Depressão: Muito séria, pouco compreendida


Nájia Furlan

Além de comum, a depressão é uma doença bastante séria. No entanto, ainda é pouco compreendida. Muitos podem não reconhecer, mas tão grave é o transtorno que as conseqüências chegam a atingir todos os segmentos da vida de uma pessoa. Isso inclui o profissional. De acordo com o psiquiatra Acioly Lacerda, professor de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina, “é uma das maiores causas de falta e afastamento do trabalho”.

Segundo o médico, a depressão, como qualquer doença, se manifesta e é identificada através de sintomas que aparecem em quadro permanente: “tristeza, perda de interesse e outros sinais, como falta de apetite, sono, dificuldade de memória e concentração, irritabilidade, ansiedades, dores, sensação de indisposição e fraqueza”, enumera Lacerda.

São exatamente esses “sinais” que, quando constatada a doença, têm reflexos no desenvolvimento da atividade profissional. “Quanto mais intelectualizada é a função como os cargos de direção, que exigem tomadas de decisão, maiores os prejuízos”, indica o médico. Ainda segundo Lacerda, apesar de, muitas vezes, o paciente perceber que enfrenta algum transtorno emocional, é difícil de encarar que isso é uma doença. “Geralmente as pessoas associam isso ao excesso de trabalho, estresse e pensam que precisam apenas de descanso. Porém, no caso da depressão, não melhora com as férias”, completa.

Outro problema que os depressivos enfrentam no ambiente do trabalho é a falta de compreensão. “Um grande problema que percebemos nas empresas é que jamais eles atribuem a queda de produtividade dos funcionários a uma doença. As empresas apenas entendem as doenças que apresentam quadros físicos. Sabendo ou não da gravidade da depressão, infelizmente ainda muitos recebem a doença de maneira preconceituosa”, diz o psiquiatra. Uma maneira de mudar isso, segundo Lacerda, seria as empresas reconheceram que o problema é sério, assim como as conseqüências.

Casos

O responsável pelo setor de saúde da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) do Paraná, Sérgio Silveira de Barros, conta que quase que diariamente o órgão recebe trabalhadores com indícios de depressão. “Sabemos que a depressão pode acarretar o afastamento do trabalho. O que sabemos é que com o tempo uma pessoa com depressão, como outra doença, perde produtividade”, afirma. Ele informa que o INSS reconhece esta doença como motivo de afastamento e até de aposentadoria por invalidez.

Mesmo cientes dos sintomas e das conseqüências, “a maior parte dos trabalhadores não sabem onde e como buscar ajudar e tratamento”, aponta Barros. Ele conclui que o dever da empresa é propiciar um ambiente saudável aos trabalhadores, inclusive emocionalmente.

Problema de difícil diagnóstico

Os profissionais reconhecem a gravidade da depressão. No entanto, a psicoterapeuta e psiquiatra Maria Lúcia Maranhão Bezerra ressalta que é preciso muito cuidado ao identificar o problema, para não banalizar. “A depressão é um diagnóstico difícil, que envolve muitas sutilezas, ao contrário do que possa parecer”, diz.

A médica cita três coisas que precisam ser distinguidas nesta identificação: “são três fatores distintos: primeiro, a tristeza comum; segundo, os diferentes processos de lutos (simples e complicados); e, terceiro, que pode ser dificuldades em encarar alguma área de imaturidade, um período de turbulência emocional”, explica Maria Lúcia.

Ela também explica por que a depressão afetaria o trabalho. “Este é um ambiente que exige um pouco de neutralidade e contenção emocional e quando há uma inundação de emoção acaba atrapalhando o desempenhar das atividades”, pontua. A psiquiatra concorda que a depressão é uma doença que faz sofrer e que afeta a vida tanto pessoal quanto profissional da pessoa. Porém, ela completa que existe tratamento e que este deve ser buscado o quanto antes. “O tratamento é feito tanto com psicoterapia (com psicólogos e psiquiatras) quanto com remédios. A pessoa deve procurar ajuda profissional sem demora, pois muito pode ser evitado. O atendimento precoce está ligado à prevenção em saúde mental, antes de deixar que os processos se agravem e gerem conseqüências dramáticas”, orienta. (NF)

Pacientes sofrem muito preconceito

Assistente social no setor de oncologia de um grande hospital de Curitiba, Ana (nome fictício da paciente, que preferiu não se identificar) sabe bem as conseqüências da depressão. Ela já passou por fases crônicas, mas hoje, com o problema sob controle, quer voltar ao trabalho, mas sabe que enfrentará preconceito.

“Faz mais de dez anos que tenho depressão. Quando o problema ainda não era tão grave eu conseguia trabalhar, sem que meus colegas ou mesmo os pacientes notassem que eu estava doente, apesar de eu atuar em um setor delicado”, relata Ana. Ela conta que a doença foi evoluindo e chegou a um estágio em que as conseqüência não eram mais controladas. “Chegou a um ponto que começou a interferir no meu trabalho. Apesar de eu amar o que fazia, eu não estava mais conseguindo ir trabalhar”, continua.

Ela teve que, então, entrar em licença e buscar tratamentos mais efetivos. Chegou a ficar muito tempo afastada do trabalho. “Penso em voltar, mas caso aconteça, quero ir para um setor diferente do que atuava. Existe um preconceito muito grande em relação à depressão. Cheguei a ouvir, inclusive, que depressão era falta de caráter e preguiça de trabalhar. Somos rotulados”, lamenta Ana.

Segundo ela, a decisão de buscar ajuda profissional foi dela mesma. “Eu via que tinha tudo, mas não encontrava sentido na vida. Vi que começou a interferir demais em toda minha vida. Foi aí que busquei tratamento. Hoje estou alegre e tenho, novamente, tudo sob controle”, define.

Para as pessoas que enfrentam o mesmo problema, Ana faz a seguinte recomendação: “a pessoa não deve sentir vergonha ou receio de buscar ajuda. Quanto mais tarde, mais difícil. É uma doença como outra qualquer”. (NF)

Fonte: http://www.parana-online.com.br/noticias/index.php?op=ver&ano=temp&id=288533&caderno=8


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