulsas dali, como tentativa de “limpar” a área para a visitação turística. Passado algum tempo, essas pessoas retornaram ao seu local de origem, invadiram prédios e hoje co-habitam com toda a atividade comercial e artística que se criou em torno da região.
A intenção, como explica Monique Gardenberg, é mostrar, com humor, as lutas pessoais, paixões, crenças e o cotidiano dessas pessoas comuns. “Acima de tudo, a vitalidade, o jeito debochado de ser.” A diretora tem a música como aliada na narrativa. “A musicalidade, traço forte no trabalho do Bando de Teatro Olodum, também foi valorizada e deve trazer um sabor novo aos seriados”, anuncia Monique, que além da direção geral foi responsável pela seleção da trilha sonora. No processo, ela contou com o apoio de outros diretores da emissora. Mauro Lima assinará dois episódios e Carolina Jabor e Olívia Guimarães estarão à frente, cada uma, de um episódio.
"A produção televisiva brasileira ainda é bastante centrada no Rio e em São Paulo. Como seria bom se grupos como o Galpão pudessem realizar algo parecido"
Lázaro Ramos, ator
"A musicalidade, traço forte no trabalho do Bando de Teatro Olodum, também foi valorizada e deve trazer um sabor novo aos seriados"Monique Gardenberg, cineasta
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